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sábado, 18 de junho de 2011

Entrevista especial - TUNA DWEK: “A arte nos captura a despeito de nós mesmos”


Tuna Dwek, revelada por Fernando Torquato.

Mais uma vez, anuncio com imensa felicidade um “post” de luxo, pois a nova entrevistada do melão é classe A em todos os sentidos. Ela está em todas: desde embalagens de margarina a eventos internacionais. Ela é multi-talentosa: atriz, intérprete, tradutora, jornalista, escritora, biógrafa, enfim... não há limites para os domínios de Tuna Dwek, com quem estou tendo o imenso prazer de trabalhar em minha estreia como roteirista de televisão. Tuna nos fala um pouco sobre sua personagem, a enigmática secretária Nilza, de “O astro” e logo após nos concede uma rica e deliciosa viagem por sua vida pessoal e profissional, que contou com a participação especialíssima de Alcides Nogueira, que contribuiu com uma pergunta. Uma trajetória emocionante e inspiradora que os leitores do melão vão ter o prazer de acompanhar. Vamos deixar que a entrevista fale por si e, parafraseando Caetano, nos revele “a voz de uma pessoa vitoriosa”. Com vocês, Tuna Dwek, de corpo, alma e coração!

Melão - Primeiramente, não posso deixar de perguntar sobre “O astro”.  Quais são suas expectativas para o remake? Fale um pouco sobre a Nilza, sua personagem.



Tuna - É tanta minha empolgação com “O Astro” que qualquer objetividade me parece impossível. Evito a palavra “expectativa” na minha profissão, mas baseada em algo concreto como o alto nível de qualidade dos capítulos que tenho recebido, ouso intuir tanto uma enorme receptividade por parte do público como sua recíproca  satisfação pessoal, especialmente porque a série mantém a essência da grande Janete Clair, sua dramaturgia, seu ritmo, na conjunção  de uma trama contemporânea com elementos cativantes de drama, humor, amor, tragédias, alegrias e tristezas, golpes, falcatruas, desavenças e reencontros e muita paixão, assim como é na vida cotidiana, com um texto sólido e instigante do ponto de vista dramatúrgico esculpido com a maestria de Alcides Nogueira e Geraldo Carneiro (e seus colaboradores Tarcisio Lara Puiati e Vitor de Oliveira). Com direção de Allan Fiterman, Fred Mayrink, Noa Bressane, direção geral de Roberto Talma e Mauro Mendonça Filho e uma equipe talentosa com quem já tive a sorte de trabalhar, você pode imaginar o estado emocional em que me encontro.


Quanto a Nilza, a cada capítulo, descubro uma faceta. Não se trata de uma personagem monolítica, pelo contrário, é uma secretária dedicada, cheia de energia e vivacidade que em vários momentos apresenta uma certa ambiguidade, um olhar furtivo, algo não manifesto. Ela permanece um mistério para mim porque vejo que talvez ela não seja o que parece, mas não saberia detectar por quê . Então vou embarcando nela à medida do que vou lendo nas cenas e sou um tipo de atriz que se entrega à direção, não cristalizo nada, a Nilza é uma obra aberta e, provavelmente, essa “perfeição” toda também tenha seus mistérios. Sua relação com Amanda é sólida e já nas leituras com Carolina Ferraz estabelecemos uma cumplicidade deliciosa. Gosto de personagens palpáveis, reais, com seus paradoxos, sua humanidade e a riqueza que a aparência nem sempre traduz. Me apaixono sempre por minhas personagens, visto a camisa e defendo até a última cena.

Melão - Quantos idiomas você fala? De onde vem essa facilidade em aprender línguas diferentes? 

Tuna - Falo cinco idiomas e meio. No programa do Jô, ele perguntou: “e meio? Tem alguma língua que você fala só três vezes por semana?” Foi hilário, mas expliquei que estou aprendendo a falar árabe, mas são anos e na realidade, embora de família síria só comecei a me interessar pela língua depois de adulta. Consigo me comunicar na Síria, no Líbano, no Egito ou na Jordânia, mas ainda falta muito para afirmar que falo. Seria pretensão. Além disso, os judeus sírios têm expressões bastante características em árabe. Essa facilidade , como você diz, venha talvez de alguns fatores:

- me alfabetizei em francês, em São Paulo, portanto desde criança alternava português e francês, como ia muito ao cinema (era meu refúgio por assim dizer, na adolescência) o inglês foi se incrustando nos meus ouvidos.
- talvez tenha um certo ouvido musical como se diz. Registro sons, cadências, inflexões e me interesso profundamente pela comunicação com os outros.
- a Necessidade faz a Arte. Tive que viver um tempo fora do Brasil e não tive escolha senão aprender a língua do país, como o italiano, por exemplo e por não saber se ou quando voltaria para cá, tive que me aprimorar. Além disso, gosto de treinar sotaques, acho divertido passear por eles, fazer variações entre eles e vários personagens que interpretei me deram essa possibilidade. 

Tuna foi intérprete da atriz Catherine Deveuve em evento recente.
Uma vez que trabalho como intérprete também (de vários atores, diretores de teatro, cinema, música) continua o treino poliglota, sou observadora e  gosto de me esforçar para me comunicar na língua dos outros em vez de vê-lo se acabar para falar português. O fato de falar idiomas, inclusive, me abriu vários caminhos como atriz. Não é nada fácil conservar o vocabulário em outras línguas, quantas vezes nos perguntamos se é assim mesmo que se fala numa ou noutra língua? Especialmente quando as sonoridades são similares.

Melão - Quando você percebeu que gostaria de se tornar atriz e qual foi o marco inicial de sua de sua carreira?

Tuna - A coisa menos clara que tenho é se houve algum momento especifico em que eu percebi que gostaria de me tornar atriz. Foi algo natural na adolescência, mas só se solidificou depois de ter tido uma infinidade de experiências humanas e profissionais. Mas acredito em vocação, por mais que fujamos dela e não saibamos detectar o que é realmente essa força que nos impulsiona quase que à revelia, em direção à Arte. Ela nos captura a despeito nós mesmos. Há, acredito, indícios, mesmo se eles se alojam no inconsciente muitas vezes. E fatos que despertam essa vocação. Muitas vezes sentimos uma falta que nada preenche e isso é o estopim...

Desde pequena, na escola, declamava os clássicos e os poetas franceses na aula de Literatura Francêsa e os brasileiros e lusitanos nas aula de Literatura Portuguesa, num  palquinho na classe, na frente de todos, era de se desmaiar de medo porque as professoras eram rígidas, não se podia errar e a classe era a plateia. Era também muito prazeroso e permanece presente em mim aquele coração pulsando, a adrenalina excitante e mal sabia eu que teria que fazer isso tantas e tantas vezes nos últimos 25 anos! Sempre adorei ir ao teatro e não perdia na TV um Teleteatro que fosse, com Cacilda Becker (com Homero Kossac, Xandó Batista e Barbara Fazio).Pequena , meu  pai nos levava a mim e meu irmão ao teatro aos domingos de manhã, acho que o bichinho estava incubando dentro de mim. Dos 17 aos 19 anos fiz Teatro Amador, parei por muitos anos, ao morar fora não exerci a atividade e só retomei nos anos 80, entrando na EAD (Escola de Arte Dramática) onde pude estudar, ler, encenar, desde clássicos gregos a autores contemporâneos. Estreei com o espetáculo “Divinas Palavras”, de Ramon Del Valle -Inclán, com direção de Iacov Hillel, fazendo uma substituição, com Laura Cardoso, Rodrigo Santiago, Imara Reis, Maria do Carmo Soares e Paulo Gorgulho. Foi um batismo inesquecível e um aprendizado que eu levaria para todos os segmentos da atividade artística. Perseverar é muito difícil porque uma vez no universo profissional, manter-se é atividade hercúlea, mas ser ator é tão irreversível e vital quanto respirar para viver.

Melão - Entre os seus múltiplos talentos, está o de biógrafa. Qual é o desafio em contar a história de pessoas cujas experiências de vida são tão ricas, como Alcides Nogueira, Maria Adelaide Amaral e Denise Del Vecchio?

Tuna - Obrigada pelo comentário generoso. Desafio é a palavra certa. Antes de mais nada, se eu não tiver uma relação muito próxima e de imenso afeto, admiração e respeito pelo biografado, não sai uma linha de mim. De tão ricas que são as vidas dessas três queridas pessoas, eu precisava me aproximar com a máxima delicadeza do universo interior de cada um e tecer um bordado quase em que nada ficasse de fora, fatos importantes assim como detalhes que fazem a diferença e que traduzisse quem é aquela pessoa, que história ela tinha para contar dentro de suas características únicas. O grande desafio é escrever na primeira pessoa com a voz do biografado, dar meu tratamento literário e por vezes poético ao fluxo caótico da memória manifesta. Penetrar na alma de cada um sem invadir as emoções que isso traz. Foram processos estupendos posso dizer sem reservas nem pudor. Foram meses de trabalho e convivência para o livro, mas anos de convivência com os amigos que são. Tive a honra e a alegria de ouvir que cada um se reconhecia em meus livros, salvo o ajuste de um ou outro fato, uma ou outra data, meus textos foram impressos tal qual os compus, a descrição que faço no prefácio de cada um deles e da minha relação específica com cada um é um depoimento indelével de como na se pode escrever sobre alguém ou dar voz a esse alguém com verdade se não se tiver convivido, compreendido, abraçado essa pessoa tal como ela é, em sua plenitude, idiossincrasias, vulnerabilidades, paixões, sua história, respeitando o tempo de cada um, a disponibilidade. Muitas vezes, era muita emoção, era mexer em muita coisa, precisava decantar, dar um tempo, metabolizar para retomar o processo.

Nos três vejo uma coerência de atitudes que permanece até hoje. Os três lutando sempre pela liberdade de expressão, pela especificidade de cada um, os três sempre se posicionaram contra a Ditadura Militar, os três tem em sua Arte uma posição humana e humanista que obstáculo algum foi capaz de esmorecer. Havia momentos de pânico em que eu achava que não conseguiria mais escrever, tudo parecia tão grande, mas eu tinha em mim a solidez das relações construídas ao fio dos anos com essas pessoas tão fortes em minha vida.

Tide e Tuna: biografado e biógrafa.
Foram três processos muito ricos. No caso do Alcides, no reuníamos na casa dele, muitas vezes falávamos de madrugada ao telefone até, o silencio da madrugada em volta estimulava a memória de certa forma, mexer nas fotos de sua infância e trajetória tinha um efeito muito forte emocionalmente para ele, e dávamos intervalos sem prazo até retomarmos as conversas. Porque eram conversas no sofá e não entrevistas com perguntas formais, eram viagens que exploravam a memória e o afeto. Como sempre digo, abordava sua alma com as pinças da delicadeza e ele não se furtou a nada.

Com Maria Adelaide, foi uma vivencia cotidiana, rodeada pela natureza maravilhosa, em sua casa de campo. Fomos para lá no Ano Novo, festejando com amigos e lá permaneci com ela, após caminhadas matinais com a cadela Nina, que eu adorava e  faleceu tempos depois, mergulhávamos em sua história com direito a muita emoção, lágrimas e risos porque sem essa entrega a gente acaba indo pelo caminho mais fácil, palatável, e a Adelaide é uma pessoa exposta, diz o que sente, o que acha, não calcifica suas ideias, consegue administrar vários pensamentos ao mesmo tempo e se emociona cotidianamente como boa canceriana, levanta  e agradece a Deus por mais um dia de saúde e de vida. Tendo viajado, me deixou em sua casa com seu material todo, recolhido em nossas conversas e escrevi o livro em seu computador, no mesmo em que ela cria os personagens que interpretamos. Foi quase místico.

Com Denise, que achava que sua vida não daria um livro, eu poderia escrever vários volumes. Sua trajetória pessoal - e ideológica -se mescla com a história do teatro das últimas décadas. Nos reuníamos em  minha casa ou na dela, e até que ela encontrasse as fotos que ilustram o livro foram meses em que aproveitamos para explorar ao máximo sua vida e  seu pensamento. Como ambas tínhamos nossas atividades profissionais, cada encontro tinha que ser otimizado e, muitas vezes, tínhamos que parar e retomar outro dia porque de certa forma é tudo quase que uma sessão de psicanálise, um desnudamento sem volta em que o biografado precisa sentir que está em terreno seguro, que é uma zona de confiança e despudor.

Tuna e Denise del Vecchio
Meus três livros são divisores de águas, são passos irreversíveis e documentos que traduzem os biografados sim, mas através da escolha das minhas palavras traduz a mim também. Levei um tempo para me dar conta, mas um dia o Alcides disse: “ nós vivemos, mas você escreveu”. A resposta que tive dos meus biografados depois de prontos os livros é algo que vou guardar dentro de mim como um tesouro, ouvi coisas preciosas e generosas que continuam pautando minha atitude perante a vida.

Alcides Nogueira pergunta: "Você trafega, com uma desenvoltura impressionante, pelo teatro, televisão e cinema. Em qual desses veículos você se sente mais inteira, como atriz?”.

Tuna - Querido, sempre generoso em seus comentários. Obrigada pelo que você diz. Se eu escolher um veículo serei injusto com o outro. Vou tentar destrinchar.
Meu amor por representar apesar de todo o pânico que antecede entrar em cena, é tamanho que onde eu estiver atuando estarei inteira. Amo ser outra pessoa, dar voz corpo alma a uma personagem, compor outro ser. Preciso da evasão, preciso ser outra e em outra realidade até para não enlouquecer de lucidez frente à realidade. Não é algo terapêutico, que fique claro, é o que eu sou, alguém que pode ser outro. Que pode viver essa esquizofrenia por assim dizer e ser eu mesma. Voltar para casa depois de dar voz a alguém que existiu no palco por algumas horas e se comunicou com os outros. Seja no palco, no cinema, na televisão. O teatro é algo indescritivelmente poderoso, a respiração da plateia que reage quase que sem respirar por momentos, explodindo de rir ou de chorar, a catarse de viver coletivamente algo que une o individual com o universal, a resposta imediata, o momento que não volta mais, superar o medo de errar, de esquecer texto, de dar branco e ao mesmo tempo a felicidade de estar ali, com seres vivos no ato que se concretiza naquele momento, isso é algo que o teatro dá e não tira.

Nos três, gosto de ser dirigida, de ver a escolha que o diretor irá fazer de um repertório infinito que traz um ator, em gestos, inflexões, resultados de uma intenção clara, mas a manifestação dessa intenção ou de uma emoção, formalmente, é o diretor que irá selecionar, registrar, reter.

No cinema e na televisão, o rigor na composição de uma personagem é o mesmo para mim, trabalhar em equipe, a cumplicidade que se estabelece apesar dos aspectos técnicos, as falas novas a cada dia, o desenrolar de uma história que pode ser gravada sem ordem cronológica são desafios que me instigam e mais uma vez, é atuar que me fascina, que faz com que eu me sinta inteira. A plenitude se dá de forma diferente e em momentos diferentes. No cinema e na Tv você vai ver o resultado depois, e não sabe o que seu trabalho estará preservado na edição, em função de um ritmo ou de outros fatores que independem da própria obra, no teatro é o tal “aqui e agora” e não dá para corrigir nada, é aquilo que é, que foi, e nos três casos, permanece em cada um que faz e que assiste a semente de uma reflexão, de uma transformação, de algo que a nunca mais ninguém vai ser, porque interpretar provoca isso, não sermos mais os mesmos a cada instante. Amo os três veículos, as pessoas que se entregam para contar uma história, ir além da imagem através da imagem.

Melão - Na sua carreira em TV, um de seus trabalhos mais marcantes foi a Marinete Prado de “Um só coração”. Que lembranças tem dessa personagem e que tal a experiência em ajudar a contar para o público, parte de uma história real da própria cidade em que vive?

Tuna - Com relação à Marinete Prado, tenho uma enciclopédia de coisas boas para contar. A começar pelo teste. Por ter existido e ser francesa e falar português com sotaque, havia o desafio não só da fidelidade a quem tinha sido como tornar inteligível o francês mesclado com o português. O teste tinha um texto sofisticado, como tudo o que Maria Adelaide Amaral e Alcides Nogueira com seus colaboradores, escrevem e como foi toda a minissérie, uma das mais informativas e refinadas de todas as da Tv Globo. Haviam testado muitas atrizes já e eu cheguei aos 45 do segundo tempo, só faltava a Marinete para fechar o elenco. Estudei bastante para o teste porque queria achar essa verdade e se a gente não faz a personagem o sotaque não vem fica falso, e como eu disse, é preciso saber dosar quando falar em Francês e quando em português com sotaque. Passei no teste, pulava de alegria feito uma cabrita, assumo, e começou uma experiência riquíssima. No elenco havia muitos atores do Teatro Paulista, amigos antigos, outros que não conhecia, a união entre os atores de São Paulo e do Rio foi sensacional. Digo isso porque iríamos contar uma história basicamente paulista, o que não fez a menor diferença porque as pessoas se prepararam e a convivência era muito prazerosa e lúdica. Íamos gravar em externa na fazenda de Yolanda Penteado, as gravações no estúdio naquela sofisticação da direção de Arte e contando uma história de pessoas que viveram tudo aquilo e um período extremamente fértil no país e em São Paulo, do ponto de vista da arte, da cultura, do pensamento, da política, sem falar da emoção de falar sobre a cidade onde cresci e vivo.
Recriamos entre nós atores a atmosfera que os personagens na época viveram. A amizade, a cumplicidade, sem jamais as brigas dos mesmos, claro. Ana Paula Arósio, Eliane Giardini, Betty Goffman, Selma Egrei, Pedro Paulo Rangel, Jose Rubens Chachá, Pascoal da Conceição, Claudio Fontana, Antonio Calloni, Erik Marmo, Fernanda Paes Leme e tantos outros, um time inesquecível, mas preciso destacar Tato Gabus, que fazia meu marido Paulo Prado. A generosidade desse ator e amigo, que me ensinou passos preciosos no fazer televisivo.
Para se ter uma ideia de nossa convivência, nos reuníamos, parte do elenco, no quarto de algum ator, no hotel para assistirmos juntos aos capítulos da minissérie. Era mesmo “Um só coração”!
Como a minissérie cobria o período entre os anos 20 e os anos 50, e o comprimento do meu cabelo chegava até o meio das costas, tive que fazer um corte radical, Chanel curtíssimo com franja. A partir de Marinete, engatei vários trabalhos. Participei de “JK”, “ Ciranda de Pedra”, “A favorita”, “Tempos Modernos”, “ Ti Ti Ti “, e agora “O Astro”.

Melão - De que forma você construiu a personagem Olímpia, uma dona de bordel em “JK”?
Tuna - Voce me pergunta sobre uma das personagens mais prazerosas, ricas de histórias e de nuances que interpretei. Tenho paixão por esse trabalho, de complexa composição interna e externa. Além de ter uns figurinos e maquiagem como poucas vezes eu vi, crédito seja dado a Emilia Duncan e Marlene Moura, que pesquisam incansavelmente a fidelidade ao real.

Para a sua construção, inicialmente contextualizei a minissérie e a personagem na época em que ela existiu, o que acontecia historicamente, mas também como era a mentalidade da época tanto nas elites como nos outros segmentos da sociedade brasileira. Especialmente no que diz respeito à sexualidade e a uma certa hipocrisia social que até hoje impera de modo globalizado, ainda que se observe uma  imensa evolução nos costumes e  nos discursos, ainda há muito para caminhar em  direção à satisfação dos desejos humanos. Reli “O livro das Cortesãs”, de Susan Griffin, um precioso documento.

Olímpia Garcia seria retratada durante três décadas praticamente. Por ser uma personagem real, que existiu e da qual pode-se contar muitas histórias que ocorreram, eu não poderia “ inventar” uma Olímpia, mas teria que aprofundar o que ela representava na época com seu cabaré, frequentado na juventude por Juscelino Kubistchek e seus amigos. Olimpia era dona do cabaré mais famoso e elegante de Minas. Políticos, coronéis, jovens abastados frequentavam suas meninas, tratadas com luxo e mão de ferro ao mesmo tempo. Olímpia tinha um gosto refinado, espanhola de Viga, conhecia os requintes da vida e as fantasias masculinas. Seu cabaré era bem cuidado, as moças escolhidas a dedo, a decoração suntuosa e o ambiente de total liberdade e discrição garantiam a lotação esgotada todas as noites.
Entretanto, todo esse glamour tem um preço: o lado B. Decidi, então, ao voltar de uma viagem à Espanha, onde em Madri pude treinar a pronúncia espanhola, uma vez que os sons das letras Z e S são muito específicos, ver o que se passava na noite paulistana, em locais menos elegantes digamos assim. Por mais refinado que seja o ambiente, não se pode esquecer que trata-se de pessoas que dependem de seu corpo, que o vendem para viver, que muitas vezes se submetem a situações de dominação por parte do cliente, humilhação e outras coisas não declaradas. E seguem regras rígidas. Visitei locais no Centro de São Paulo onde, por exemplo, via claramente o esquema de incitar o consumo dos clientes na casa, oferecendo bebida, mas as moças tomavam chá como se fosse uísque. Vi cubículos separados por uma parede onde os casais sem inibição alguma davam vazão a seus desejos, enfim, quis “desglamourizar” o que eu teria que trabalhar na personagem para poder, a partir da realidade, sem descaracterizar, colocar o brilho, a beleza, a leveza que o cliente busca em ambientes como o cabaré de Olimpia Garcia.

Quanto à pronúncia exata e o sotaque espanhol ao falar português, eu sempre digo que para se fazer um sotaque é necessário interpretar a personagem antes de mais nada, com verdade, é o único modo para que o sotaque venha de maneira orgânica. Entretanto, se não houver um cuidado com a técnica e a perfeição do sotaque, corre-se o risco e fazer uma caricatura ou ter uma interpretação falsa em que o sotaque se separa da personagem, o que torna ambos inverossímeis.

Tive a meu favor além de uma trama envolvente e um  texto primoroso, de Maria Adelaide Amaral, Alcides Nogueira, Geraldo Carneiro, Leticia Mey e Rodrigo Amaral, o fato de falar a língua e de conhecer a pronúncia do espanhol da Espanha, completamente diferente da pronúncia nos outros países de língua espanhola.

Melão - Em “Tempos Modernos”, sua personagem Justine também se comunicava em vários idiomas. A personagem foi construída especialmente pra você?

Tuna - Justine era poliglota sim e se comunicava no mesmo diálogo  em vários idiomas. Numa das cenas, por exemplo, ela diria uma palavra em vários idiomas ou a mesma frase igualmente. Era um exercício delicioso e efetivamente a personagem foi escrita para mim, o que me deixou muito honrada. Bosco Brasil e Maria Elisa Berredo conheciam meu trabalho como atriz e como intérprete de eventos internacionais,  de atores, cantores de ópera, diretores de teatro, cinema, enfim, sabiam que eu transitava por várias línguas , traduzia coletivas de Imprensa, montagens de palco enfim, conhecia  minhas  diversas vertentes profissionais  e me deu esse saboroso personagem. Eu faria uma participação especial de alguns capítulos, e me fizeram uma surpresa maravilhosa: permaneci até o final da novela e adorei. É muito gratificante quando uma personagem tem essa aprovação e se pode explorar outros limites, usar a experiência pessoal para enriquecer sua expressão.

Melão - Você se inspirou em alguém para compor a hilária Sueli Pedrosa, apresentadora sensacionalista em “Ti Ti Ti”?


Tuna - Obrigada por achá-la hilária! Eu adorava fazer a Sueli e armar uns bons barracos. Numa das rubricas de Maria Adelaide Amaral estava escrito “praticamente um homem”, e claro ela era uma mistura de vários apresentadores sensacionalistas, um tipo difundido na TV do mundo inteiro. Explorar a miséria humana, chorar na frente das câmeras, invadir a privacidade dos entrevistados, exagerar os dramas de terceiros para fazer aumentar a audiência, alimentar o imaginário mórbido do público, tudo isso se mesclava em Sueli, representante fiel desse tipo de jornalismo e seu estilo permitia uma grande liberdade na interpretação sem receio de parecer excessiva porque ela era real, ela existe como personagem porque existe na vida. A repercussão foi surpreendente e ocorreram alguns fatos divertidos como, por exemplo, um dia cheguei a uma recepção grande e um casal muito simpático veio “brincar” com Sueli dizendo “nós achamos que você iria invadir a sala e já começar a perguntar um monte de coisas”, porque adoravam a personagem, ou na rua pessoas me paravam dizendo” a Sueli chegou gente!”, ou seja, isso é reflexo de que ao me basear em vários tipos que existem, isso chega diretamente no inconsciente coletivo e as pessoas reconhecem o que estão vendo. Há vários programas vespertinos em que as pessoas armam barracos como os da Sueli.

Melão - Você é noveleira? Se sim, quais suas novelas favoritas como espectadora?

Tuna - Pode-se dizer que sim, na medida em que gosto do gênero, mas não é sempre que sigo uma novela todos os dias por causa do trabalho que muitas vezes não deixa tempo nem de ver pela internet.  Mas há algumas que me hipnotizam. Como passei alguns anos no exterior, há várias que não vi, mas me lembro que ao voltar me deparei coma reprise de “A Sucessora”, de Manoel Carlos, grudava na TV, assim como com “Água Viva”, de Gilberto Braga e “ Força de um desejo”, de Gilberto Braga e Alcides Nogueira. Adorei “O Clone”, de Gloria Perez, mas novelas que nunca mais esqueci... há algumas da extinta TV Excelsior, como “Sangue do meu Sangue”, de Vicente Sesso, “A Muralha”, “Beto Rockfeller ‘, de Bráulio Pedroso, “Que Rei sou eu?”, de Cassiano Gabus Mendes, e outras como “Roda de Fogo”, de Lauro Cesar Muniz. Gosto muito de “Dono do Mundo”, a primeira versão de  “Mulheres de Areia” e “Selva de Pedra”, e a imbatível “Vale Tudo”, assumo o vício! A primeira novela que vi por exemplo foi “ A moça que veio de longe” com Rosamaria Murtinho e aí o bichinho pegou. Afinal nasci em tempos de “O Direito de Nascer”, “Redenção”, “O preço de uma vida” (até hoje me lembro de Sergio Cardoso, o Dr Valcourt, chamando a Tula, de Nivea Maria). O final dos anos 60 trouxe um tipo de folhetim que, quando seguido o modelo hoje, acaba seduzindo o espectador de modo irreversível. Mesmo uma fantasiosa e criativa “Saramandaia”, ainda que subvertendo certos ícones conquistou o público, “O Bem amado”, “Tieta”, “Éramos Seis”, “ O Rebu”, “O grito”, tantos títulos me voltam à memória . Há um tema musical emblemático para mim: “What a wonderful world” cantado por Louis Armstrong na maravilhosa “Pigmalião 70” com Tonia Carrero e Sergio Cardoso encantando a todos.


Melão - Como é sua rotina quando está fora das telas e dos palcos? O que a Tuna curte fazer nos momentos de lazer?

Tuna - Como acho que até não fazer “nada” é fazer algo, mesmo dormindo se sonha... Lazer é para mim não ter rotina, não me obrigar a nada, mas procuro fazer o que não tenho tempo quando estou trabalhando, como ir ao teatro, ao cinema , nadar se o clima permitir, caminhar, mas essencialmente fazer o que tenho vontade como por exemplo, ver do começo ao fim um seriado. Ultimamente peguei o box da fantástica série “Mad Men”  que quero devorar até o último episódio que espero, irá ocorrer num futuro bem distante. Então alterno atividades fora de casa e outras dentro de casa, faço arrumações, termino de ler um livro começado e claro, atualizo minhas conversas e vejo os queridos amigos que não tenho tempo de ver quando estou trabalhando muito.

Melão - Diante de seu talento para escrita, nunca teve vontade de escrever para televisão?

Tuna - Mais uma vez agradeço seu generoso comentário, mas jamais me atreveria a fazer algo que não sei, é quase uma temeridade não ter experiência e escrever para o veículo. Acho uma leviandade. Confesso que nunca senti essa vontade, mesmo agora com sua pergunta, não me vem esse desejo. Prefiro contar uma ideia ou contar uma história verdadeira para alguém que a escreva. Já escrevi para jornal, escrevo em sites e publiquei três livros, mas compor diálogos, montar essa arquitetura sofisticada da escrita televisiva, é atividade para quem tem essa vocação. Tenho claro que a minha é a de dar vida que vocês, com tanto talento, criam para nós, atores.

Melão - Existe algum personagem ou tipo específico que você ainda gostaria de interpretar?

Tuna - Tenho fascínio, veneração pela tragédia grega, por ópera, pelas manifestações artísticas dos sentimentos mais profundos e os paradoxos humanos. Quando entrei na EAD (Escola de Arte Dramática) interpretei minha personagem predileta, a Cassandra, de “As Troianas”. Mais de vinte anos depois é um ícone para mim. Uma megera domada, uma vilã com suas vulnerabilidades são sempre interessantes. Personagens pouco óbvios me atraem, mas igualmente uma comédia rasgada, deliciosa, preciso mesmo é de personagens que gerem empatia, palpáveis, reais, sejam dramáticas ou cômicas, elas têm que ser universais, nas quais eu e o público nos reconheçamos. Eu de qualquer forma, me apaixono e defendo minhas personagens. Cada uma é no fundo, alguém que faria qualquer coisa pelo que acredita. Gosto de personagens que vivem situações-limite e  o que elas são capazes de fazer do que fizeram delas.
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Tuna, querida, não tenho palavras para agradecer por sua generosidade e dedicação ao conceder essa entrevista tão rica e repleta de carinho e intensidade e histórias deliciosas de toda uma vida. Desejo a você todo sucesso do mundo e que “os astros” possam nos reunir muitas outras vezes! 


sábado, 19 de março de 2011

Blogueiro convidado: Raphael Scire e o "gran finale" de "Ti Ti Ti"


Como vocês sabem, esta semana fui convidado pelo blog "Zappiando" para escrever sobre "Ti Ti Ti". Mas o melão não poderia ficar desguarnecido. Por isso, Raphael Scire foi novamente convocado para fazer um balanço final da novela. Abaixo, links para outros textos sobre "Ti Ti Ti". 



A novela das Marias

Por Raphael Scire



Cá estou eu de novo a falar de “Ti ti ti”, versão 2010/2011, que certamente já entrou para o meu rol das melhores novelas. Parece que foi ontem quando, em junho de 2009, entrevistei a autora e ela me disse que faria o remake de duas tramas de Cassiano Gabus Mendes.

A novela acabou e deixou um sentimento de orfandade em quem gosta de uma boa trama. A história de Maria Adelaide Amaral permitiu-se. Permitiu-se a ousadia e a vanguarda, ao mostrar tão abertamente não uma, mas duas relações homossexuais em pleno horário das sete. Permitiu-se a diversão, sem tornar exagerado o tom da comédia. Permitiu-se a nostalgia e o saudosismo, ao fazer inúmeras referências a outras tramas, fossem elas de Cassiano Gabus Mendes ou não.

Um elenco cuja maior característica foi a afinidade, uma direção que primou pela alegria e um texto, bem, o texto é de um primor único. Tudo casou bem, do figurino à cenografia. Marília Carneiro, que trabalho! Fazer moda numa novela que fala sobre moda não é coisa pouca e só mesmo quem entende do riscado poderia fazer um trabalho como este. Marília tirou de letra, como já era esperado. Eu me lembro da empolgação da figurinista quando a entrevistei, na festa de lançamento de “Dalva e Herivelto, uma canção de amor”, produção para a qual também assinou o figurino.

Não posso deixar de destacar o trabalho de Regina Braga. As cenas que tinham o texto mais sofisticado da trama eram com ela, justamente nos momentos em que a lucidez faltava à sua personagem. Impossível não se emocionar. Quando Cecília encontra sua irmã, Julia, o público ganhou de presente um show de atuação. Junto a Nicette Bruno, comoveu e deu credibilidade ao drama de Cecília.

Falar que Murilo Benício teve o melhor papel de sua carreira seria chover no molhado, a crítica e o público já se encarregaram de o fazer. Mas ele merece todo o reconhecimento por seu Ari/Victor Valentim. Alexandre Borges não fez feio, mas Benício levou a melhor. Ah, seu Tatá, conhecido também por Luiz Gustavo, que outrora dera vida a Ari/Victor voltou com tudo. E pediu para ficar.
  
Por último, permito-me aqui dizer que essa foi a novela das Marias. Primeiro a autora, Maria Adelaide Amaral, para cujo talento a gente tem mais é que fazer referência e agradecer ajoelhado e de pés juntos por esse brinde à teledramaturgia. Se antes eu já era fã dela, agora fiquei mais ainda. Depois por outras três Marias que arrasaram na interpretação. Malu Mader, que é Maria de Lourdes, fez uma Suzana que não conseguia esconder o riso nas cenas cômicas e por isso me conquistou – na verdade, Malu poderia fazer qualquer papel que me conquistaria da mesma maneira.  Claudia Raia, que vem a ser Maria Claudia, fez a diversão de todos e de tudo com sua tresloucada, politicamente incorreta e por isso apaixonante Jaqueline Maldonado. Minha vontade era colocar a Jaqueline num potinho e guardar para sempre. Embora Mayana Neiva tenha se destacado, para mim, a grande revelação da novela foi Maria Helena Chira, que fez de sua Camila uma patricinha no tom exato. E tem também a Maria de Médicis, diretora da equipe de Jorge Fernando, que não é Maria, mas é cheio de graça e foi essencial para esse sucesso.

Esse “Ti ti ti”, certamente, merece um remake do remake (ok, isso é hipérbole minha). Já deixa saudades. O último bloco foi a cereja do bolo no último capítulo. Claudia Raia, definitivamente, viveu um de seus melhores momentos na televisão. O discurso final de Jaqueline foi emocionante. Uma novela como essa só poderia acabar desse jeito: em clima 
de festa. Parabéns, Maria Adelaide, e obrigado por oito meses de alegria.
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Leia também:

Meu texto para o Zappiando: "Ti Ti Ti ontem e hoje" -> http://zappiando.wordpress.com/2011/03/18/ti-ti-ti-ontem-e-hoje/


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sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Melão Express – Rapidinhas, mas saborosas – Ed. 13


Ø  VETERANOS COM VIDA PRÓPRIA


Justiça seja feita. Um dos pontos altos de “Passione” é o ótimo desempenho do elenco veterano. Talento dos atores à parte, Sílvio de Abreu está de parabéns, não apenas pela escalação, mas por dar a eles papéis dignos e à altura de seus talentos. Não fazem apenas papéis de pais, tios e avós preocupados com os problemas dos personagens mais jovens como na maioria das novelas. Eles têm seus próprios dilemas, seus próprios dramas e suas tramas são as mais interessantes da novela. Que prazer ver o pentágono amoroso formado por Cleide Yáconis (destaque absoluto como a safadinha Dona Brígida), Leonardo Villar, Elias Gleiser, Aracy Balabanian e Emiliano Queiroz. Genial a ideia de um casal à beira dos 90 se divorciar e começar vida nova. E nem preciso dizer o quão fantásticos são esses atores, né? Que roteirista não sonha em escrever pra eles? Quando “Passione” terminar, eles, com certeza, serão lembrados entre os aspectos positivos da novela.

Ø  ZAPEANDO PELA TV FECHADA

ü  Sempre fui fã do “Saia Justa” e acompanhei suas diferentes formações e gostava muito da formação anterior que, pra mim, era a mais plural e a que mais fazia jus ao título do programa. As divergências entre Maitê Proença e Marcia Tiburi, por exemplo, era, pra mim, um aspecto positivo e ajudava a apimentar a atração. Tenho acompanhado a atual temporada e sinto que ainda não decolou. Não que Christine Fernandes e Teté Ribeiro não sejam boas, mas ainda estão sérias demais, muito travadas. Falta alguém descontraído como Betty Lago para dar mais leveza ao debate. A ideia das participações masculinas também é ótima, mas os homens, que poderiam dar essa graça que falta às novas saias, também estão levando a sério demais os debates. Talvez seja questão de entrosamento. Vamos aguardar.

ü  Tudo bem que era uma reprise de uma temporada exibida há algum tempo, mas nada justifica o Canal Liv interromper na metade a exibição da quarta temporada de “Project Runway” subitamente e sem justificativa alguma. Tremenda falta de respeito com os assinantes, pra não dizer, bagunça.

ü  Nunca fui aficcionado pelo programa de “Oprah Winfrey”. Sei lá, aquele fanatismo da plateia que aplaude o entrevistado e as tiradas da apresentadora a cada dez segundos sempre me irritaram um pouco. Mas qual não foi minha (agradável) surpresa, dia desses, zapeando de madrugada, quando parei na entrevista que J.K Rowling, criadora da série “Harry Potter” (confesso, também nunca li os livros ou assisti aos filmes) concedeu à apresentadora. Longe da histeria da plateia, na suíte de um hotel na Escócia, mais do que uma entrevista, foi um bate-papo franco, denso e, por que não dizer, emocionante. Oprah soube conduzir com a competência de sempre a entrevista e a entrevistada tinha uma bela história de vida pra contar. No final, o que se viu foi uma relação especular de duas mulheres muito parecidas, que vieram de baixo e que construíram fama e fortuna com seu talento incomum. E foi impossível não deixar que a emoção aflorasse por parte das duas. Era o último programa de Oprah e, em determinado momento, a entrevistada inverteu os papéis e perguntou a Oprah como ela se sentia em fechar um ciclo e Oprah respondeu com maior franqueza. A admiração mútua ficou evidente. Um bate-papo pra lá de memorável e inspirador.

Ø  AINDA SOBRE OS MELHORES, SEGUNDO O MELÃO



Meus queridos leitores citaram outros ótimos destaques que não fizeram parte de minha seleção e eu tenho que fazer justiça a eles. Como pude me esquecer dos excelentes “Dalva e Herivelto”, “Separação!?” e “A cura”? A minissérie foi pura emoção e nos brindou com uma das cenas mais emocionantes do ano: a morte de Dalva. Texto perfeito e interpretação magistral de Adriana Esteves. Já a série cômica trouxe de volta um humor semelhante ao de “Os Normais”, mas com uma linha dramática mais definida. Debora Bloch e Vladimir Brichta estiveram ótimos, mas os coadjuvantes não ficaram atrás, com destaque para Rita Elmor, Cristina Mutarelli e Kiko Mascarenhas. O texto de Fernanda Young e Alexandre Machado tem a capacidade de me fazer rir alto. Por fim, “A cura” que, apesar de não ser meu gênero preferido, nos apresentou um excelente e instigante thriller com identidade própria e gostinho de pão de queijo. Por isso, mesmo que tardiamente, incluo as três atrações no rol das preferidas do melão em 2010.

Ø  AINDA SOBRE “TI TI TI”

Sim, apesar da maioria esmagadora dos leitores concordarem com a eleição de “Ti Ti Ti” como a melhor novela do ano, a escolha não deixou de gerar alguma polêmica. Mas o mais curioso foi constatar que os detratores de “Ti Ti Ti” levam a novela mais a sério do que os admiradores, inclusive decretando a morte do gênero a partir da novela. Menos, meus queridos. Não acho que “Ti Ti Ti” tenha a pretensão de ser tão emblemática assim. Pelo contrário, o que a faz ser deliciosa é o fato de ser leve, descompromissada, uma grande farra e uma belíssima homenagem, não só à obra de Cassiano Gabus Mendes, como à teledramaturgia em geral, com suas inúmeras citações e intertextualidade a cada capítulo (e as referências não se limitam apenas aos 80’s como disseram alguns). O que mais me encanta na novela é que ela demonstra fôlego mesmo na reta final e está longe de ser uma novela escrita no automático. Os autores se preocupam em incrementar e surpreender a cada capítulo.  O que foi Stephanie (Sophie Charlotte) bancando a Esther Williams à beira da piscina e depois revivendo Marilyn Monroe em seu clássico número de “Os homens preferem as loiras” em que interpreta “Diamonds are a girl’s Best friend”? Tudo bem, grande parte do público pode não ter identificado as citações, mas e daí? Por isso vai se nivelar por baixo? Quem não conhece os filmes se divertiu do mesmo jeito, sem prejuízo para o entendimento da trama. É esse o caminho. Nunca subestimar o público. E o capítulo de sábado foi especial para telemaníacos... Que delícia a Elisângela interpretar no videokê seu antigo sucesso como cantora, “Pertinho de você”? Que homenagem bonita a ela...

E falando em homenagem, meu twitter e meu e-mail encheram de mensagens após a aparição de Divina Magda (Vera Zimmerman) em que Clotilde explica que Dom Lázaro (Lima Duarte em “Meu bem meu mal”), morreu entalado com um pedaço de melão? Mesmo muuuito que indiretamente, esse singelo melão que vos fala não pode deixar de sentir lisonjeado e homenageado, embora saiba que todas as honras e homenagens (como o próprio título desse blog) devem ser dadas inteiramente a Cassiano Gabus Mendes. De qualquer forma, adorei, Adelaide, obrigado! Confesso que esse melão ficou uma melancia, de tão enrubescido...hahaha!

Ø  PORTANTO, MEUS QUERIDOS... O MELÃO É POP!


Impossível não lembrar de Tancinha (Claudia Raia), em “Sassaricando” exibindo sensualmente a fruta na feira ao gritos de “Me olha os melão!!!”. Ainda que seja de Sílvio de Abreu, fica a dica para a equipe da novela para mais uma brincadeirinha metalinguística.


Por fim, agradeço ao meu queridíssimo amigo-irmão, Ivan Gomes, pela singela e belíssima homenagem logo no início do ano. Sim, querido, você prefere melão e o melão prefere você! Essa foto tem mais valor pra mim do que você pode imaginar. Um presentão!


Ø  ENQUETE NO AR
E aproveitem para votar na próxima enquete. Quais as novelas que você aguarda com mais ansiedade em 2011? Beijos, abraços e até a próxima!
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sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Em 2010, o melão preferiu...



Ø  TI TI TI
Disparada a melhor novela do ano. Maria Adelaide Amaral e equipe estão de parabéns por trazer ao horário das sete um novo fôlego que há tempos não se via. A autora optou por não escrever uma versão literal do megassucesso de 1985. Foi esperta ao mesclar algumas tramas de “Plumas e Paetês” e, com isso, acrescentar elementos de folhetim que faltava à versão oitentista de “Ti Ti Ti”. O resultado é uma trama altamente original, movimentada, divertida e cheia de personalidade, mas que mantém o clima das melhores novelas do Mestre Cassiano Gabus Mendes. “Ti Ti Ti” faz uma grande e comovente homenagem à teledramaturgia brasileira, ao citar e revisitar personagens, não só das tramas de Cassiano, como de outras novelas de sucesso como “Fera Radical” e “O clone”. A direção sempre solar e colorida de Jorge Fernando casa perfeitamente com o texto sempre esperto. Elenco, direção de arte, figurino, enfim, tudo em sintonia. O que mais surpreende em “Ti-Ti-Ti” é a novela está longe de ser escrita no piloto automático. Mostra fôlego para surpreender e divertir a cada capítulo, nos brindando com um humor popular e refinado ao mesmo tempo, já que as citações não se limitam apenas às novelas, mas também ao cinema e à cultura pop em geral, e quem não as absorve, se diverte do mesmo jeito. Ousadia na medida certa. Sem dúvida, o maior acerto do ano!

Ø  CLAUDIA RAIA


Como disse meu amigo Eduardo Vieira, Jackeline é o “Mario Fofoca” da novela. Um verdadeiro show a cada capítulo. Claudia Raia está perfeita, caricata no bom sentido, mas também extremamente humana. Jackeline pode parecer uma doida de pedra, mas também sofre, chora, se emociona como qualquer um de nós. Impossível não torcer por ela. La Raia, assim como no drama de “A favorita”, arrasa nessa novela também, com uma interpretação visceral, sem medo de cair no ridículo e no exagero. E o texto de Jackeline? Foram tantas tiradas geniais e a atriz consegue aproveitar cada uma delas. Sua fase como Irmã Desgosto, no melhor estilo “Maus hábitos” de Almodóvar, está simplesmente genial e hilariante. Dentre os tantos motivos para se assistir à novela, Claudia Raia, sem dúvida, é o maior deles. Disparada a melhor atriz do ano!


Ø  ANDRÉ ARTECHE

Quando assisti ao ótimo filme “Houve uma vez dois verões”, de Jorge Furtado, conheci a interpretação de André Arteche e percebi que se tratava de um ator diferente, de uma sensibilidade especial. Seus papéis na TV, por menores que fossem, foram confirmando minha impressão. Agora em “Ti Ti Ti”, na pele de Julinho, André está excelente, arrebatador e arrebatado pela ótima abordagem de Maria Adelaide Amaral sobre um relacionamento gay. O romance de Julinho e Osmar (Gustavo Leão) durou pouquíssimos capítulos, mas fez tanto sucesso que o casal é forte candidato a melhor do ano. Tudo ali funcionou: a química dos atores, o texto delicado, a canção-tema “True Colors”... E a trama continua viva até hoje. André continua fazendo uma ótima dobradinha com a sempre competente Giulia Gam. A relação maternal de Bruna com Julinho é comovente e muito bem urdida. André Arteche ganhou um excelente papel e está aproveitando da melhor maneira possível e já está a léguas do estereótipo gay bonzinho melhor amigo da mocinha. O melão aplaude de pé!


Ø  IRENE RAVACHE

A personagem “perua emergente” está longe de ser novidade nas novelas. Menos novidade ainda é o talento de Irene Ravache, que ainda consegue emprestar muito humor e trazer novos elementos ao tipo já manjado em nossa TV. Ravache sempre é garantia de excelente interpretação e oferece a mesma naturalidade, seja em tipos sofridos como a Dona Lola de “Éramos Seis”, ou como a tresloucada Clô de “Passione”. A atriz protagonizou as cenas mais hilárias da novela, como a do jantar oferecido a ela por Bete Gouveia (Fernanda Montenegro), no qual quase leva Dona Brígida (Cleyde Yáconis) à loucura com sua falta de etiqueta. Outro momento hilário foi quando, ao pedir churrasquinho de gato, solicitou ao entregador que não esquecesse a farofa. Sílvio de Abreu é um mestre do humor e Irene, habituadíssima ao texto do autor, faz misérias em cena. O melão elege La Ravache como o grande destaque de “Passione”.


Ø  A VIDA ALHEIA

Miguel Falabella se afastou um pouco do humor escrachado e da estética kitch de suas divertidíssimas novelas, mas manteve a ironia, o deboche e o sarcasmo nessa ótima série que critica o mundo das revistas de celebridades, dispostas a tudo para conseguir um furo, ignorando qualquer senso de ética e respeito. A comédia dramática de humor rascante proporcionou a atrizes como Claudia Jimenez e Marilia Pêra brilharem intensamente e deu a Daniele Winits a oportunidade de defender um papel diferente dos que costuma interpretar. Entre o elenco masculino, destaque total para Carlos Gregório. Uma pena que não tenha uma nova temporada, pois história e conteúdo pra isso não faltam. 

Ø  AS CARIOCAS


Já na abertura, dava pra notar que o seriado seria uma delícia. Um desfile de belas atrizes e uma história pra contar a cada semana referente a um bairro do Rio de Janeiro. Com jeito leve, gaiato, despretensioso e safadinho... mais Rio de Janeiro impossível. Mais uma ótima parceria de Euclides Marinho e Daniel Filho, que voltou à TV em grande estilo. E que delícia também assistirmos a um programa repleto de locações externas. Gostinho de nostalgia. Uma festa!

Ø  CLANDESTINOS – O SONHO COMEÇOU


Outro gol de placa este ano. Impossível não se envolver e não se comover com a luta de jovens aspirantes ao palcos e à fama em busca de um lugar ao sol. A feliz empreitada teatral de João Falcão ganhou uma ótima adaptação e revelou talentos promissores como Adelaide de Castro, Fabio Enriquez e Elisa Pinheiro. Texto sempre afiado, muito lirismo e muita emoção. Claro que o DVD é super aguardado, né?

Ø  RIBEIRÃO DO TEMPO


Marcílio Moraes não é um autor que se acomoda em uma determinada temática. Sua primeira novela na Record, “Essas Mulheres”, que bebia da literatura de José de Alencar, era um primor de tão boa. Depois, Marcílio deu um giro de 180 graus e levou a realidade dos morros cariocas de maneira nunca antes vista na Tv com “Vidas Opostas” e a série “A lei e o crime”. Agora, com “Ribeirão do Tempo”, Marcilio inaugura na Record aquele estilo político-regionalista, que lembra as antigas tramas de Dias Gomes e Aguinaldo Silva, e o faz com bastante acerto. Crítica social, irreverência, deboche e um texto sempre inspirado.


Ø  UMA ROSA COM AMOR



A novela, sem dúvida, representou um “upgrade” nas produções do SBT, que buscou um bom elenco que contou com nomes de peso como Betty Faria, Carla Marins e Jussara Freire. A singeleza do texto de Vicente Sesso, atualizado por Tiago Santiago, nos trouxe uma novela romântica, divertida, com um quê de nostálgica e muito gostosa de se assistir. Não emplacou os índices de audiência esperados pela emissora, mas provou que é possível fazer dramaturgia sem precisar recorrer o tempo todo aos melodramas mexicanos. Um bom começo.

Ø  CANAL VIVA


Viva! Mil vezes Viva! O sonho de todo telemaníaco começou a se concretizar com a criação do canal, que dedica grande parte de sua grade à reprises de antigos sucessos da teledramaturgia global. Quando veio “Por amor” e “Quatro por Quatro”, imaginamos grandes possibilidades, mas quando foi anunciado o retorno de “Vale Tudo” a festa foi total. E 2011 já promete com a volta da “Tv Pirata”. E ainda há as minisséries, os seriados... tudo o que podemos desejar é vida longuíssima ao Viva e força nos gravadores!


Ø  BOX ROQUE SANTEIRO

Outro presentão para os telemaníacos que abre inúmeras possibilidades. Para quem ainda não adquiriu, é imperdível. A saga do santo que não morreu, da viúva que foi sem nunca ter sido e do poderoso coronel que adora bancar o cachorrinho na intimidade são garantia de diversão e de excelentes atuações. O universo suigeneris criado por Dias Gomes, escrito por ele e por Aguinaldo Silva, ainda é atual ao denunciar a corrupção e as injustiças de uma metonímica Asa Branca e sua galeria de personagens inesquecíveis. Para muitos não houve novela como “Roque Santeiro”. Esperamos que seja apenas o primeiro lançamento de muitos outros.


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Claro que listas são sempre muito pessoais e muita coisa boa ficou de fora. Mas o melão quer saber: o que vocês preferiram em 2010?


O que eu preferi em 2009? Vamos relembrar? http://euprefiromelao.blogspot.com/2009/12/em-2009-eu-preferi.html

Enfim, queria dizer que 2010 foi, particularmente, um ano de muita batalha e, principalmente de muitas conquistas para o melão e para este blogueiro que vos fala. Só tenho a agradecer a todos por sempre prestigiarem o espaço e conto com vocês para 2011. Que seja diamante verdadeiro para todos nós. Até lá!

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