segunda-feira, 29 de abril de 2013

Dossiê “Felicidade”: 3 textos sobre a novela de Manoel Carlos



Helena (Maitê Proença) entre dois amores: Mario (Herson Capri) e Álvaro (Tony Ramos)

Se tem uma novela que eu tenho assistido com assiduidade no momento, essa novela é “Felicidade” (1991), de Manoel Carlos, atualmente em reprise no Canal Viva de segunda à sexta, às 15:30 e à 01:00 da madrugada. O folhetim, livremente inspirado em contos de Aníbal Machado, ficou marcado pelo romantismo, pela simplicidade e por altas doses de lirismo e poesia em suas tramas cheias de personagens cativantes. A novela também marcou o retorno de uma personagem chamada Helena em uma trama do autor. A primeira tinha sido Lilian Lemmertz, dez anos antes em “Baila Comigo”. Para me ajudar a construir um verdadeiro Raio X da novela, convidei dois amigos que também gostam muito dela: o querido Wesley Vieira, pra falar um pouco da trilha sonora; e Raphael Ramos, que nos apresenta uma visão bem completa da novela sob vários aspectos, inclusive um relato bem emocionante de sua memória afetiva em relação a ela.
Melão apresenta três textos diferentes que falam do mesmo tema: felicidade!



Uma nova chance para “Felicidade”
Por Vitor de Oliveira


“Felicidade se acha em horinhas de descuido”, já dizia Guimarães Rosa. E foi justamente por um descuido que me vi acompanhando a reprise da novela no Canal Viva, de maneira muito descompromissada e, quando me dei conta, não conseguia perder um capítulo sequer. Confesso que a novela não me chamou a atenção em sua primeira exibição. Talvez por ser um adolescente na época e ter me ligado muito mais em “Vamp”, que passava no horário seguinte. Já era crescido demais para a trama infantil e ainda muito jovem para os complicados enlaces amorosos de Helena e cia.

Mas agora nessa nova reprise, decidi assistir a alguns capítulos para comprovar o desinteresse que tinha pela novela. Fui assistindo aos capítulos um a um e quando me dei conta já estava completamente envolvido pela história simples, poética e comovente, pelas incríveis atuações e pelo texto sempre realista do autor. “Felicidade” tem uma aura de novela mexicana: herói certinho, heroína sofredora e vilã louca. Há algumas frases ditas pela vilã Débora (Viviane Pasmanter) como “eu sou a mais infeliz das mulheres” que comprovam essa impressão. Mas a novela está longe de ser maniqueísta ou de conter personagens estereotipados. Os personagens bem que podiam ser nossos vizinhos. Os problemas e dilemas deles se parecem com os nossos. A trama não tem aquele ritmo ágil, tampouco cenas grandiloquentes, mas o texto é tão envolvente, os personagens são tão cativantes, os cenários e figurinos tão realistas que não há como não se identificar e criar um vínculo afetivo com a novela. E, assim, suavemente, sem alarde, “Felicidade” nos captura e nos conquista.

Ariclê Perez: magnífica como Ametista
São inúmeros os destaques do elenco, desde a exuberância de Sandra Bréa à maravilhosa contenção de Ariclê Perez, duas saudosas atrizes que fazem muita falta na tevê, mas gostaria de destacar o trabalho da protagonista, vivida magistralmente por Maitê Proença e defendida com garra pela atriz. O mais fascinante nessa Helena é que, ao contrário das outras, que mentiam e guardavam segredos sempre para proteger outra pessoa, essa Helena mente em benefício próprio, como quando forjou uma gravidez falsa para fazer com que o marido se mudasse com ela para o Rio. Ao ver que o plano não deu certo, Helena não hesitou em simular a perda da gravidez e realizar o funeral do bebê enterrando um tijolo no lugar dele. Mesmo assim, continuamos a torcer por Helena, uma das mais imperfeitas e humanas das Helenas do autor. E Maitê Proença não desperdiçou a oportunidade nos brindando com um brilhante trabalho. Já coloquei essa Helena no rol de minhas favoritas. Há que se destacar também o primoroso trabalho de Edney Giovenazzi e seu Chico Treva, um personagem complexo, construído sem palavras, apenas com delicadeza e minimalismo que só poderia mesmo ser interpretado por um ator de alto nível.

Edney Giovenazzi: memorável como Chico Treva
Enfim, “Felicidade” é uma autêntica novela de Manoel Carlos, o autor que mais consegue dar dimensão humana aos personagens, mas também tem um toque de Ivani Ribeiro, ao conter uma simplicidade comovente que está longe de ser simplória, que se aproveita de nosso “descuido” para nos conquistar. 22 anos depois, me rendo e coloco “Felicidade” no rol de minhas favoritas.
  
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As trilhas de FELICIDADE

Por Wesley Vieira

FELICIDADE. Aí está uma novela que me surpreendeu positivamente. Quando foi exibida, em 91, eu era criança. Assistia, claro, mas a imagem que ficou cristalizada em minha memória não foi a melhor. Quando anunciaram a reprise no Canal Viva, torci o nariz: “Mas que novela cafona, chata, blargh”. Hoje, um pouquinho (só um pouquinho) mais velho, assistindo a saga de Helena (Maitê Proença em seu melhor momento), constato que eu estava redondamente enganado. A novela é linda em todos os aspectos. Manoel Carlos, o nosso Maneco, estava inspirado.

No entanto, independente da novela, as trilhas sonoras sempre permearam as minhas lembranças, em especial o disco internacional, que, evidentemente, me marcou mais. Não deixo de citar o disco nacional, embora essa trilha não esteja entre as minhas favoritas, justamente por causa da inclusão de músicas como “Seja mais você”, do Grupo Raça, tema de Tuquinha, e “Você ainda vai voltar”, da dupla Leandro & Leonardo, tema de Helena e Mário. Estas casavam perfeitamente com os personagens em questão, mas como, particularmente, não gosto desses estilos musicais, definitivamente, FELICIDADE Nacional não me causa boa impressão. A pior, em minha opinião, é “O amigo do rei” do Pery Ribeiro - uma música enjoada para um personagem extremamente chato, neste caso, o Ataxerxes. “Casou” bem. O pior é que se trata de uma das músicas mais tocadas durante a novela. Claro, há músicas interessantes, como “Começo, meio e fim” do Roupa Nova, canção que, por sinal, apesar de ser tema do casal protagonista, se tornou o símbolo de toda a novela. Elis Regina com “Velho Arvoredo” é de uma beleza encantadora, assim como Beto Guedes com “Meu ninho”.


Já, FELICIDADE internacional contém uma seleção de músicas agradáveis. Praticamente todas as canções são boas e fizeram (e ainda fazem) muito sucesso. Algumas ficaram marcadas como temas dos personagens. Há quem diga que o jamaicano Jimmy Cliff tenha feito “Peace” especialmente para a novela. Procurei informações a respeito, mas nada foi comprovado. O certo é que a música é linda e de alguma forma, deixou a vilã Débora ainda mais interessante. "Set Adrift On Memory Bliss" do P.M. Dawn abre o disco trazendo um sample da clássica “True” do Spandau Ballet e ilustrava as paisagens cariocas. Alváro se encontrava com Helena ao som contundente de Michael Bolton com "When a Man Loves a Woman". E "Set The Night To Music" com Roberta Flack & Maxi Priest pontuava as cenas do bom moço, Mário, eternamente apaixonado por Helena. Curiosamente, a baladinha gospel da cantora Martika, “Love… Thy Will Be Done", serviu como tema do esquentado Zé Diogo.

Você, que está lendo esse texto, pode até não gostar, mas a música principal desse disco e da novela, é, sem dúvidas, "Theme From "Dying Young", do Kenny G., tema do filme homônimo lançado no mesmo ano, e aqui, na novela, tema de Helena. Há quem odeie, mas de alguma forma, o lamento saxofônico embala com exatidão os dramas da personagem.

Ainda há músicas interessantes que ainda não foram executadas na novela (até então), como a poderosa "Miles Away" da banda Winger e "Caminando Por La Calle" do Gipsy Kings, ainda que, essa última, em ritmo cigano, esteja descontextualizada da novela.

Enfim, as trilhas de FELICIDADE, como sempre, embalando os personagens e suas histórias na telinha e, também, a nossa vida e memória afetiva. 
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“ ENCONTRAMOS A FELICIDADE QUANDO TEMOS CORAGEM PARA RECOMEÇAR”
Por Raphael Ramos

Maitê Proença dando vida a uma das mais interessantes Helenas
Poucas tramas conseguem ser fiéis ao nome que elas carregam ao longo de mais de 100 ou 200 capítulos. ”Felicidade” conseguiu, não apenas ser fiel nisso como também conseguiu prender o telespectador pela qualidade de sua trama, pelos personagens bens construídos e pelo capricho do autor e colaboradores em ter a percepção que todos os personagens mereciam ter uma história do início ao fim, sem falar no desafio que é manter um ibope no horário das 18 horas sendo uma novela exibida numa época onde a internet não era uma febre.

Eu tenho tantos e inúmeros motivos para agigantar essa obra porque a vejo como excelente em vários ângulos. A cada ângulo chamarei por FELICIDADE não só pelo motivo do título da obra, mas pelos êxitos atingidos sob vários aspectos. São eles: FELICIDADE AUTORAL, FELICIDADE ARTÍSTICA, FELICIDADE CULTURAL E FELICIDADE PESSOAL (o momento crítico e pessoal que eu vivia na época com apenas 10 anos de idade).

Na minha modesta opinião, a década de 90 foi a mais inspiradora para Manoel Carlos. As melhores tramas do autor se concentram nestes anos e FELICIDADE foi a melhor no meu ponto de vista. O meu gosto geralmente não acompanha o gosto popular, quando se fala em Manoel Carlos muitos citam “Laços de Família”, “Mulheres Apaixonadas”, etc. A trama em questão não se passa no Leblon e possui uma agilidade bem peculiar de cada capítulo. Ela se divide em duas fases bem definidas, personagens que começam, se desenvolvem e terminam sua história, locações diversificadas como o bairro Peixoto em Copacabana, a fictícia Vila Duília no Engenho Novo e a primeira fase que se passava na fictícia Vila Feliz no interior de Minas Gerais. Manoel Carlos, ao lado de Elizabeth Jhin, Marcus Toledo e Eliane Garcia, prendiam a atenção de adultos e crianças cada vez que a tela congelava na última cena e o arco-íris finalizava o capítulo. As cenas na praça Peixoto, a escola das crianças, a igreja de Chico Treva, a vila do subúrbio davam ar de realidade e de cotidiano ao telespectador. Isso é uma FELICIDADE AUTORAL. Poucos autores como Maneco sabem fazer.

FELICIDADE ARTÍSTICA era ver tantos atores maravilhosos defendendo bem seus personagens. Apesar da trama estar sempre em volta dos desencontros de Álvaro (Tony Ramos) e Helena (Maitê Proença) muitas vezes provocados pelos próprios e milhares de vezes bloqueados pela mimada Débora (Vivianne Pasmanter), as tramas paralelas nunca foram sufocadas pelos protagonistas. Eu destaco alguns aspectos que me fazem admirar a trama:

- A segunda Helena de Maneco após dez anos de jejum é construída de muitos defeitos que a fazem querida e forte para o público. Sustenta mentiras, egoísmos, egocentrismos, forte no que quer e na criação da filha, mas fraca ao enfrentar os obstáculos do amor. Helena ama Álvaro, mas se ama infinitamente primeiro e isso é louvável para a mocinha de uma teledramaturgia.

- O personagem da antagonista Debora que foi brilhantemente defendido pela novata Vivianne Pasmanter que se superou em talento. Debora é uma mulher insegura, vingativa, mimada, fraca e que despertava tanta raiva que chegava a dar pena das insanidades cometidas.

Laura Cardoso em cena com Ester Goes
 - Quero destacar o carisma de Cândida (Laura Cardoso), uma avó que dava vontade de encher de beijos, suas cenas são lindas e cheias de carinho. Cândida era uma mulher rica e simples como o ser humano deveria ser, comedida em fofocas, mas sabia dizer a verdade diretamente doa a quem doer.

- Destaque para Ametista (Ariclê Perez), o melhor personagem da atriz em novelas. Uma mulher seca, amarga e que nunca é emoção, pois tem motivos pra ser só razão, religião e tradição. As cenas são ricas e densas quando nos colocamos no lugar de uma mulher que lutou com simplicidade para ter seu canto junto a terra e teve que abrir mão de tudo, segurar as loucuras do marido, teve que ver todo seu sonho em dançar e tudo que construiu se desmoronar ao ponto de dividir um cômodo de favor com amigos.

Bia (Tatiane Goulart) e Alvinho (Eduardo Caldas): sucesso na época
 - Destaque para o núcleo infantil em cenas tão singelas, leves e contagiantes. Esse foi o sucesso para a trama também conquistar o público infantil. O amor incondicional de Bia (Tatyane Goulart) e Alvinho (Eduardo Caldas) estava acima de qualquer desavença de seus pais, sem falar da música-tema e da amizade da amiga Bel (Aline Menezes) que deu um toque ainda melhor para o núcleo. 

A exuberante Sandra Brea em cena com Viviane Pasmanter, Ary Coslov e Tony Ramos
- Vale ressaltar o meu amor pela impagável Rosita (último personagem de Sandra Bréa numa novela inteira). Apesar do personagem ser escada para vilã e não ter muita trama, as cenas de Rosita são marcantes e marcadas pelo exagero da fala, da gesticulação, do alto astral. Parece que você vê a novela toda pelo mesmo tom, mas quando Rosita aparece o som aumenta, a alegria contagia o capítulo.

  A novela tem um toque muito importante chamado ANÍBAL MACHADO. O escritor é usado como fonte de inspiração pelo autor pra construir tramas e personagens. É onde entra a FELICIDADE CULTURAL. É importante dizer que os contos foram livremente baseados e adaptados. A fonte de inspiração e o autor possuem algo em comum: falar de temas densos em diálogos leves e personagens conflitantes. Confesso que o primeiro chamariz a me fazer ver a novela lá em 1991 foi ter lido para escola o conto “O piano”. Pontuarei esse conto e alguns que norteiam a novela:

- O conflito de João do Piano (Sebastião Vasconcelos) em não conseguir vender seu piano por já ser peça em péssimo estado de conservação, mas estimado por ser relíquia de família. O instrumento se torna um fardo quando a filha Selma (Ana Beatriz Nogueira) resolve se casar com Luiz (Bruno Garcia) e não tem onde deixar o piano. O dilema perdura por muitos capítulos até que João se sente um estorvo ao lado do piano e resolve dar fim a sua vida se afogando com o piano no meio da praia de Copacabana. Essa é uma das cenas fortes da novela que eu jamais esquecerei.

- O próprio protagonista Álvaro é atormentado pela acusação de matar por engano em Vila Feliz um menino chamado Zeca Ventania que ele vê em seus pesadelos ou em momentos de perigo. (No conto original chamado “O iniciado ao vento” o menino se chamava Zeca da Curva e a novela livremente promoveu algumas alterações).

Tuquinha Batista (Maria Ceiça): personagem inspirada em conto de Aníbal

- Dois contos norteiam a trama de Tuquinha Batista, personagem defendido com muito êxito pela novata atriz na época Maria Ceiça. Dona de um caráter forte e muito prestativa, Maneco reservou para a personagem o conto de Aníbal, “Monólogo de Tuquinha Batista”, quando a moça fala do amor que tinha pela zona norte e a resistência em não ir para a zona sul, mas principalmente no conto “A morte da porta estandarte” é que a personagem é traçada. Sua irmã Bel anuncia a sua morte através de um sonho. Na novela, Tuquinha era porta bandeira da G.R.E.S Estácio de Sá e é morta a facadas pelo ex namorado ciumento Tide (Maurício Gonçalves).Ótimas as cenas gravadas na quadra da escola.

- Vários outros contos são fontes de inspiração que criaram personagens: “Acontecimentos em Vila Feliz” serviu de inspiração para os personagens Mario (Herson Capri), Zé Diogo (Marcos Winter) e Chico Treva (Edney Giovenazzi), o horripilante e mudo ogro que não fazia mal a uma formiga. O conto “Tati, a garota” foi a base para o relacionamento entre mãe e filha de Helena e Bia e o conto “O telegrama de Ataxerxes” foi pano de fundo para o sonhador, falido e inconsequente Ataxerxes (Umberto Magnani).

  Gostaria de terminar essa longa avaliação pessoal declarando que além de todos esses motivos que tenho para aplaudir de pé a novela, ainda existe um motivo mais forte: a FELICIDADE PESSOAL. Minha mãe foi a responsável por me fazer gostar de TV e junto com ela eu comecei a ver novela em “Livre para Voar” – 1984. “Felicidade” foi a última novela que nós vimos juntos antes da sua partida precoce. Se em 1984 ela me convenceu a ver a primeira, eu a convenci a ver essa última comigo.

  Em meio a preparativos da festa de 15 anos da minha irmã, eu puxava a senhora Maria Aparecida para sentar-se comigo na sala e ganhar seu tempo de seis às sete. Muitas vezes eu ouvia ela dizer que a festa da minha irmã era a última coisa que ela gostaria de fazer em vida pois já sabia que andava bastante doente, muitas vezes ela relutava em ver comigo para agitar os preparativos, mas eu percebia que ela pensava duas vezes e vinha ficar ao meu lado, vejo hoje que ela agia como se tivesse me fazendo companhia pela última vez!

  Nos últimos capítulos da novela ela já se encontrava debilitada, mas fomos juntos até o fim da trama. Lembro que não conseguia ver quando sua reprise foi ao ar por lembrar dela doente ao meu lado, mas sem perder a força, a alegria e seu amor. Ela me deu a base para eu entender hoje o que é ter Felicidade. Felicidade não é um estado de espírito que conseguimos manter o tempo todo, mas é a certeza de que problemas, decepções e tristezas virão e eu serei atingido, mas não me deixarei abalar. A gente levanta e não se faz de coitado! Sorrio pra curar a dor! Termino com o trecho da música da trilha da novela “Estrela Amiga” (grupo Ping Pong), trecho esse que ela cantava pra mim: “Eu tenho tanto que sonhar, cada vez eu sonho mais, quem tem a sua estrela amiga, sonha (dorme) em paz...”
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Wesley e o melão. Rapha e eu curtindo o carnaval: será o desfile de Tuquinha Batista?



E você, o que mais curte em "Felicidade"? Deixe seu comentário! 
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LEIA TAMBÉM: 

Dossiê “Dancin’Days”: a novela que fez o Brasil dançar!



Série Memória Afetiva: 12 trilhas internacionais – por Wesley Vieira






terça-feira, 16 de abril de 2013

Estrelas mudam de lugar... mas jamais deixam de brilhar! Viva Cleyde Yáconis!









CLEYDE YÁCONIS (1923-2013)

Irmã da lendária Cacilda Becker, Cleyde também é daquelas atrizes superlativas, que defendem com dignidade qualquer papel. Ela convence tanto quanto a perua falida Isabelle em “Rainha da Sucata”, quanto as avós amorosas que viveu em “Vamp” (1991) e “Eterna Magia” (2007). A matriarca Guilhermina Taques Penteado, de “Ninho da Serpente” (1982) é um de seus grandes papéis na tevê. Mas a doce Melica, de “Os ossos do Barão”, remake do SBT, também tem um grande número de admiradores. Recentemente, pudemos rever Cleyde como um dos grandes destaques de “Passione” (2010), como Dona Brígida, a assanhada velhinha que mantinha um caso com o motorista Diógenes, vivido por Elias Gleiser. Ela é a razão de ser de produções pouco memoráveis como “Sex Appeal” (1993), em que roubou todas as cenas, mas também pode ter apenas um delicioso momento como em grandes produções como a minissérie “Um só coração” (2005), em que viveu ela mesma. O fato é que Cleyde Yáconis é indispensável e marcante em qualquer produção.




Cleyde Yáconis, perdemos seu talento, mas para sempre teremos sua história. Obrigado por tudo! 

sexta-feira, 12 de abril de 2013

De “Glee” a “Pé na Cova”, o melão também prefere séries



Elenco de "Pé na Cova" reunido

Não é novidade que, em se tratando de teledramaturgia, as telenovelas estão no topo de minha preferência. Mas também adoro séries e acompanho a sua evolução desde os tempos em que as tramas tinham início, meio e fim em cada episódio, até as mais atuais, que ganham cada vez mais ares de telenovela, com seus ganchos e tramas folhetinescas que se estendem por toda a temporada. Enquanto as séries, com seus episódios semanais e por seu formato compacto, permitem um trabalho de escrita mais cuidadoso e um tempo maior em sua elaboração, as novelas, geralmente, têm um processo diário, mais industrial, com prazos mais rígidos e envolvendo um número bem maior de ideias, tramas e profissionais. Por outro lado, as novelas, mesmo as com audiência insatisfatória nunca ficam sem desfecho. Novelas podem ser encurtadas pelo fracasso ou esticadas pelo sucesso, mas a legenda “fim” jamais aparece enquanto todas as tramas não estiverem concluídas ao passo que as séries, caso não correspondam ao sucesso esperado, são canceladas sem dó nem piedade deixando as tramas em aberto e espectadores órfãos, como foi o caso de “Pan Am”, cuja primeira temporada terminou sem desfecho algum, deixando todas as tramas no meio do caminho e o espectador a ver navios, digo, aviões. Por essas e outras razões, as telenovelas ainda são meu porto seguro, o que não me impede de ter minhas séries favoritas e vibrar com cada uma delas.

 Minha favorita de todos os tempos para sempre será “Sex and the City”, pela capacidade de, no decorrer da série, escapar dos quatro arquétipos femininos propostos e criar personagens tão ricos e multifacetados em episódios tão engraçados quanto envolventes. Sim, as quatro meninas de Manhattan habitarão para sempre em meu coração. Mas minhas preferências também passam por “Downton Abbey”, um verdadeiro novelão, e por “Mad Men”, pela perfeita reconstituição de uma época que adoro, pelo subtexto sempre presente e pela total quebra de expectativa a cada episódio. Mas no momento, tenho apreciado as séries mais transgressoras, que rompem com paradigmas ou ousam de alguma forma como “Girls”, “Pé na Cova” e (acredite!), “Glee”.

Lena Dunham em cena de "Girls"
Confesso que gostei mais da primeira temporada de “Girls”, que já ganhou um post aqui no blog. Nessa segunda, a decadence das meninas ficou um pouco mais deselegante. O texto continua genial e as atuações idem. Admiro a coragem e a ousadia de Lena Dunham (criadora, autora, produtora, diretora e atriz da série) ao expor seu corpo fora dos padrões de beleza impostos pela sociedade em cenas fortes, mas nem por isso apelativas. Mas não consigo mais torcer pela sua personagem, Hannah (uma escritora que não escreve nunca), cujas atitudes beiram à infantilidade. O que seria uma série sobre a difícil inserção dos jovens na vida adulta foi se transformando aos poucos na saga de personagens neuróticos com complexo de Peter Pan que se recusam a crescer. Amor mesmo só por Adam, espécie de “Mr. Big” de Hannah, bem mais amoroso do que o eterno objeto de desejo de Carrie Bradshaw em “Sex and the City”. Ainda sim, considero “Girls” uma boa série com fôlego suficiente para muitas temporadas.

Elenco da terceira temporada de "Glee"
Enquanto isso, “Glee” continua no topo de minhas preferências. Como não amar essa série? E antes que os mais “cults” me apedrejem, considero sim uma série pra lá de transgressora sem parecer ser. Mais transgressora que “Modern Family”, por exemplo, que até acho simpática, mas esconde todos os estereótipos por trás de uma embalagem moderna: a típica família americana, o pai trapalhão, a filha periguete, a filha nerd, o filho lesado e a mãe tentando controlar tudo, o coroa que se casa com a latina sexy e o casal gay assexuado. “Glee”, ao contrário, tem uma embalagem careta: jovens estudantes cantando um punhado de hits de todos os tempos da música pop americana. Mas é justamente essa embalagem, digamos, comercial que fisga o grande público, que embarca pra valer na saga do coral estudantil com todos os seus dilemas típicos da idade. O mais bacana em “Glee” é que as lindinhas são meras coadjuvantes, enquanto as consideradas minorias são o centro das atenções, a começar pela obstinada Rachel Berry, uma força da natureza defendida com brilho e garra por Lea Michele, uma mocinha completamente fora dos padrões convencionais, tanto na aparência quanto nas atitudes, nem sempre éticas. Além dela, há o gay, o cadeirante, a negra obesa, a latina gostosa, a portadora de Síndrome de Down, todos extremamente cativantes e nunca na posição de coitadinhos. “Glee” explora o lado bom do politicamente correto e dá voz a personagens que nunca tiveram vez em outras produções. E verdade seja dita: que outro programa da tevê aberta e voltado para jovens tem a ousadia de, não só mostrar o tão cobrado beijo gay, mas tratar as relações homoafetivas em pé de igualdade com outros romances da série? Os gays de “Modern Family” não chegam nem perto em matéria de ousadia se comparados aos de “Glee”. Acreditem, “Glee” é mais transgressor do que parece ser.

Velório Drive Thru: uma das loucas cenas de "Pé na Cova"
Por fim, outra série que não perco por nada é a nossa, muito nossa “Pé na Cova”. A série de Miguel Falabella é simplesmente deliciosa. Não tem o humor hilariante e escancarado de “Toma lá, dá cá”, nem a crítica tão abertamente corrosiva de “A vida alheia”, criações anteriores do autor. “Pé na Cova” possui esses dois elementos, só que de maneira mais sutil. O humor não é gratuito, todas as piadas têm um objetivo. O programa faz rir, mas também possui uma melancolia que nos leva à reflexão sobre a vida daquelas pessoas carentes de tudo, como diria Milton Nascimento, “uma gente que ri quando deve chorar e não vive, apenas aguenta”. Os personagens são deliciosos, a começar pelos nomes: Adenoide, Soninja, Luz Divina, Alessanderson, Odete Roitman, Tamanco... O elenco afiadíssimo brilha intensamente, comandados pelos veteranos Marilia Pêra e Miguel Falabella, em atuação comovente, diferente de tudo o que ele já fez como ator. E aquela estética “kitsch”, colorida, mesclada com muitas doses de bizarrice nos remete aos impagáveis e geniais filmes oitentistas de Almodóvar. “Pé na Cova” é um verdadeiro tapa na cara da sociedade, um grito contra a caretice estabelecida em nosso país. Consegue divertir e comover ao mesmo tempo. Sem dúvida, uma das melhores produções de nossa teledramaturgia dos últimos tempos. Absolutamente necessária nos dias de hoje. Que venham outras temporadas.

E enquanto as novas temporadas de “Downton Abbey” e “Mad Men” não chegam, no momento estou conferindo “Smash”, espécie de “Glee” para adultos e achando interessante. Enfim, mesmo que ocupando o segundo lugar no pódio (as novelas, pra mim, são imbatíveis), melão também adora e prefere séries.

Mad Men: genial após seis temporadas
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E vocês? Quais seriados estão assistindo no momento? Melão quer saber. Deixe seu comentário!

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LEIA TAMBÉM: 

O sexo, a cidade e nenhum glamour 


“A vida alheia”: humor inteligente e ousado na TV.





quarta-feira, 3 de abril de 2013

Blogueiro convidado: Aladim Miguel celebra a reprise de “O profeta”



 Um dos parceiros mais constantes aqui no melão, o querido amigo Aladim Miguel está de volta como blogueiro convidado, desta vez para falar de “O profeta”, novela de Ivani Ribeiro que ganhou um remake pelas mãos da incrível dupla Duca Rachid e Thelma Guedes, sob a supervisão de Walcyr Carrasco. O bem-sucedido remake marcou a estreia da dupla como autoras-titulares e agora ´pode ser visto no “Vale a pena ver de novo”. Munido de sua prodigiosa memória, Aladim nos brinda com um delicioso texto que passeia por toda as tramas de forma tão detalhada que torna essa reprise imperdível. Confira:


O MELÃO ACREDITA QUE “O PROFETA” ESTÁ ACIMA DO BEM E DO MAL



 Por Aladim Miguel
                                         
                                               
    Atual cartaz da sessão “Vale a Pena Ver de Novo”, da TV Globo, a nova versão da novela “O Profeta”, assinada por Duca Rachid, Thelma Guedes, escrita com Júlio Fischer, com a colaboração de André Ryoki, Thereza Falcão e Alessandro Marson e a supervisão de texto de Walcyr Carrasco, é um verdadeiro presente que ganhamos nas nossas tardes. Exibida pela primeira vez entre 16 de Outubro de 2006 e 11 de Maio de 2007, com 178 capítulos às 18 horas, e dirigida por Roberto Talma, Mario Márcio Bandarra, Vinícius Coimbra e Alexandre Boury, a novela foi um sucesso de público e crítica e comprovou, mais uma vez, o eterno fascínio que as obras da grande mestra Ivani Ribeiro têm sobre os admiradores da boa e clássica teledramaturgia, vale lembrar aqui que três remakes de suas obras, A Gata Comeu (1985), Mulheres de Areia (1993) e A Viagem (1994), grudaram na memória e no coração do público pra sempre.
           
Personagens centrais do remake

Mas vamos à trama de “O Profeta”, que começa em Minas Gerais nos anos 40 e depois avança 15 anos e vai parar em 1955. Marcos (um trabalho brilhante de Thiago Fragoso, perfeito em seu primeiro protagonista), um rapaz que tem o dom da premonição e fica bastante perturbado depois que não consegue salvar a vida de Lucas (Henrique Ramiro), seu irmão mais novo, que acaba morrendo afogado em um rio, sem que ele possa fazer nada, uma vez que já havia previsto esse acidente em sua infância. Frustrado com suas intuições, ele se muda para São Paulo, para tentar uma nova vida, e vai morar com Ester (Vera Zimmermann), sua irmã mais velha, lá ele conhece Sônia (Paola Oliveira, linda e totalmente inspirada na princesa Grace Kelly), o grande amor de sua vida. Mas o casal tem que enfrentar alguns obstáculos para selar seu amor, no meio do caminho, como a invejosa, interesseira e malvada Ruth (Carol Castro, que inclusive se baseou em Bette Davis para a construção da personagem), que se apaixona pelo profeta e o faz usar seus poderes para o mal. Se de um lado Ruth faz de tudo para separar o casal, do outro temos o grande vilão Clóvis (mais um trabalho inspirado de Dalton Vigh), que de tantas armadilhas e chantagens consegue se casar com Sônia, e transformar a vida dela em um inferno, usando de todas as crueldades para domar a esposa. No meio dessa confusão toda ainda está o vingativo Camilo (o ótimo Malvino Salvador), eterno apaixonado por Sônia e primo de Marcos. Mas como no final sempre o amor vence tudo, o casal acabou tendo um final feliz.

O lado cômico da trama ficou por conta das várias situações criadas por três personagens bem divertidos: Tainha (Rodrigo Faro, que soube aproveitar muito bem sua veia cômica e foi responsável pelos momentos mais engraçados da novela, um show!), um jovem feirante apaixonado por Gisele (Fernanda Rodrigues), por quem é capaz das maiores loucuras.                           

Fernanda Rodrigues e Rodrigo Faro: sucesso como o casal Gisele e Tainha

A gordinha Carola (Fernanda Souza, em um papel difícil e delicado) - filha da ambiciosa Lia (Nívea Maria) e irmã de Ruth e Tony (Daniel Ávila) – que é platonicamente apaixonada por Marcos e usa o ingênuo e atrapalhado Arnaldo (Rodrigo Phavanello) em suas armações. Ele por sua vez, também a usa para fazer ciúmes em Teresa (Paula Bulamarque, uma loura platinada a la Marilyn Monroe), namorada do mulherengo Henrique (Maurício Mattar). Mas o tiro sai pela culatra e o destino faz com que nasça uma grande paixão entre os dois.
       
Carol Castro, Nívea Maria e Fernanda Souza: destaques do elenco

O terceiro personagem marcante do núcleo de humor foi a falsa cartomante Madame Rúbia (Rosi Campos), que se aproveitava da ingenuidade das pessoas para aplicar golpes como “A Profetisa”, uma das suas vitimas foi a fútil Miriam (bom momento de Juliana Baroni, com seu visual homenageando a Diva Rita Hayworth), que traia Alceu (Nuno Leal Maia), seu marido, com Ernesto (Mário Gomes), o marido da vidente.      

Mario Gomes, Juliana Baroni, Nuno Leal Maia e Rosi Campos: responsáveis por cenas divertidas da novela
             
Os conflitos dos jovens rebeldes dos anos 50 eram representados pelo triângulo amoroso formado por Baby (Juliana Didone), Tony e Wandinha (Samara Filippo).
   
Núcleo jovem da novela

A questão do preconceito racial era discutido através da pequena Natália (Vitória Pina), que tinha muita vergonha de sua mãe negra, a humilde Dedé (Zezeh Barbosa), e a escondia de todos, fazendo inclusive que seus colegas de colégio pensasse que ela era sua empregada.    
Zezeh Barbosa excelente em cena
                                          
O núcleo espiritual, um dos mais fortes da trama era formado por, Francisco (Mauro Mendonça) - o dono do centro Kardecista e do restaurante da cidade dirigido por sua esposa Abigail (Laura Cardoso) - e a rígida Hilda (Ana Lucia Torre), a inspetora da escola onde Ester é diretora.                                

“O Profeta” só teve um CD que misturava os seus temas nacionais e internacionais. Destaque para as canções interpretadas pelos participantes do extinto Programa Fama. “Além do Olhar”, o tema de abertura com Ivo Pessoa e (They Long To Be) “Close To You”, belo tema de Marcos e Sônia, interpretado com emoção pela dupla Cídia e Dan.

Três grandes clássicos sucessos internacionais dos anos 50, “Only You”, “You Are My Destiny”, ambos interpretados pelo cantor Oséas, e “Molambo”, com The Originals, foram rebobinados para a trilha da novela.

Elis Regina com “Fascinação”, Zeca Pagodinho com “ Beija-me”, Gal Costa com “Caminhos Cruzados” e Erasmo Carlos - em dueto com Adriana Calcanhoto - com “Do Fundo do Meu Coração” também tiveram destaques na trama.

Mauricio Mattar, Paula Burlamaqui, Rodrigo Phavanello e Vera Zimmermann: quadrilátero amoroso. 
  
“O Profeta” marcou época, tanto na TV Tupi, em 1977, quanto na TV Globo, e deixou sua marca registrada em nossa teledramaturgia, um clássico que, com certeza, é uma ótima pedida para os seguidores do “Vale a Pena Ver de Novo”.

Aladim Miguel e eu
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