Jamais vou ter a pretensão de elencar as melhores e mais marcantes cenas de todos os tempos de nossa teledramaturgia, afinal, desses 60 anos, devo ter vivenciado, no máximo, 30. Por isso vou escolher a minha cena favorita, que serve pra simbolizar todas as outras tantas e tantas cenas maravilhosas e antológicas que nos fizeram rir, chorar, vibrar, se emocionar. Mensurar a importância da telenovela na vida do brasileiro também é algo quase impossível, visto que ela está tão entranhada em nossa cultura que não conseguimos imaginar tevê sem novela. E foram tantos os astros, estrelas, autores, diretores e demais profissionais que construíram essa história, que também seria injusto mencionar esse ou aquele.
Portanto, minha cena favorita é altamente subjetiva e o principal motivo que fazem dela minha preferida é que ela é muito completa sob todos os pontos de vista. Na verdade, nem é uma cena e sim, uma sequência de cenas: A CHEGADA DE TIETA EM SANTANA DO AGRESTE em “Tieta”, novela de 1989, de Aguinaldo Silva em coautoria com Ricardo Linhares e Ana Maria Moretsohn que guardo com carinho na parte mais preciosa de meu baú afetivo de recordações.
Gosto muito da sequência porque ela carrega vários elementos que uma boa telenovela deve ter: trilha sonora emocionante, belas paisagens, um quê de mistério, apresenta lindamente a protagonista, é emocionante, é engraçada, quase todo o elenco participa e, basta assistir a essa cena para se ter uma ideia bem clara do que é a novela, ou seja, Aguinaldo Silva foi absolutamente certeiro e genial em seu poder de síntese. Não conheço outra sequência de cenas que sintetize uma trama de forma tão perfeita.
Então vamos a ela. Tieta (eterna Betty Faria) chega triunfante na cidadezinha em seu carrão vermelho conversível. Ainda não vemos seu rosto. Enquanto ela chega, vai relembrando os momentos que viveu por ali. Ao som de “Coração do Agreste”, na voz e interpretação emocionante de Fafá de Belém, são inseridas cenas de Tieta quando jovem, vivida por Claudia Ohana. Quando enfim o carro chega na praça, vemos que a Tieta agora é Betty Faria e traz consigo Lídia Brondi a chamando de “mãezinha”. Após isso, vemos um momento hilário com o mendigo Bafo de Bode (um impagável Bemvindo Sequeira), que se impressiona com a voluptuosidade do derriére da moça, manda a antológica frase: “isso não é mulher, é uma plantação inteirinha de xibiu”. Mal sabe Tieta que toda a população está naquele momento celebrando a missa de sétimo dia de sua morte. E ao entrar de forma esfuziante igreja adentro é reconhecida apenas por sua madrasta Tonha (Yoná Magalhães), que explode em emoção. E aos poucos os personagens vão sendo apresentados a Tieta e a todo o público, inclusive a vilã Perpétua (Joana Fomm) e todo o seu cinismo e dissimulação. Enfim, o circo está armado. A partir dessa cena, teremos pela frente uma novela deliciosamente irreverente, emocionante, engraçada e sensual.
Com essa sequência de cenas, melão celebra os 60 anos da teledramaturgia e parabeniza a todos nós por esse produto genuinamente brasileiro que criamos e que nos faz sonhar por noites e noite a fio. Brindemos!
E vocês? Sei que é difícil, mas qual é sua cena favorita desses 60 anos?