sábado, 25 de junho de 2011

Os astros invadem o melão!!!





A expectativa para a estreia de “O astro” é cada vez maior! Aqui no melão então, nem se fala! Por isso o meu talentosíssimo amigo, designer oficial do blog, FELIPE RIBEIRO, me presenteou com o novo banner do melão: Francisco Cuoco, o Herculano Quintanilha da primeira versão da novela de Janete Clair, e Rodrigo Lombardi, o novo astro! Transbordando de orgulho, apresento o novo banner.

Nunca é demais agradecer ao Felipe por tantos banners maravilhosos criados exclusivamente para o blog. O rapaz também é responsável pelo atual layout do melão, que promete novidades em breve. Obrigado, Felipe, por sua gentileza, disponibilidade e talento sempre à disposição deste humilde melão!

A PRIMEIRA VEZ A GENTE NUNCA ESQUECE

Tarcísio Lara Puiati e eu (colaboradores), Alcides Nogueira e Geraldo Carneiro (autores) e Roberto Talma (diretor geral)


E já que estamos nesse astral maravilhoso, preciso dizer que o dia 21 de junho de 2011 talvez tenha sido um dos mais felizes da minha vida. Pela primeira vez, participei de uma entrevista coletiva como roteirista de tevê. Participar é modo de falar, pois entrei mudo e saí calado, lógico (risos), mas só em estar na presença dos autores Alcides Nogueira, o Tide, e Geraldo Carneiro; de meu querido Tarcísio Lara Puiati, o Tatá, também colaborador; dos diretores Noa Bressane, Fred Mayrink e Alan Fitterman; do diretor geral Mauro Mendonça Filho; e do diretor de núcleo, o lendário Roberto Talma, é algo que nunca vou esquecer. O que dizer da emoção que senti quando meu querido Tide apresentou a mim e a Tarcísio a todos, rasgando altos elogios e palavras pra lá de carinhosas. Ser aplaudido com entusiasmo por aquele elenco maravilhoso foi uma das maiores emoções de minha vida. Se pudesse congelaria esse momento para sempre.



Mas vamos ao que interessa: a coletiva em si. Pude constatar com meus próprios olhos a empolgação de todos para com “O astro”. A alegria de todos os envolvidos era evidente. Conversamos com grande parte do elenco, todos simpaticíssimos e demonstrando alegria com seus personagens.


A queridíssima Tuna Dwek fez as honras iniciais, nos apresentando para alguns colegas. Sempre afetuosa e elétrica. Um furacão em forma de mulher. Esfuziante nos bastidores e concentradíssima em cena. Daquelas atrizes que sabem aproveitar cada detalhe, cada gesto.


Ellen Rocche, além da evidente beleza, é uma pessoa absolutamente encantadora e cativante. Nos mostrou em seu celular um ensaio de um número de mágica em que sua Valéria contracena com Herculano pra lá de surpreendente. De cair o queixo. Mas as aventuras de Valéria não se resumirão aos espetáculos da Boate Kosmos. A personagem promete muita coisa boa!


Simone Soares, uma fofa! Está dando vida (e que vida!) à Laura, irmã mais velha de Lili (Alinne Moraes) e submissa esposa do cafajeste Neco (Humberto Martins). Outra personagem deliciosa, que oferece mil e uma possibilidades de crescimento e promete revelar o grande talento dessa moça.


Rosamaria Murtinho, felicíssima em dar vida à Tia Magda. Segundo a atriz, finalmente saiu de seu “monotema” de bela mulher madura que se envolve com garotão. A solitária e misteriosa Magda promete cenas surpreendentes, que só podiam ser encenadas por uma atriz do calibre de Rosamaria, que foi só carinhos para conosco.


Regina Duarte dispensa qualquer apresentação. Estar diante daquela que já é tão íntima de todos os brasileiros foi a materialização de um sonho. Igualmente emocionante foi ouvi-la falar do processo de composição de sua Clô. Em poucos minutos, Regina nos deu altas dicas dos caminhos de sua personagem, que incorporou durante alguns instantes de maneira mágica e comovente. Tivemos a nítida confirmação do porquê de sua grandeza. Além de uma craque da interpretação, é de uma sensibilidade genial. Ninguém se torna Regina Duarte à toa.

Penha Fashion, salão de beleza onde tudo acontece
Como se não bastasse esses momentos únicos, tivemos mais confirmações da excelência do trabalho realizado quando Tatá e eu permanecemos para assistir à gravação de algumas cenas. Primeiro, no estúdio, no escritório de Amanda Assunção (Carolina Ferraz), que contracenou com Guilhermina Guinle (Beatriz) e Tuna Dwek (Nilza), dirigidas por Fred Mayrink. Depois, fomos dar um pulinho até à Penha cenográfica para acompanhar algumas cenas no Penha Fashion, salão de Neco (Humberto Martins), palco de muitos conflitos da série. Primeiro, uma cena ótima entre Cleiton (Frank Menezes) e Lili (Alinne Moraes). Para nossa surpresa, era uma cena escrita por Tatá, o que fez aumentar nossa empolgação. E Frank deu um show, indo da comédia ao drama, de maneira comovente. Anotem esse nome: vai dar o que falar.

Tatá e eu, com o adorável Frank Menezes

Incansável, a linda e talentosa Alinne ainda protagonizou um barraco daqueles com Neco (Humberto Martins). Os dois atores esbanjaram vigor e entrosamento. Rodrigo Mendonça e Antonio Calloni também participaram das gravações, dirigidas por Alan Fitterman (um gentleman) com a mesma competência.

Fim da jornada, Tatá e eu voltamos à realidade para escrever novas cenas

Enfim, um dia de sonho, do qual nunca mais vou esquecer. O sucesso é sempre algo imprevisível e imponderável, mas uma coisa posso garantir: “O astro” está sendo preparado com todo carinho e esmero e sua produção faz jus totalmente à enorme expectativa que vem causando. Estreia, dia 12 de julho, após “Insensato Coração”.

Fiquemos com o clipe de apresentação, que deixou encantados todos os presentes. Que Nossa Senhora das Oito nos abençoe e nos proteja!



sábado, 18 de junho de 2011

Entrevista especial - TUNA DWEK: “A arte nos captura a despeito de nós mesmos”


Tuna Dwek, revelada por Fernando Torquato.

Mais uma vez, anuncio com imensa felicidade um “post” de luxo, pois a nova entrevistada do melão é classe A em todos os sentidos. Ela está em todas: desde embalagens de margarina a eventos internacionais. Ela é multi-talentosa: atriz, intérprete, tradutora, jornalista, escritora, biógrafa, enfim... não há limites para os domínios de Tuna Dwek, com quem estou tendo o imenso prazer de trabalhar em minha estreia como roteirista de televisão. Tuna nos fala um pouco sobre sua personagem, a enigmática secretária Nilza, de “O astro” e logo após nos concede uma rica e deliciosa viagem por sua vida pessoal e profissional, que contou com a participação especialíssima de Alcides Nogueira, que contribuiu com uma pergunta. Uma trajetória emocionante e inspiradora que os leitores do melão vão ter o prazer de acompanhar. Vamos deixar que a entrevista fale por si e, parafraseando Caetano, nos revele “a voz de uma pessoa vitoriosa”. Com vocês, Tuna Dwek, de corpo, alma e coração!

Melão - Primeiramente, não posso deixar de perguntar sobre “O astro”.  Quais são suas expectativas para o remake? Fale um pouco sobre a Nilza, sua personagem.



Tuna - É tanta minha empolgação com “O Astro” que qualquer objetividade me parece impossível. Evito a palavra “expectativa” na minha profissão, mas baseada em algo concreto como o alto nível de qualidade dos capítulos que tenho recebido, ouso intuir tanto uma enorme receptividade por parte do público como sua recíproca  satisfação pessoal, especialmente porque a série mantém a essência da grande Janete Clair, sua dramaturgia, seu ritmo, na conjunção  de uma trama contemporânea com elementos cativantes de drama, humor, amor, tragédias, alegrias e tristezas, golpes, falcatruas, desavenças e reencontros e muita paixão, assim como é na vida cotidiana, com um texto sólido e instigante do ponto de vista dramatúrgico esculpido com a maestria de Alcides Nogueira e Geraldo Carneiro (e seus colaboradores Tarcisio Lara Puiati e Vitor de Oliveira). Com direção de Allan Fiterman, Fred Mayrink, Noa Bressane, direção geral de Roberto Talma e Mauro Mendonça Filho e uma equipe talentosa com quem já tive a sorte de trabalhar, você pode imaginar o estado emocional em que me encontro.


Quanto a Nilza, a cada capítulo, descubro uma faceta. Não se trata de uma personagem monolítica, pelo contrário, é uma secretária dedicada, cheia de energia e vivacidade que em vários momentos apresenta uma certa ambiguidade, um olhar furtivo, algo não manifesto. Ela permanece um mistério para mim porque vejo que talvez ela não seja o que parece, mas não saberia detectar por quê . Então vou embarcando nela à medida do que vou lendo nas cenas e sou um tipo de atriz que se entrega à direção, não cristalizo nada, a Nilza é uma obra aberta e, provavelmente, essa “perfeição” toda também tenha seus mistérios. Sua relação com Amanda é sólida e já nas leituras com Carolina Ferraz estabelecemos uma cumplicidade deliciosa. Gosto de personagens palpáveis, reais, com seus paradoxos, sua humanidade e a riqueza que a aparência nem sempre traduz. Me apaixono sempre por minhas personagens, visto a camisa e defendo até a última cena.

Melão - Quantos idiomas você fala? De onde vem essa facilidade em aprender línguas diferentes? 

Tuna - Falo cinco idiomas e meio. No programa do Jô, ele perguntou: “e meio? Tem alguma língua que você fala só três vezes por semana?” Foi hilário, mas expliquei que estou aprendendo a falar árabe, mas são anos e na realidade, embora de família síria só comecei a me interessar pela língua depois de adulta. Consigo me comunicar na Síria, no Líbano, no Egito ou na Jordânia, mas ainda falta muito para afirmar que falo. Seria pretensão. Além disso, os judeus sírios têm expressões bastante características em árabe. Essa facilidade , como você diz, venha talvez de alguns fatores:

- me alfabetizei em francês, em São Paulo, portanto desde criança alternava português e francês, como ia muito ao cinema (era meu refúgio por assim dizer, na adolescência) o inglês foi se incrustando nos meus ouvidos.
- talvez tenha um certo ouvido musical como se diz. Registro sons, cadências, inflexões e me interesso profundamente pela comunicação com os outros.
- a Necessidade faz a Arte. Tive que viver um tempo fora do Brasil e não tive escolha senão aprender a língua do país, como o italiano, por exemplo e por não saber se ou quando voltaria para cá, tive que me aprimorar. Além disso, gosto de treinar sotaques, acho divertido passear por eles, fazer variações entre eles e vários personagens que interpretei me deram essa possibilidade. 

Tuna foi intérprete da atriz Catherine Deveuve em evento recente.
Uma vez que trabalho como intérprete também (de vários atores, diretores de teatro, cinema, música) continua o treino poliglota, sou observadora e  gosto de me esforçar para me comunicar na língua dos outros em vez de vê-lo se acabar para falar português. O fato de falar idiomas, inclusive, me abriu vários caminhos como atriz. Não é nada fácil conservar o vocabulário em outras línguas, quantas vezes nos perguntamos se é assim mesmo que se fala numa ou noutra língua? Especialmente quando as sonoridades são similares.

Melão - Quando você percebeu que gostaria de se tornar atriz e qual foi o marco inicial de sua de sua carreira?

Tuna - A coisa menos clara que tenho é se houve algum momento especifico em que eu percebi que gostaria de me tornar atriz. Foi algo natural na adolescência, mas só se solidificou depois de ter tido uma infinidade de experiências humanas e profissionais. Mas acredito em vocação, por mais que fujamos dela e não saibamos detectar o que é realmente essa força que nos impulsiona quase que à revelia, em direção à Arte. Ela nos captura a despeito nós mesmos. Há, acredito, indícios, mesmo se eles se alojam no inconsciente muitas vezes. E fatos que despertam essa vocação. Muitas vezes sentimos uma falta que nada preenche e isso é o estopim...

Desde pequena, na escola, declamava os clássicos e os poetas franceses na aula de Literatura Francêsa e os brasileiros e lusitanos nas aula de Literatura Portuguesa, num  palquinho na classe, na frente de todos, era de se desmaiar de medo porque as professoras eram rígidas, não se podia errar e a classe era a plateia. Era também muito prazeroso e permanece presente em mim aquele coração pulsando, a adrenalina excitante e mal sabia eu que teria que fazer isso tantas e tantas vezes nos últimos 25 anos! Sempre adorei ir ao teatro e não perdia na TV um Teleteatro que fosse, com Cacilda Becker (com Homero Kossac, Xandó Batista e Barbara Fazio).Pequena , meu  pai nos levava a mim e meu irmão ao teatro aos domingos de manhã, acho que o bichinho estava incubando dentro de mim. Dos 17 aos 19 anos fiz Teatro Amador, parei por muitos anos, ao morar fora não exerci a atividade e só retomei nos anos 80, entrando na EAD (Escola de Arte Dramática) onde pude estudar, ler, encenar, desde clássicos gregos a autores contemporâneos. Estreei com o espetáculo “Divinas Palavras”, de Ramon Del Valle -Inclán, com direção de Iacov Hillel, fazendo uma substituição, com Laura Cardoso, Rodrigo Santiago, Imara Reis, Maria do Carmo Soares e Paulo Gorgulho. Foi um batismo inesquecível e um aprendizado que eu levaria para todos os segmentos da atividade artística. Perseverar é muito difícil porque uma vez no universo profissional, manter-se é atividade hercúlea, mas ser ator é tão irreversível e vital quanto respirar para viver.

Melão - Entre os seus múltiplos talentos, está o de biógrafa. Qual é o desafio em contar a história de pessoas cujas experiências de vida são tão ricas, como Alcides Nogueira, Maria Adelaide Amaral e Denise Del Vecchio?

Tuna - Obrigada pelo comentário generoso. Desafio é a palavra certa. Antes de mais nada, se eu não tiver uma relação muito próxima e de imenso afeto, admiração e respeito pelo biografado, não sai uma linha de mim. De tão ricas que são as vidas dessas três queridas pessoas, eu precisava me aproximar com a máxima delicadeza do universo interior de cada um e tecer um bordado quase em que nada ficasse de fora, fatos importantes assim como detalhes que fazem a diferença e que traduzisse quem é aquela pessoa, que história ela tinha para contar dentro de suas características únicas. O grande desafio é escrever na primeira pessoa com a voz do biografado, dar meu tratamento literário e por vezes poético ao fluxo caótico da memória manifesta. Penetrar na alma de cada um sem invadir as emoções que isso traz. Foram processos estupendos posso dizer sem reservas nem pudor. Foram meses de trabalho e convivência para o livro, mas anos de convivência com os amigos que são. Tive a honra e a alegria de ouvir que cada um se reconhecia em meus livros, salvo o ajuste de um ou outro fato, uma ou outra data, meus textos foram impressos tal qual os compus, a descrição que faço no prefácio de cada um deles e da minha relação específica com cada um é um depoimento indelével de como na se pode escrever sobre alguém ou dar voz a esse alguém com verdade se não se tiver convivido, compreendido, abraçado essa pessoa tal como ela é, em sua plenitude, idiossincrasias, vulnerabilidades, paixões, sua história, respeitando o tempo de cada um, a disponibilidade. Muitas vezes, era muita emoção, era mexer em muita coisa, precisava decantar, dar um tempo, metabolizar para retomar o processo.

Nos três vejo uma coerência de atitudes que permanece até hoje. Os três lutando sempre pela liberdade de expressão, pela especificidade de cada um, os três sempre se posicionaram contra a Ditadura Militar, os três tem em sua Arte uma posição humana e humanista que obstáculo algum foi capaz de esmorecer. Havia momentos de pânico em que eu achava que não conseguiria mais escrever, tudo parecia tão grande, mas eu tinha em mim a solidez das relações construídas ao fio dos anos com essas pessoas tão fortes em minha vida.

Tide e Tuna: biografado e biógrafa.
Foram três processos muito ricos. No caso do Alcides, no reuníamos na casa dele, muitas vezes falávamos de madrugada ao telefone até, o silencio da madrugada em volta estimulava a memória de certa forma, mexer nas fotos de sua infância e trajetória tinha um efeito muito forte emocionalmente para ele, e dávamos intervalos sem prazo até retomarmos as conversas. Porque eram conversas no sofá e não entrevistas com perguntas formais, eram viagens que exploravam a memória e o afeto. Como sempre digo, abordava sua alma com as pinças da delicadeza e ele não se furtou a nada.

Com Maria Adelaide, foi uma vivencia cotidiana, rodeada pela natureza maravilhosa, em sua casa de campo. Fomos para lá no Ano Novo, festejando com amigos e lá permaneci com ela, após caminhadas matinais com a cadela Nina, que eu adorava e  faleceu tempos depois, mergulhávamos em sua história com direito a muita emoção, lágrimas e risos porque sem essa entrega a gente acaba indo pelo caminho mais fácil, palatável, e a Adelaide é uma pessoa exposta, diz o que sente, o que acha, não calcifica suas ideias, consegue administrar vários pensamentos ao mesmo tempo e se emociona cotidianamente como boa canceriana, levanta  e agradece a Deus por mais um dia de saúde e de vida. Tendo viajado, me deixou em sua casa com seu material todo, recolhido em nossas conversas e escrevi o livro em seu computador, no mesmo em que ela cria os personagens que interpretamos. Foi quase místico.

Com Denise, que achava que sua vida não daria um livro, eu poderia escrever vários volumes. Sua trajetória pessoal - e ideológica -se mescla com a história do teatro das últimas décadas. Nos reuníamos em  minha casa ou na dela, e até que ela encontrasse as fotos que ilustram o livro foram meses em que aproveitamos para explorar ao máximo sua vida e  seu pensamento. Como ambas tínhamos nossas atividades profissionais, cada encontro tinha que ser otimizado e, muitas vezes, tínhamos que parar e retomar outro dia porque de certa forma é tudo quase que uma sessão de psicanálise, um desnudamento sem volta em que o biografado precisa sentir que está em terreno seguro, que é uma zona de confiança e despudor.

Tuna e Denise del Vecchio
Meus três livros são divisores de águas, são passos irreversíveis e documentos que traduzem os biografados sim, mas através da escolha das minhas palavras traduz a mim também. Levei um tempo para me dar conta, mas um dia o Alcides disse: “ nós vivemos, mas você escreveu”. A resposta que tive dos meus biografados depois de prontos os livros é algo que vou guardar dentro de mim como um tesouro, ouvi coisas preciosas e generosas que continuam pautando minha atitude perante a vida.

Alcides Nogueira pergunta: "Você trafega, com uma desenvoltura impressionante, pelo teatro, televisão e cinema. Em qual desses veículos você se sente mais inteira, como atriz?”.

Tuna - Querido, sempre generoso em seus comentários. Obrigada pelo que você diz. Se eu escolher um veículo serei injusto com o outro. Vou tentar destrinchar.
Meu amor por representar apesar de todo o pânico que antecede entrar em cena, é tamanho que onde eu estiver atuando estarei inteira. Amo ser outra pessoa, dar voz corpo alma a uma personagem, compor outro ser. Preciso da evasão, preciso ser outra e em outra realidade até para não enlouquecer de lucidez frente à realidade. Não é algo terapêutico, que fique claro, é o que eu sou, alguém que pode ser outro. Que pode viver essa esquizofrenia por assim dizer e ser eu mesma. Voltar para casa depois de dar voz a alguém que existiu no palco por algumas horas e se comunicou com os outros. Seja no palco, no cinema, na televisão. O teatro é algo indescritivelmente poderoso, a respiração da plateia que reage quase que sem respirar por momentos, explodindo de rir ou de chorar, a catarse de viver coletivamente algo que une o individual com o universal, a resposta imediata, o momento que não volta mais, superar o medo de errar, de esquecer texto, de dar branco e ao mesmo tempo a felicidade de estar ali, com seres vivos no ato que se concretiza naquele momento, isso é algo que o teatro dá e não tira.

Nos três, gosto de ser dirigida, de ver a escolha que o diretor irá fazer de um repertório infinito que traz um ator, em gestos, inflexões, resultados de uma intenção clara, mas a manifestação dessa intenção ou de uma emoção, formalmente, é o diretor que irá selecionar, registrar, reter.

No cinema e na televisão, o rigor na composição de uma personagem é o mesmo para mim, trabalhar em equipe, a cumplicidade que se estabelece apesar dos aspectos técnicos, as falas novas a cada dia, o desenrolar de uma história que pode ser gravada sem ordem cronológica são desafios que me instigam e mais uma vez, é atuar que me fascina, que faz com que eu me sinta inteira. A plenitude se dá de forma diferente e em momentos diferentes. No cinema e na Tv você vai ver o resultado depois, e não sabe o que seu trabalho estará preservado na edição, em função de um ritmo ou de outros fatores que independem da própria obra, no teatro é o tal “aqui e agora” e não dá para corrigir nada, é aquilo que é, que foi, e nos três casos, permanece em cada um que faz e que assiste a semente de uma reflexão, de uma transformação, de algo que a nunca mais ninguém vai ser, porque interpretar provoca isso, não sermos mais os mesmos a cada instante. Amo os três veículos, as pessoas que se entregam para contar uma história, ir além da imagem através da imagem.

Melão - Na sua carreira em TV, um de seus trabalhos mais marcantes foi a Marinete Prado de “Um só coração”. Que lembranças tem dessa personagem e que tal a experiência em ajudar a contar para o público, parte de uma história real da própria cidade em que vive?

Tuna - Com relação à Marinete Prado, tenho uma enciclopédia de coisas boas para contar. A começar pelo teste. Por ter existido e ser francesa e falar português com sotaque, havia o desafio não só da fidelidade a quem tinha sido como tornar inteligível o francês mesclado com o português. O teste tinha um texto sofisticado, como tudo o que Maria Adelaide Amaral e Alcides Nogueira com seus colaboradores, escrevem e como foi toda a minissérie, uma das mais informativas e refinadas de todas as da Tv Globo. Haviam testado muitas atrizes já e eu cheguei aos 45 do segundo tempo, só faltava a Marinete para fechar o elenco. Estudei bastante para o teste porque queria achar essa verdade e se a gente não faz a personagem o sotaque não vem fica falso, e como eu disse, é preciso saber dosar quando falar em Francês e quando em português com sotaque. Passei no teste, pulava de alegria feito uma cabrita, assumo, e começou uma experiência riquíssima. No elenco havia muitos atores do Teatro Paulista, amigos antigos, outros que não conhecia, a união entre os atores de São Paulo e do Rio foi sensacional. Digo isso porque iríamos contar uma história basicamente paulista, o que não fez a menor diferença porque as pessoas se prepararam e a convivência era muito prazerosa e lúdica. Íamos gravar em externa na fazenda de Yolanda Penteado, as gravações no estúdio naquela sofisticação da direção de Arte e contando uma história de pessoas que viveram tudo aquilo e um período extremamente fértil no país e em São Paulo, do ponto de vista da arte, da cultura, do pensamento, da política, sem falar da emoção de falar sobre a cidade onde cresci e vivo.
Recriamos entre nós atores a atmosfera que os personagens na época viveram. A amizade, a cumplicidade, sem jamais as brigas dos mesmos, claro. Ana Paula Arósio, Eliane Giardini, Betty Goffman, Selma Egrei, Pedro Paulo Rangel, Jose Rubens Chachá, Pascoal da Conceição, Claudio Fontana, Antonio Calloni, Erik Marmo, Fernanda Paes Leme e tantos outros, um time inesquecível, mas preciso destacar Tato Gabus, que fazia meu marido Paulo Prado. A generosidade desse ator e amigo, que me ensinou passos preciosos no fazer televisivo.
Para se ter uma ideia de nossa convivência, nos reuníamos, parte do elenco, no quarto de algum ator, no hotel para assistirmos juntos aos capítulos da minissérie. Era mesmo “Um só coração”!
Como a minissérie cobria o período entre os anos 20 e os anos 50, e o comprimento do meu cabelo chegava até o meio das costas, tive que fazer um corte radical, Chanel curtíssimo com franja. A partir de Marinete, engatei vários trabalhos. Participei de “JK”, “ Ciranda de Pedra”, “A favorita”, “Tempos Modernos”, “ Ti Ti Ti “, e agora “O Astro”.

Melão - De que forma você construiu a personagem Olímpia, uma dona de bordel em “JK”?
Tuna - Voce me pergunta sobre uma das personagens mais prazerosas, ricas de histórias e de nuances que interpretei. Tenho paixão por esse trabalho, de complexa composição interna e externa. Além de ter uns figurinos e maquiagem como poucas vezes eu vi, crédito seja dado a Emilia Duncan e Marlene Moura, que pesquisam incansavelmente a fidelidade ao real.

Para a sua construção, inicialmente contextualizei a minissérie e a personagem na época em que ela existiu, o que acontecia historicamente, mas também como era a mentalidade da época tanto nas elites como nos outros segmentos da sociedade brasileira. Especialmente no que diz respeito à sexualidade e a uma certa hipocrisia social que até hoje impera de modo globalizado, ainda que se observe uma  imensa evolução nos costumes e  nos discursos, ainda há muito para caminhar em  direção à satisfação dos desejos humanos. Reli “O livro das Cortesãs”, de Susan Griffin, um precioso documento.

Olímpia Garcia seria retratada durante três décadas praticamente. Por ser uma personagem real, que existiu e da qual pode-se contar muitas histórias que ocorreram, eu não poderia “ inventar” uma Olímpia, mas teria que aprofundar o que ela representava na época com seu cabaré, frequentado na juventude por Juscelino Kubistchek e seus amigos. Olimpia era dona do cabaré mais famoso e elegante de Minas. Políticos, coronéis, jovens abastados frequentavam suas meninas, tratadas com luxo e mão de ferro ao mesmo tempo. Olímpia tinha um gosto refinado, espanhola de Viga, conhecia os requintes da vida e as fantasias masculinas. Seu cabaré era bem cuidado, as moças escolhidas a dedo, a decoração suntuosa e o ambiente de total liberdade e discrição garantiam a lotação esgotada todas as noites.
Entretanto, todo esse glamour tem um preço: o lado B. Decidi, então, ao voltar de uma viagem à Espanha, onde em Madri pude treinar a pronúncia espanhola, uma vez que os sons das letras Z e S são muito específicos, ver o que se passava na noite paulistana, em locais menos elegantes digamos assim. Por mais refinado que seja o ambiente, não se pode esquecer que trata-se de pessoas que dependem de seu corpo, que o vendem para viver, que muitas vezes se submetem a situações de dominação por parte do cliente, humilhação e outras coisas não declaradas. E seguem regras rígidas. Visitei locais no Centro de São Paulo onde, por exemplo, via claramente o esquema de incitar o consumo dos clientes na casa, oferecendo bebida, mas as moças tomavam chá como se fosse uísque. Vi cubículos separados por uma parede onde os casais sem inibição alguma davam vazão a seus desejos, enfim, quis “desglamourizar” o que eu teria que trabalhar na personagem para poder, a partir da realidade, sem descaracterizar, colocar o brilho, a beleza, a leveza que o cliente busca em ambientes como o cabaré de Olimpia Garcia.

Quanto à pronúncia exata e o sotaque espanhol ao falar português, eu sempre digo que para se fazer um sotaque é necessário interpretar a personagem antes de mais nada, com verdade, é o único modo para que o sotaque venha de maneira orgânica. Entretanto, se não houver um cuidado com a técnica e a perfeição do sotaque, corre-se o risco e fazer uma caricatura ou ter uma interpretação falsa em que o sotaque se separa da personagem, o que torna ambos inverossímeis.

Tive a meu favor além de uma trama envolvente e um  texto primoroso, de Maria Adelaide Amaral, Alcides Nogueira, Geraldo Carneiro, Leticia Mey e Rodrigo Amaral, o fato de falar a língua e de conhecer a pronúncia do espanhol da Espanha, completamente diferente da pronúncia nos outros países de língua espanhola.

Melão - Em “Tempos Modernos”, sua personagem Justine também se comunicava em vários idiomas. A personagem foi construída especialmente pra você?

Tuna - Justine era poliglota sim e se comunicava no mesmo diálogo  em vários idiomas. Numa das cenas, por exemplo, ela diria uma palavra em vários idiomas ou a mesma frase igualmente. Era um exercício delicioso e efetivamente a personagem foi escrita para mim, o que me deixou muito honrada. Bosco Brasil e Maria Elisa Berredo conheciam meu trabalho como atriz e como intérprete de eventos internacionais,  de atores, cantores de ópera, diretores de teatro, cinema, enfim, sabiam que eu transitava por várias línguas , traduzia coletivas de Imprensa, montagens de palco enfim, conhecia  minhas  diversas vertentes profissionais  e me deu esse saboroso personagem. Eu faria uma participação especial de alguns capítulos, e me fizeram uma surpresa maravilhosa: permaneci até o final da novela e adorei. É muito gratificante quando uma personagem tem essa aprovação e se pode explorar outros limites, usar a experiência pessoal para enriquecer sua expressão.

Melão - Você se inspirou em alguém para compor a hilária Sueli Pedrosa, apresentadora sensacionalista em “Ti Ti Ti”?


Tuna - Obrigada por achá-la hilária! Eu adorava fazer a Sueli e armar uns bons barracos. Numa das rubricas de Maria Adelaide Amaral estava escrito “praticamente um homem”, e claro ela era uma mistura de vários apresentadores sensacionalistas, um tipo difundido na TV do mundo inteiro. Explorar a miséria humana, chorar na frente das câmeras, invadir a privacidade dos entrevistados, exagerar os dramas de terceiros para fazer aumentar a audiência, alimentar o imaginário mórbido do público, tudo isso se mesclava em Sueli, representante fiel desse tipo de jornalismo e seu estilo permitia uma grande liberdade na interpretação sem receio de parecer excessiva porque ela era real, ela existe como personagem porque existe na vida. A repercussão foi surpreendente e ocorreram alguns fatos divertidos como, por exemplo, um dia cheguei a uma recepção grande e um casal muito simpático veio “brincar” com Sueli dizendo “nós achamos que você iria invadir a sala e já começar a perguntar um monte de coisas”, porque adoravam a personagem, ou na rua pessoas me paravam dizendo” a Sueli chegou gente!”, ou seja, isso é reflexo de que ao me basear em vários tipos que existem, isso chega diretamente no inconsciente coletivo e as pessoas reconhecem o que estão vendo. Há vários programas vespertinos em que as pessoas armam barracos como os da Sueli.

Melão - Você é noveleira? Se sim, quais suas novelas favoritas como espectadora?

Tuna - Pode-se dizer que sim, na medida em que gosto do gênero, mas não é sempre que sigo uma novela todos os dias por causa do trabalho que muitas vezes não deixa tempo nem de ver pela internet.  Mas há algumas que me hipnotizam. Como passei alguns anos no exterior, há várias que não vi, mas me lembro que ao voltar me deparei coma reprise de “A Sucessora”, de Manoel Carlos, grudava na TV, assim como com “Água Viva”, de Gilberto Braga e “ Força de um desejo”, de Gilberto Braga e Alcides Nogueira. Adorei “O Clone”, de Gloria Perez, mas novelas que nunca mais esqueci... há algumas da extinta TV Excelsior, como “Sangue do meu Sangue”, de Vicente Sesso, “A Muralha”, “Beto Rockfeller ‘, de Bráulio Pedroso, “Que Rei sou eu?”, de Cassiano Gabus Mendes, e outras como “Roda de Fogo”, de Lauro Cesar Muniz. Gosto muito de “Dono do Mundo”, a primeira versão de  “Mulheres de Areia” e “Selva de Pedra”, e a imbatível “Vale Tudo”, assumo o vício! A primeira novela que vi por exemplo foi “ A moça que veio de longe” com Rosamaria Murtinho e aí o bichinho pegou. Afinal nasci em tempos de “O Direito de Nascer”, “Redenção”, “O preço de uma vida” (até hoje me lembro de Sergio Cardoso, o Dr Valcourt, chamando a Tula, de Nivea Maria). O final dos anos 60 trouxe um tipo de folhetim que, quando seguido o modelo hoje, acaba seduzindo o espectador de modo irreversível. Mesmo uma fantasiosa e criativa “Saramandaia”, ainda que subvertendo certos ícones conquistou o público, “O Bem amado”, “Tieta”, “Éramos Seis”, “ O Rebu”, “O grito”, tantos títulos me voltam à memória . Há um tema musical emblemático para mim: “What a wonderful world” cantado por Louis Armstrong na maravilhosa “Pigmalião 70” com Tonia Carrero e Sergio Cardoso encantando a todos.


Melão - Como é sua rotina quando está fora das telas e dos palcos? O que a Tuna curte fazer nos momentos de lazer?

Tuna - Como acho que até não fazer “nada” é fazer algo, mesmo dormindo se sonha... Lazer é para mim não ter rotina, não me obrigar a nada, mas procuro fazer o que não tenho tempo quando estou trabalhando, como ir ao teatro, ao cinema , nadar se o clima permitir, caminhar, mas essencialmente fazer o que tenho vontade como por exemplo, ver do começo ao fim um seriado. Ultimamente peguei o box da fantástica série “Mad Men”  que quero devorar até o último episódio que espero, irá ocorrer num futuro bem distante. Então alterno atividades fora de casa e outras dentro de casa, faço arrumações, termino de ler um livro começado e claro, atualizo minhas conversas e vejo os queridos amigos que não tenho tempo de ver quando estou trabalhando muito.

Melão - Diante de seu talento para escrita, nunca teve vontade de escrever para televisão?

Tuna - Mais uma vez agradeço seu generoso comentário, mas jamais me atreveria a fazer algo que não sei, é quase uma temeridade não ter experiência e escrever para o veículo. Acho uma leviandade. Confesso que nunca senti essa vontade, mesmo agora com sua pergunta, não me vem esse desejo. Prefiro contar uma ideia ou contar uma história verdadeira para alguém que a escreva. Já escrevi para jornal, escrevo em sites e publiquei três livros, mas compor diálogos, montar essa arquitetura sofisticada da escrita televisiva, é atividade para quem tem essa vocação. Tenho claro que a minha é a de dar vida que vocês, com tanto talento, criam para nós, atores.

Melão - Existe algum personagem ou tipo específico que você ainda gostaria de interpretar?

Tuna - Tenho fascínio, veneração pela tragédia grega, por ópera, pelas manifestações artísticas dos sentimentos mais profundos e os paradoxos humanos. Quando entrei na EAD (Escola de Arte Dramática) interpretei minha personagem predileta, a Cassandra, de “As Troianas”. Mais de vinte anos depois é um ícone para mim. Uma megera domada, uma vilã com suas vulnerabilidades são sempre interessantes. Personagens pouco óbvios me atraem, mas igualmente uma comédia rasgada, deliciosa, preciso mesmo é de personagens que gerem empatia, palpáveis, reais, sejam dramáticas ou cômicas, elas têm que ser universais, nas quais eu e o público nos reconheçamos. Eu de qualquer forma, me apaixono e defendo minhas personagens. Cada uma é no fundo, alguém que faria qualquer coisa pelo que acredita. Gosto de personagens que vivem situações-limite e  o que elas são capazes de fazer do que fizeram delas.
______________
Tuna, querida, não tenho palavras para agradecer por sua generosidade e dedicação ao conceder essa entrevista tão rica e repleta de carinho e intensidade e histórias deliciosas de toda uma vida. Desejo a você todo sucesso do mundo e que “os astros” possam nos reunir muitas outras vezes! 


segunda-feira, 13 de junho de 2011

Melão Express: Rapidinhas, mas saborosas – ed.16


Ø  INSENSATO CORAÇÃO: CONSTRUÍDA DIANTE DO PÚBLICO

Os números da audiência de “Insensato Coração” vem subindo a cada semana e já alcançou os 40 pontos antes de sua antecessora “Passione”. Apesar da audiência continuar sendo o principal critério para aferir o sucesso de uma novela, a gente só sabe que ela “pegou” pra valer a partir de sua repercussão. E pelo que se constata nas ruas, nas redes sociais e nas discussões em família, a novela pegou pra valer. A partir do capítulo 100, as tramas (até então soltas e sem conexão aparente entre elas) começaram a serem costuradas para dentro, trazendo dinamismo e uma sensação de unidade à história. A alta rotatividade de participações especiais começa a ser compreendida dentro da estrutura geral e fazer todo o sentido perante o público. Dentro desse acerto, destaca-se a personagem Norma, em mais uma atuação arrasadora de Gloria Pires, por quem o público torce desde o início. De vítima a algoz, Norma é capaz de tudo para consumar sua vingança contra Léo (Gabriel Braga Nunes), mesmo que para isso tenha que fazer tanto mal às outras pessoas quanto o mal que sofreu do próprio vilão. Eis o dilema ético da personagem que, para alcançar seus objetivos, precisa usar de meios nada ortodoxos. O mais interessante é o fato da personagem ter sido construída pelos autores Gilberto Braga e Ricardo Linhares e seus colaboradores, diante do público. Acompanhamos toda a transformação de Norma, uma das personagens mais ricas e complexas dos últimos tempos. Nem heroína, nem vilã, Norma transborda humanidade. A sequência em que ela tenta matar Teodoro (Tarcísio Meira), se arrependendo logo depois, foi fantástica e Glória Pires soube com maestria interpretar toda essa nuance de sentimentos contraditórios. Norma é daqueles personagens que fogem de todos os estereótipos e maniqueísmos, gera discussões e, por isso, mesmo se torna tão interessante de se acompanhar, já que seu desfecho é imprevisível. Esse é o grande barato de “Insensato Coração”: foi uma novela que não trouxe fórmulas prontas e personagens com funções óbvias ou pré-definidas. Talvez isso tenha sido o motivo da estranheza inicial: a trama foi construída aos poucos e não é fácil para o público, já habituado a receber as tramas mastigadas, assimilar personagens mais complexos e ainda embrionários. Os autores assumiram os riscos de sua escolha e agora colhem os bons resultados de sua ousadia.


Ø  MORDE E ASSOPRA: DRAMA VENCENDO O RISO



Nem dinossauros, nem robôs. O grande sucesso de “Morde e assopra”, novela de Walcyr Carrasco, é o bom e velho drama folhetinesco da mãe coragem que se sacrifica em nome do filho ingrato. Cássia Kiss tem roubado todas as atenções com sua comovente e emocionante atuação na pele da sofrida Dulce, mãe abnegada, que trabalhou a vida inteira para que o filho se tornasse médico e, no fim, descobre que ele gastou todo o dinheiro e não se formou. A cena do acerto de contas entre mãe e filho foi de rasgar coração. Cássia, sempre visceral e intensa, explodiu em fúria e emoção, arrancando lágrimas do público. Palmas também para Klebber Toledo, que soube segurar e acompanhar toda a intensidade de Cássia, que prova mais uma vez ser uma atriz de infinitas possibilidades que se entrega pra valer em todos os seus trabalhos. E a julgar pelo destaque da trama de Alice (Marina Ruy Barbosa), que maltrata Lilian (Narjara Turetta, também em ótimo momento) sem saber que, na verdade, ela é sua verdadeira mãe, contata-se um fenômeno interessante: em uma trama eminentemente de humor como é “Morde e Assopra”, o grande destaque, até o momento, tem sido seus entrechos dramáticos.

Ø   MELÃO ADERE À CAMPANHA PELA REPRISE DE "TIETA"



Como todos sabem, sou fã incondicional de Betty Faria e sua presença nas telas é sempre motivo de grande alegria. Por isso, o melão adere à campanha lançada por Anna Paulla Ferreira para que a novela “Tieta” ganhe nova reprise no “Vale a pena ver de novo”. Em tempos de celebração de grandes novelas e aproveitando o centenário do autor Jorge Amado em 2012, uma nova reprise da novela se faz oportuna e benvinda. Anna criou um blog e também uma petição pública, pedindo a reprise da novela. Segue abaixo o link para os dois. Que nossa cabrita favorita volte a fazer “méééé” muito em breve, para alegria geral dos telemaníacos.


Com a palavra, a própria Betty, dando o pontapé inicial da campanha:




Petição pública: Tieta (novela)! Vale a Pena Ver de Novo!

Blog: Tieta (novela)! Vale a Pena Ver de Novo!


Ø  OS ASTROS ESTÃO CHEGANDO...   

Meus queridos, estamos a um mês da grande estreia! Nem preciso dizer o quão ansioso e emocionado estou, já que em meu primeiro trabalho como roteirista na Rede Globo, não poderia fazer parte de projeto mais especial. Com as bênçãos de Santa Janete, “ O astro” vem com tudo. No que depender dos autores do remake, Alcides Nogueira e Geraldo Carneiro e dos colaboradores, Tarcísio Lara Puiati e eu, será uma obra muito bonita e especial, pois todos os capítulos são construídos artesanalmente, com um carinho e um cuidado imensos, sempre reverenciando  e respeitando os pilares da história criada pela grande dama das telenovelas, mas também imprimindo um estilo próprio e contemporâneo.

Para começar a dar um gostinho, segue o vídeo do belíssimo teaser, que conta com a participação dos astros das duas versões: Francisco Cuoco e Rodrigo Lombardi. Cuoco dará vida a Ferragus, grande mestre que ensinará todos os truques a Herculano. Ver Cuoco novamente de turbante é emocionante para qualquer pessoa que ama teledramaturgia. Imaginem então escrever para ele.

Espero poder contar com a audiência e o apoio de todos vocês a partir de 12 de julho, quando “O astro” voltará para conquistar o Brasil de novo. #será?




quarta-feira, 1 de junho de 2011

Dos “anos dourados” aos “anos insensatos”: relações familiares e códigos de conduta



Celeste (Yara Amaral) e Lurdinha (Malu Mader), mãe e filha em cena de "Anos Dourados"

Não raro, os folhetins de Gilberto Braga propiciam fóruns de amplas e acaloradas discussões sobre diferentes temas em nossa sociedade. Há os que focam mais nas relações de política e ideologia da sociedade como “Vale Tudo”, “O dono do mundo” ou “Pátria Minha”. E há aqueles em que as relações familiares são o foco e servem como ilustração dos códigos de conduta da sociedade da época como nas minisséries “Anos Dourados” e “Anos Rebeldes” e a novela “Insensato Coração”, parceria do autor com Ricardo Linhares.

Em “Anos Dourados”, a maioria dos personagens exala hipocrisia, sobretudo Celeste (Yara Amaral em magistral e inesquecível interpretação). A conservadora mãe de Lurdinha (Malu Mader) se mostrava mais preocupada com que o que os outros vão pensar do que com a felicidade e o bem-estar da própria filha. Reprimida sexualmente, proíbe o namoro de Lurdinha com Marcos (Felipe Camargo) pelo fato da mãe do rapaz, Glória (Betty Faria) ser desquitada e apresentar um comportamento avançado para os padrões da época. Glória era à frente de seu tempo e Celeste já era anacrônica. Talvez as personagens que representassem melhor o senso comum das mulheres da época fossem Marieta (Tânia Scher) e Abigail (Maria Lucia Dahl). Marieta era tão hipócrita a ponto de flagrar o marido assediando a empregada e mandá-la embora depois, aceitando as desculpas do marido em troca de uma enceradeira. Nos anos dourados, podia-se fazer de tudo, desde que por baixo dos panos. O grande vilão da série era justamente o código de conduta ao qual todos tinham que obedecer. Até a moderninha Rosemary (Isabela Garcia), falada por todo o bairro por seu comportamento livre e permissivo, tinha consciência de que precisava manter sua virgindade e não deixava que os namorados avançassem nas carícias. Rosemary, de certa forma, compactuava com a hipocrisia que a rodeava e não quis pagar o preço de sua ousadia, ao contrário de Glória, que pagou um preço alto por fazer o que acredita e não o que esperavam dela.


Claudia Abreu e sua Heloísa em "Anos Rebeldes"

Uma década mais tarde, em “Anos Rebeldes”, temos Heloísa (Claudia Abreu) que, ao contrário de Rosemary, não fazia a menor questão de sua virgindade. Pelo contrário: queria perdê-la a todo custo, não por motivações românticas, mas por afirmação da liberdade feminina. Heloísa fez de sua sexualidade quase um ato político, reflexo dos tempos em que vivia, de liberação sexual e do advento do feminismo.



Já no século XXI, em pleno 2011, a sociedade ainda se choca com o comportamento de Leila (Bruna Linzmeyer), jovem que exerce sua sexualidade de maneira livre, sem motivações românticas ou preocupações com as convenções sociais. Isso nos leva àquela antiga discussão: de Urubu (Taumaturgo Ferreira) em “Anos Dourados” a André (Lázaro Ramos) em “Insensato Coração), é totalmente aceitável (e até esperado) que o homem tenha tantas relações sexuais sem compromisso quanto puder. Quando uma mulher apresenta esse comportamento, sobram reprovações, xingamentos e comentários do tipo “ela não se valoriza” (opinião de cerca de 70% das pessoas que votaram na enquete do blog de Patrícia Kogut), como se a castidade fosse uma espécie de virtude a ser preservada pelo sexo feminino. Outro fator que talvez possa ter contribuído para uma certa rejeição de Leila, foi o fato dela reagir contra a repressão familiar e ter dado um tapa na cara do próprio pai, Julio (Marcelo Valle). Talvez se fosse o contrário, parte do público torceria por ela, já que temos uma enorme vocação para simpatizar com os oprimidos. Mas Leila reagiu e não cedeu às pressões da mãe, Eunice (Deborah Evelyn), espécie de Dona Celeste pós-moderna e tão hipócrita quanto ela. Eunice não hesita em manipular as filhas, inclusive ao permitir que elas tenham vida sexual, em troca de um bom casamento. Ainda em “Insensato Coração”, assim como André, Leila coleciona transas, desta vez não mais como postura política, a exemplo de Heloísa, mas como forma de chamar a atenção de André, por quem se apaixonou. Desta forma, até para Leila, o sexo tem uma função desviante de amor ou prazer e também é usado para se alcançar um objetivo mais prático.

Leila (Bruna Linzmeyer), Eunice (Deborah Evelyn) e Julio (Marcelo Valle) em cena de "Insensato Coração"

Apesar de notarmos um grande avanço e uma quebra de inúmeros paradigmas e preconceitos, dos anos 50 até os dias de hoje, percebemos que ainda há um longo caminho a se percorrer no que diz respeito em muitos temas, como por exemplo, a liberdade sexual da mulher. Nesse sentido, a teledramaturgia, sobretudo as tramas de Gilberto Braga, sempre geram discussões, polêmicas e controvérsias que refletem o comportamento da sociedade em todos os seus avanços e retrocessos.

Vitor de Oliveira
___________________

Prefira também: