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quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Melão entrevista Rogéria Gomes: uma dama a serviço de grandes damas.




Rogéria Gomes é jornalista de formação e fã de teatro desde criancinha. Professora universitária, uniu suas duas paixões pela primeira vez ao levar os alunos ao teatro, fazendo com que eles conhecessem os atores e realizassem trabalhos sobre os espetáculos. Recentemente, ela uniu essas duas paixões mais uma vez ao lançar o livro “As grandes damas e um perfil do teatro brasileiro”, que narra a trajetória de nosso teatro através do depoimento de nove grandes damas de nossa dramaturgia: Bibi Ferreira, Eva Todor, Eva Wilma, Beatriz Lyra, Norma Blum, Laura Cardoso, Ruth de Souza, Nicette Bruno e Beatriz Segall, estrelas também sempre presentes em nossa televisão. Imperdível para quem aprecia o talento dessas grandes atrizes! Melão estende o tapete vermelho para essas grandes damas e reverencia Rogéria Gomes pelo incrível trabalho de preservação de nossa memória cultural. A autora concedeu uma deliciosa entrevista. Confiram!

Pra começar, fale um pouco de sua trajetória profissional e de que forma você uniu sua carreira com a paixão pelo teatro.
Rogéria Gomes - Escolhi ser jornalista como primeira opção mesmo. Desde pequena sempre gostei de escrever e minha brincadeira predileta era ser ‘professora’ das minhas bonecas e das avós. Era uma delicia! Acho que desde esta época fui gostando da ideia. Além disso, sou uma pessoa que gosto de gente, de conhecer pessoas, de observar fatos, uma característica bem peculiar do ramo jornalístico. Decidi-me pelo jornalismo cultural ainda na universidade, pois reafirmei o que sempre acreditei: sem memória não se constrói uma nação.
Quanto ao teatro, creio que devo à minha mãe, uma apreciadora e frequentadora assídua de teatro. Com ela assisti às primeiras peças infantis que até hoje povoam meu imaginário criativo. Daí pra frente nunca parei, sou uma boa plateia. É um grande prazer estar no teatro e ter a oportunidade de ver o mundo com os olhos da arte. Por esta paixão comecei a estudar e pesquisar o assunto.



Como surgiu a ideia do livro e como se deu a escolha das atrizes retratadas?
Rogéria Gomes - O livro surgiu por esta lamentável lacuna cultural que vivemos tão de perto em nosso país. Quando professora universitária percebia a total falta de informação de meus alunos na área cultural, em especial às artes cênicas. E eram alunos do curso de jornalismo, e muitos nunca haviam ido a um teatro, assistido a uma peça sequer. Isso me chamava a atenção de forma negativa. Com eles iniciei um processo pouco feito ate então, sugeria aulas a partir de peças teatrais. Íamos ao teatro, muitas vezes os atores conversam após os espetáculos com eles e depois eu solicitava um trabalho curricular.  Ao deixar a universidade fiquei com esta questão sempre latente. Assim surgiu a ideia de escrever um livro que guardasse a memória tão importante e rica do teatro brasileiro e que de alguma forma despertasse o interesse das pessoas pelo teatro.  As atrizes escolhidas vieram em decorrência da parte histórica do livro, pois todas fizeram parte da construção do teatro relatada nesta primeira parte.

Como foi o processo de escritura do livro? Você se encontrava periodicamente com as atrizes? Quanto tempo durou essa fase de entrevistas e coleta de informações?
Rogéria Gomes - O processo foi gratificante e prazeroso, tive a chance de conhecê-las ainda mais. Decidi por depoimentos individuais e os encontros não foram tantos, pois estas atrizes eu já havia entrevistado algumas vezes ao longo da profissão. Do inicio a conclusão levei em torno de um ano, excluindo a parte de pesquisa que já vinha acontecendo.

O que destacaria de cada uma das atrizes selecionadas? O que faz de cada uma delas uma grande dama?
Rogéria Gomes - Em todos percebi muita coisa comum, mas especialmente a dedicação, o aprimoramento profissional e a determinação. Sem contar a paixão pelo  oficio que exercem, exalam até no olhar.  São incansáveis nestes quesitos.  Essas virtudes aliadas ao talento pessoal as credenciam, sem dúvida, ao patamar das ‘grandes damas’ que são.

A autora com algumas das damas do livro: Eva Todor, Ruth de Souza, Norma Blum e Bibi Ferreira
  
Todas as atrizes do seu livro também possuem uma sólida carreira na televisão. Você contemplou também um pouco da carreira televisiva delas ou deu total ênfase ao trabalho nos palcos?
Rogéria Gomes - Procurei privilegiar as atuações cênicas onde todas começaram, e podemos dizer é a base mais sólida do ator, já que a proposta central do livro é contar a história do teatro no Brasil. Mas ao longo dos depoimentos falamos também dos importantes papeis que interpretam na tevê. Vale comentar que Bibi Ferreira é a única exceção, nunca fez televisão, apenas quando apresentou um programa de variedades  nos anos 60 na TV Excelsior com sucesso.

Pretende dar continuidade ao projeto com novos volumes contemplando outras grandes damas ou, até mesmo, ícones masculinos de nosso teatro?
Rogéria Gomes - Sim, já estamos em fase de negociação para dar continuidade ao projeto e contemplar também os atores, igualmente importantes e talentosos e algumas outras atrizes de mesmo porte. Ainda não temos previsão do lançamento, mas já estamos alinhavando. Ainda sou muito convidada a falar deste primeiro, que graças a Deus tem dado ótimos frutos, superando nossas expectativas.

Além de amante do teatro, você também é noveleira?  Na sua opinião, qual o papel da telenovela na vida do brasileiro?
Rogéria Gomes - Gosto de novela sim, em especial as que tratam de temais atuais e das chamadas de ‘época’ pela importância histórica. Não sou telespectadora assídua, mas sempre que posso assisto, em especial quando o tema me é relevante. Acredito que a telenovela influencia muito a sociedade em sua forma de pensar e agir, podendo mudar conceitos e opiniões, daí a importância do conteúdo que propõe. A tevê ainda é o veiculo de comunicação mais presente, está na vida cotidiana de todos nós e, portanto, deve estar atenta a cumprir o dever de informar e fazer pensar.

Foto: Marcelo Rissato

Agradecimentos: Marcelo Rissato
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Série Memória Afetiva: grandes damas da televisão


Entrevista: Nilson Xavier – enciclopédia televisiva.




sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Série Memória Afetiva: grandes damas da televisão


Nunca escondi minha predileção por atrizes. Claro que aprecio o trabalho de um grande ator e muitos deles já habitam no panteão de minha memória afetiva. Mas o fascínio que elas exercem em meu imaginário é inexplicável. Nada é mais poderoso e impactante do que uma atuação feminina. Para dar continuidade a essa homenagem a elas, já que eu já criei um post especial sobre as grandes estrelas da tevê (leia aqui), agora resolvi reverenciar as grandes damas, as essenciais, que carregam toda a bagagem teatral e, embora nem sempre ganhem o posto de protagonistas, são imprescindíveis em qualquer novela. Claro que toda lista é subjetiva, sobretudo as deste blog, assumidamente afetivo. Sei que devo estar cometendo alguma terrível injustiça ao ser traído por minha própria memória, mas mesmo as grandes atrizes que não constam nessa lista, toda minha reverência, respeito e admiração.
Mas as favoritas do melão são elas:

ROSAMARIA MURTINHO



Na verdade, é a grande inspiração desse texto. Tudo o que disser será pouco diante do encantamento que tive com sua arrebatadora atuação como Tia Magda em “O astro” (2011). Em contraponto perfeito com o furacão Clô Hayalla (magistralmente vivida por Regina Duarte), a Tia Magda de Rosamaria Murtinho teve sua personalidade introvertida construída nos detalhes, nas sutilezas, de maneira artesanal, que só mesmo uma atriz com grandes recursos seria capaz. Rosamaria conseguia transmitir toda a amargura e a melancolia de Magda apenas pelo olhar. Ela brilhou intensamente durante toda a novela, mas foi no último capítulo que conseguiu arrancar lágrimas do público ao explodir e deixar transparecer todo o seu rancor, seu ressentimento e sua inveja pela sobrinha Clô. E a cena em que Magda se suicida entrou simplesmente para a antologia das grandes cenas. De cara limpa, com uma coragem absurda, Rosamaria mostrou porque é realmente uma das maiores atrizes desse país. Até então, sua esfuziante Romana Ferreto de “A próxima vítima” era minha personagem favorita da atriz. Mas Magda me arrebatou completamente e recolocou Rosamaria no centro das atenções. Minhas primeiras lembranças da atriz datam das comédias oitentistas de Sílvio de Abreu como “Cambalacho” (1986) e “Jogo da Vida” (1981), mas essa moça veio de longe. Desde os tempos da Excelsior, já brilhava na constelação televisiva de nosso país e forma com Mauro Mendonça um dos casais mais simpáticos e admirados de nossa tevê. Foi uma honra trabalhar com você e já estou ansioso pelo próximo encontro.

FERNANDA MONTENEGRO



Talvez seja a grande unanimidade de nosso país. Sua indicação ao Oscar foi um grande reconhecimento mundial, mas o que Hollywood só descobriu há alguns anos atrás, nós, brasileiros já conhecíamos e desfrutávamos de longa data: seu avassalador talento. São muitas Fernandas em uma só: a adorável cambalacheira Naná, de Cambalacho (1986); a terrível Bia Falcão de “Belíssima”(2005); a tresloucada Charlô, de “Guerra dos Sexos” (1993); a mística Vó Manuela de “Riacho Doce” (1990); a aventureira Zazá (1997); a cosmopolita Lulu de Luxemburgo de “As Filhas da Mãe” (2001); a dominadora Chica Newman, de “Brilhante” (1981); a deliciosa Olga Portela de “O dono do mundo” (1991), só pra citar algumas de suas grandes personagens. A cafetina Jacutinga de “Renascer” (1993) é absolutamente inesquecível. Fica até difícil destacar um personagem dentre tantas interpretações perfeitas. Mais difícil ainda é dizer algo de Fernanda que ainda não tenha sido dito. Dona de todos os recursos, referência total de qualidade e competência. Vida longa para La Montenegro.


NICETE BRUNO

 A primeira imagem que temos de Nicete é de seus personagens doces e simpáticos, mas quem a assistiu como a perversa Úrsula de “O amor está no ar” (1997) ou como a amargurada Isolda de “Louco Amor”, conhece o imenso potencial da atriz que atualmente vem dando show como a amorosa Iná, avó das personagens de Fernanda Vasconcelos e Marjorie Estiano em “A vida da gente” (2011). Também podemos comprovar atualmente outra faceta de Nicete como a divertida perua Juju, que não suporta ser chamada de Julieta pelo marido em “Mulheres de Areia” (1993). Provocou risadas na plateia muitas outras vezes, como em “Alma Gêmea”, em que infernizava a vida do genro vivido por Fúlvio Stefanini. Não tem quem admire essa atriz de sorriso cativante. Casada com Paulo Goulart, também forma um dos casais mais queridos do meio artístico.



EVA TODOR

Estamos acostumados a vê-la sempre no papel de senhorinha irreverente e atrapalhada, mas sua Santinha Rivoredo de “Sétimo Sentido” (1982) revelava uma faceta extremamente dramática da atriz e grande capacidade de criar megeras. Verdadeiro ícone do teatro, teve estreia tardia da Rede Globo em Locomotivas (1977) como a matriarca Kiki Blanche, dona do salão onde se passava a maioria dos conflitos da novela. Outro momento de destaque foi na minissérie “Hilda Furacão” (1998) em que deu vida a Loló, uma conservadora senhora da tradicional família mineira dos anos 50, que fazia de tudo para destruir Hilda e toda a zona do baixo meretrício de Belo Horizonte. Mas os papéis irreverentes são realmente sua especialidade, que sempre dão um sabor especial às produções das quais faz parte.



CLEYDE YÁCONIS


Irmã da lendária Cacilda Becker, Cleyde também é daquelas atrizes superlativas, que defendem com dignidade qualquer papel. Ela convence tanto quanto a perua falida Isabelle em “Rainha da Sucata”, quanto as avós amorosas que viveu em “Vamp” (1991) e “Eterna Magia” (2007). A matriarca Guilhermina Taques Penteado, de “Ninho da Serpente” (1982) é um de seus grandes papéis na tevê. Mas a doce Melica, de “Os ossos do Barão”, remake do SBT, também tem um grande número de admiradores. Recentemente, pudemos rever Cleyde como um dos grandes destaques de “Passione” (2010), como Dona Brígida, a assanhada velhinha que mantinha um caso com o motorista Diógenes, vivido por Elias Gleiser. Ela é a razão de ser de produções pouco memoráveis como “Sex Appeal” (1993), mas também pode ter apenas um delicioso momento como em grandes produções como a minissérie “Um só coração” (2005), em que viveu ela mesma. O fato é que Cleyde Yáconis é indispensável e marcante em qualquer produção.


RUTH DE SOUZA



Essa foi uma grande desbravadora. Não chegou a ser a primeira negra a protagonizar uma novela (Yolanda Braga protagonizou “A cor da sua pele”, na Excelsior em 1964), mas certamente foi a mais marcante ao protagonizar “A cabana do Pai Tomás”, em 1969. Ganhou notoriedade no cinema com o filme “Sinhá Moça”, de 1953, inspirado no romance que mais tarde também viraria novela em 1986, na qual fez sucesso como Balbina, ao lado de Grande Otelo, formando um dos mais adoráveis casais da novela. É sempre uma presença agradável em cena, como em “O clone” (2001) em que vivia Dona Mocinha, a avó do clone Léo (Murilo Benício). Também teve um papel marcante em “O bem amado” (1973) ao lado de Milton Gonçalves. Atualmente, tem uma presença bissexta nas telas, mas sempre com muito brilho e interpretando todo tipo de papel, desde juízas a mães de santo. Se hoje temos Taís Araújo, Camila Pitanga e Sheron Menezes em papéis de destaque nas novelas, é porque no passado tivemos Ruth de Souza abrindo caminho para o artista negro no Brasil.


BEATRIZ SEGALL


Talvez as grandes vilãs, sobretudo Odete Roitman, a tenham marcado de maneira indelével em nossa teledramaturgia, mas Beatriz Segall já provou que é capaz de dar vida a diferentes tipos de personagens. Recentemente, a vi no teatro ao lado de Herson Capri no espetáculo “Conversando com mamãe”, em uma atuação comovente e convincente como uma simplória dona de casa. Na tevê, foi desde a alpinista social Lourdes Mesquita em “Água Viva” (1980) à idealista cientista Miss Brown em “Barriga de Aluguel” (1990), passando pela fogosa Stela, frequentadora do Clube das Mulheres em “De Corpo e Alma” (1992). Apesar das grã-finas serem sua especialidade, já foi uma mulher pobre moradora de vila em “Champagne” (1984). Uma personagem que gostava bastante era a quatrocentona falida Clô, da segunda versão de “Anjo Mau” (1997), em ótima dobradinha com a saudosa Ariclê Perez e fazendo um par comovente com José Lewgoy. Embora as madames sejam sua especialidade, La Segall é bem mais do que isso.


NATHALIA TIMBERG



Mais uma representante do que temos de mais nobre em nossa teledramaturgia. Recentemente, voltou a cativar o público na reprise de “ValeTudo” com a doce e submissa Tia Celina, em excelente contraponto com a diabólica Odete Roitman de Beatriz Segall. Mas diabólica é algo que Nathalia também sabe ser, como provou em “Força de um desejo” (1999) como a maquiavélica Idalina. Outra vilã gilbertiana vivida muito marcante foi a mesquinha Constância Eugênia, de “O dono do mundo”. Na primeira versão de “Ti Ti Ti” (1985), pôde flertar com o nonsense ao interpretar a desmemoriada Cecília. A atriz já emociona o país há muito tempo, como no megassucesso “O direito de Nascer” (1965). Em “A Rainha Louca” interpretou tanto a mocinha, quanto a vilã. Como queria ter assistido... O fato é que, mesmo com papéis sem grandes possibilidades como a recente Vitória Drummond em “Insensato Coração” (2011), é sempre uma presença digna e brilhante em cena.


LAURA CARDOSO



Uma das atrizes mais constantes em nossa tevê, que também transita por diferentes tipos desde os tempos da Tupi. Minha primeira lembrança dela foi na novela “Pão pão beijo beijo”, na pele da nordestina Donana. A partir daí, uma infinidade de tipos me vem à mente, como a autoritária matriarca indiana Laksmi de “Caminho das Índias” (2009) ou a simpática Glória, da atual temporada de “A grande Família”. Meus personagens favoritos são a Isaura, mãe das gêmeas Ruth e Raquel, que tinha uma clara preferência pela última em “Mulheres de Areia” (1993) e Dona Guiomar, a amável sogra de Raul (Miguel Falabella), que passa a repudiá-lo após ser possuída pelo espírito de Alexandre em “A viagem” (1994). Uma verdadeira operária da tevê que já viveu praticamente todo tipo de personagem.


ARACY BALABANIAN



Dá pra acreditar que a tresloucada Dona Armênia de “Rainha da Sucata” (1990) e a austera matriarca Filomena Ferreto de “A próxima vítima” (1995) foram vividas pela mesma pessoa? Versatilidade é pouco pra definir essa atriz, que brilha desde os tempos da Tupi. Suas atuações são tão marcantes que até hoje minha tia Marilza comenta sobre uma ou outra cena das mocinhas que interpretadas por Aracy em “Antonio Maria” e “Nino, o italianinho” nos longínquos anos sessenta. Minhas primeiras lembranças são oitentistas, claro, como a amarga Marta de “Ti Ti Ti” (1985) ou a dominadora Helena de “Elas por elas” (1982). Capaz de ir ao mais intenso dos dramas às comédias mais histriônicas como a Cassandra do humorístico “Sai de Baixo”, é uma das atrizes mais completas que temos.


EVA WILMA


Talvez a primeira grande estrela da tevê. Já fazia sucesso nos anos 50 ao lado de John Herbert em “Alô Doçura”, uma das primeiras sitcons brasileiras. Foi estrelíssima na Tupi, principalmente nas novelas de Ivani Ribeiro como “A barba Azul”, “A viagem” e “Mulheres de Areia”. A partir dos anos 80, viveu papéis de destaque na Rede Globo em novelas como “Ciranda de Pedra” (1981), “Elas por elas” (1982) e “Roda de Fogo” (1986). A endiabrada Altiva de “A indomada” (1996) é um de seus papéis mais marcantes, diametralmente oposto à equilibrada médica Marta no seriado “Mulher” (1998). Um de meus personagens favoritos é a submissa Hilda de “Pedra sobre Pedra” (1992). A cena em que ela toca piano para “acalmar” a lua para tentar impedir que Sérgio Cabeleira (Osmar Prado) seja levado por ela é das mais bonitas, emocionantes e delicadas que já vi. Mais uma atriz de múltiplos recursos, que vai dos tipos mais introvertidos às mulheres mais loucas e exageradas. Uma grande estrela que se transformou em grande dama.

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Quais são suas favoritas?

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Série Memória Afetiva: 10 divas televisivas.


sábado, 30 de abril de 2011

VALE TUDO: A NOVELA DAS SETE MULHERES



A maioria das vezes em que “ValeTudo” é lembrado pelo senso comum, os primeiros personagens que vêm à cabeça são, basicamente, as antológicas vilãs Odete Roitman e Maria de Fátima, vividas respectivamente por Beatriz Segall e Gloria Pires. Mas seria injusto dizer que “Vale Tudo” se resumiu a elas, como é igualmente injusto o título desse artigo, já que também tivemos personagens masculinos maravilhosos e igualmente complexos, como Ivan (Antonio Fagundes) e Marco Aurélio (Reginaldo Faria). O primeiro era o mocinho da trama, mas com quase tantos defeitos quanto o segundo, que era o vilão. Ivan era ambicioso, egoísta, carreirista e nem tão honesto assim. Já Marco Aurélio, o vilão, apesar de injusto, machista, desonesto e cínico, por outro lado, era um pai zeloso e preocupado, inclusive com o enteado. Esta é a prova de que, em “Vale Tudo”, nada é óbvio ou clichê. Tudo é mais complexo e mais humano, como a própria vida. Por isso, mais do que um retrato da corrupção no país, “Vale Tudo” continue cativando tanto o público até hoje: apesar das tramas rocambolescas, como toda boa novela, os personagens poderiam ser cada um de nós. Partindo desse princípio, uma rápida olhada no universo feminino da trama nos mostra como sete mulheres foram fundamentais para a trama. Diferentes entre si, são, praticamente, arquétipos de comportamento de nossa sociedade e merecem destaque, já que, poucas vezes em uma novela, tivemos sete personagens femininas tão fortes e cheias de possibilidade.


Não é exagero dizer que Raquel Acioly, a grande heroína da trama, que após sofrer um golpe da própria filha, perde tudo e reconstrói sua vida do nada, é a alma e o coração da novela. Das tripas coração, ela toma para si as rédeas de sua vida e é o grande exemplo positivo da trama e fez com que o público se solidarizasse com ela, vibrasse com suas viradas e se emocionasse com seu triunfo. Excessivamente ingênua, no início da trama, Raquel aprende através da dor e do trabalho e sempre renasce após cada derrota. Uma verdadeira fortaleza. E, certamente, toda essa intensidade de emoções não seria a mesma se sua intérprete não fosse ninguém menos que Regina Duarte, a atriz mais popular do Brasil, que não teve medo do ridículo, se entregou de corpo e alma, de maneira intensa, flertando muitas vezes com o patético, mas dando uma verdade impressionante ao papel. O público jamais ficou indiferente a ela, seja se irritando com seus gritos e com sua inocência exagerada, seja sentindo na própria pele, o drama da mãe sofredora e da mulher valente que segura seu destino à unha. O interessante é que, mesmo Raquel, o baluarte dos bons valores da novela, também dá suas derrapadas éticas, ao se encontrar com o amante na pousada de uma amiga em comum da esposa dele. Enfim, em um mundo cheio de falhas e imperfeições, Raquel não foi exceção.



Do outro lado da arena, está Maria de Fátima, a filha desnaturada, cuja ambição e vontade de ascender socialmente, eram maiores do que tudo, inclusive do que o amor pela própria mãe. Um aspecto interessante dessa personagem é que, diferente da maioria das vilãs, Fátima não é vingativa, nem rancorosa. Seus atos de vilania eram movidos, pura e simplesmente pela ambição. Fátima deu um golpe na própria mãe, roubou o namorado da melhor amiga, vendeu o próprio filho, mas nada disso era pessoal. Tudo tinha como foco a vitória e, para isso, ela não via obstáculos. Outro aspecto incomum dessa vilã é que ela sofria e se dava mal o tempo todo, até mais do que a heroína, o que fazia com que o público torcesse muitas vezes para que suas armações dessem certo. Fátima se metia em enrascadas o tempo todo e sempre escapava delas por um triz. Mas o que realmente é fascinante na personagem também é sua complexidade. Fátima tinha seu calcanhar de Aquiles: o amor por César (Carlos Alberto Ricceli), que lhe rendeu sua derrocada. Além disso, Fátima sofria cada vez qua fazia mal à mãe e tentou várias vezes se reaproximar dela. Dentro de seu conceito de moral, Fátima nunca desejou fazer mal a Raquel, embora, muitas vezes, isso fosse necessário para que alcançasse seus objetivos. E nem preciso dizer que Gloria Pires deu um show. A atriz compreendeu todas as nuances e complexidades da personagem e fez o público vibrar e reagir o tempo todo com seus atos. Com muita justiça, Gloria entrou definitivamente para o rol das grandes atrizes com a personagem.


Símbolo da injustiça, da corrupção e do poder dos ricos sobre os pobres, Odete Roitman, a princípio, nos parece o verdadeiro cão chupando manga. Implacável com os inimigos, insensível ao sofrimento humano e com um conceito bem deturpado de moral, a vilã diz frases desconcertantes sobre o país, por quem nutre um profundo desprezo. Há quem concorde com muitas dessas declarações, mas o fato é que, por trás dessa imponente couraça, se esconde uma mãe zelosa, sofre com a infelicidade dos filhos. Em uma das melhores cenas da novela, vimos uma Odete frágil, desarmada, impotente diante do alcoolismo da filha, pedindo perdão à irmã Celina, de quem tanto tripudia. Verdadeiro show de Beatriz Segall, que viveu Odete com tanta perfeição, que precisa provar até hoje que é capaz de viver personagens de outra natureza.



Falando em show de interpretação, talvez a grande injustiçada da novela seja Nathalia Thimberg, que viveu a doce e cordata Celina, irmã da megera Odete e constantemente dominada por ela. Apesar de uma personagem aparentemente fraca, a interpretação de Nathalia esteve longe de ser apagada. Nem sempre tão doce assim, Celina, muitas vezes, precisou ser sonsa e dissimulada para sobreviver à dominação da irmã megera e durante boa parte da trama foi a responsável por tirar o sono de Maria de Fátima, ao ameaçar desmascará-la perante todos. E Celina se revelou dona de um humor irônico e de um sarcasmo tão inteligente quanto o da própria Odete. A atriz conseguiu construir uma Celina apaixonante, aparentemente tola e alienada. Mas em certos momentos, vimos que, mais do que essência, era uma estratégia de sobrevivência da personagem. A atuação de Nathalia Thimberg, a exemplo das atuações de Regina Duarte, Renata Sorrah, Gloria Pires e Beatriz Segall, merece entrar para o panteão das grandes interpretações da novela.



E como se não bastasse, o clã dos Roitman ainda conta com outra personagem marcante: Heleninha. Disparada a melhor atuação de todos os tempos de uma personagem alcóolatra, Renata Sorrah deitou e rolou com as inúmeras possibilidades de sua personagem. Frágil, insegura e completamente dominada pela mãe, Heleninha convive com a culpa de se achar responsável pela morte do irmão, sem saber que a culpa de tudo fora da própria mãe. Em seus momentos sóbrios, a pergonagem tem sido chamada de chata pelos usuários do Twitter que acompanham a exibição da novela e publicam seus comentários simultaneamente. Mas a cada porre, é uma explosão de elogios à atriz, cuja entrega ao sofrimento da personagem, é absolutamente impressionante. Heleninha vai da angústia à euforia em um passe de mágica, o que poderia ser um trampolim para a caricatura, se fosse defendida por uma atriz mediana. Mas em se tratando de Renata Sorrah, o público também acompanha e compartilha desse carrossel de emoções, indo ás gargalhadas com a divertida embriaguez de Heleninha e também sofrendo com suas terríveis consequências. Personagem complexo, atriz superlativa.



No meio de tanta fera, coube à Lídia Brondi o mais ingrato dos personagens: o de mocinha romântica. E com tantas personagens femininas fortes e avassaladoras na trama, seria até normal que a “chérie” Solange Duprat ficasse totalmente ofuscada. Mas não foi o que aconteceu. Sim, Solange era lindinha, meiga, amiga, adorável, mas também soube ser lutadora e não se intimidou diante dos golpes da falsa amiga Maria de Fátima e enfrentou Odete de igual pra igual algumas vezes. Além do talento e carisma da atriz, também foi fundamental a construção de uma mocinha moderna, que lutava pelo que queria e não hesitava em partir para uma produção independente (muito em moda na época) quando quis ser mãe. Suas roupas, penteados e sua gíria “chérie” viraram mania na época e até hoje, há quem diga que Solange é uma das melhores mocinhas de novela, já que foi uma perfeita combinação dos valores positivos que uma mocinha deve ter, mas sem se render à chatice, na maioria das vezes, inerente a esse tipo de personagem.


Fechando o timaço, está Leila, que se manteve discreta na maior parte da trama. No início da novela, fazia um sutil contraponto com a Raquel. Enquanto esta última, não hesitava em arregaçar as mangas e trabalhar, Leila queria o caminho mais cômodo e não via problema algum em ser sustentada pelo ex-marido. Chegou a trocar o homem que amava, Renato, por outro que lhe oferecia mais estabilidade emocional e financeira. Leila nunca foi uma vilã, tampouco tinha a integridade de uma Raquel ou de uma Solange. No meio desse caminho, Cassia Kiss, uma excelente atriz em franca evolução, soube dar coerência a essa personagem que se mostrou fleumática na maior parte da trama até sua explosão ao assassinar Odete Roitman em seu único momento de descontrole emocional da trama. Isso garantiu a Leila o passaporte para a galeria de personagens antológicos de nossas novelas.
Por essas e outras, “Vale Tudo”, até hoje continua sendo uma novela exemplar que, se não subverteu a fórmula surrada do folhetim como “Roque Santeiro”, por exemplo, ao contrário, se apropriou dessa fórmula como poucas novelas, dando um gás totalmente novo e criativo. Mesmo que tenha contado com atrizes maravilhosas, que defenderam tão bem seus personagens, merecem aplausos efusivos o trio de autores, Gilberto Braga, Aguinaldo Silva e Leonor Bassères, por criar personagens tão densas e ricas do universo de “Vale Tudo”, uma verdadeira aula de roteiro, direção e interpretação.

Vitor de Oliveira 


quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Melão Express: Rapidinhas, mas saborosas – Ed. 11

                                                                                                                                                                                  
Ø AS CARIOCAS: UM GRANDE ACERTO



      Está sendo uma grata surpresa na grade de programação da Globo a série “As cariocas”. Anunciada desde o início do ano, ninguém deu muita atenção, mas foi só ir ao ar o episódio “A noiva do Catete” com Alinne Moraes, para termos a certeza de que se tratava de um biscoito finíssimo, de algo que, ao mesmo tempo, nos remetesse a um passado delicioso, mas com um quê de moderno. O produto é muitíssimo bem acabado do ponto de vista estético. A fotografia é moderna e deslumbrante, exala beleza, bom gosto e destaca as “belezas naturais” do programa, como sugere o narrador ao falar das protagonistas. O texto, baseado na obra de Sérgio Porto, às vezes, parece um pouco datado, tanto em alguns termos como “mulher honesta”, tanto em situações como assédio do patrão (hoje em dia um processo resolveria a questão). Mas é um porém muito pequeno se comparado às qualidades: agilidade, leveza, bom humor e sensualidade na dose certa. Cada episódio é diferente, mas ao mesmo tempo preserva a unidade da série. A narração de Daniel Filho é outro acerto. Aliás, que falta faz Daniel Filho à TV! O fato de gravar em locações da cidade maravilhosa lembra os antigos programas da Globo dos tempos pré-Projac. A série ainda não chegou nem em sua metade e já estou ansioso pelo DVD.


   Ø “POR UM FIO” É SÉRIO DEMAIS!

Quem acompanha “Por um fio”, versão brasileira do reality “Share Genious”, em que cabeleireiros disputam um prêmio, detecta as mesmas diferenças da versão original da versão brasileira de “America’s Next Top Model”. Não que o programa seja ruim, mas os brasileiros levam a sério demais esse tipo de competição. Nas versões americanas, os jurados são mais espirituosos, parecem se divertir e também divertem o público com seus comentários irônicos e engraçados. Já os brasileiros parecem sempre carrancudos e sempre fazem críticas muito severas e aborrecidas ao desempenho dos participantes, que saem tão arrasados e culpados como se tivessem cometido algum crime, tornando o programa pesado e tenso, no mau sentido. Talvez essa decepção dos jurados com relação aos participantes tenha a ver com a seleção: na versão americana, mesmo os piores cabeleireiros arrasam no visual. Aqui parece que todos só sabem fazer o mesmo tipo de cabelo. Não há ousadia. Não se sabe se a falta de criatividade vem do temor que os jurados causam. Só a apresentadora, Juliana Paes, é amistosa e transmite carisma e bom humor. Enfim, “Por um fio” é um bom programa, mas em relação ao original americano, ainda tem muito a caminhar.


Ø VILÃS COM TUDO NO “VIVA” ESSA SEMANA


Como já disse antes, o verdadeiro “Vale a pena ver de novo” está no canal Viva. E essa semana, especialmente, será um deleite, pois duas de nossas maiores vilãs vão estar com a corda toda. Enquanto em “Vale Tudo” a temida Odete Roitman (Beatriz Segall) está finalmente chegando e vai começar a aprontar das suas, à tarde em “Por amor”, a não menos terrível Branca Letícia de Barros Mota (Susana Vieira em estado de graça) vai acertar as contas com a dissimulada Isabel (a sempre ótima Cássia Kiss), com direito a luta corporal no solo e tesourada pra tudo o que é lado. E, claro, um texto fantástico e desempenho memorável das atrizes. Preparem seus gravadores e divirtam-se!

Ø AGUINALDO EM VERSÃO DIGITAL




E o intrépido Aguinaldo Silva não para de surpreender. Depois do sucesso do blogão e de ser presença constante em sites de relacionamento como Twitter e Facebook, o autor agora amplia seus domínios com um site: o “Aguinaldo Silva Digital”, um espaço super completo onde, além dos sempre inspirados textos do blog, também abriga entrevistas, enquetes, cenas de suas novelas e minisséries, dicas de livros, sites e links para outros blogs, dentre os quais, meu humilde melão está incluído. Estamos chiques, né? Enfim, mais um espaço para quem curte teledramaturgia, bom papo, diversão, cultura e o estilo único de Aguinaldo Silva. O melão deseja boa sorte, sucesso e vida longa para o “Aguinaldo Silva Digital”.

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Abraços a todos e até mais!!!

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Reprises, remakes e relançamentos: o passado reinventado.

                                                                                                                                                                   
E alguns motivos para não perder "Vale Tudo"

por Vitor Santos de Oliveira



Um fenômeno casa vez mais recorrente em nossa teledramaturgia atual é a reverência ao passado. E o fenômeno não se mostra isolado. Acontece de várias formas e em vários veículos diferentes, como por exemplo, a criação do Canal Viva que, inicialmente, tinha como público-alvo a crescente audiência feminina da classe C e cada vez mais vai se tornando acima de tudo um oásis para telamaníacos saudosos de grandes obras. Na mesma linha, o SBT tem vasculhado o baú da extinta Rede Manchete e resgatando pérolas como “Pantanal”, “Xica da Silva” e “Ana Raio e Zé Trovão”, que garantem sempre boa audiência para a emissora, senão as mais altas. Lembrando que, tanto as reprises do Viva quanto as do SBT, têm feito mais sucesso do que as reprises do tradicional “Vale a pena ver de novo”, constantemente criticado por exibir tramas muito recentes e  ainda assim, pouco memoráveis em muitos dos casos.

Mas as reprises são apenas um exemplo dessa espécie de “revival”. Os remakes também têm acontecido com frequência cada vez maior, com super destaque para “Ti Ti Ti” que, além de revitalizar a audiência do horário das sete, conseguiu uma proeza ainda mais difícil: ser sucesso de crítica e público, ser popular e sofisticada ao mesmo tempo e, principalmente, reverenciar o passado, mas sem deixar de ser uma obra extremamente contemporânea, cheia de frescor e atualidade.



E pra quem sempre achou que novela fosse um gênero descartável está aí o lançamento em DVD de “Roque Santeiro” para provar exatamente o oposto. Incrível que, 25 anos depois de sua exibição, personagens como Sinhozinho Malta, Viúva Porcina e Dona Pombinha, entre outros, ainda povoam o imaginário popular, tal qual os grandes personagens do cinema.

Para coroar essa onda “cult” nenhuma novela ou minissérie, no entanto, tem causado tanta repercussão como a reprise de “Vale Tudo”. Lançada com pompa e circunstância pelo Canal Viva, que investiu em publicidade digna de uma novela inédita, “Vale Tudo” consegue a proeza de ser mais comentada do que as novelas atuais. Para comprovar esse buxixo, basta entrar no “Twitter” às 0:45 diariamente para ver o frisson que a novela vem causando junto ao público. E as reações são as mais diversas e inusitadas: há o grupo daqueles que já assistiram à novela e se deleitam com cada lembrança revisitada e há o grupo dos novinhos que sempre ouviram muito falar de “Vale Tudo” e que agora estão entendendo o porquê da novela ser tão cultuada. Como representante do primeiro grupo e mesmo possuindo a novela gravada, confesso que nada se compara a assistir à novela pela tevê simultaneamente com milhões de outras pessoas, compartilhando opiniões e me divertindo com as reações. Uma frase do twitteiro @guisalviano traduz perfeitamente esse interessante momento em que vivemos, de junção do melhor do passado com os recursos disponíveis que temos atualmente: “Ver #valetudo é uma oportunidade de estar nos anos 80 com Twitter e chat coletivo. Impagável. Não tem preço”.

Do ponto de vista técnico e estético, a novela envelheceu, claro. O curioso é que isso não depõe contra a reprise. Pelo contrário, acaba sendo um dos seus grandes trunfos, já que é muito divertido constatar como o mundo era tão diferente há tão pouco tempo atrás: cabelos, roupas, gírias e comportamento em geral. Tirando esses fatores, a novela é assustadoramente atual: a temática da corrupção, a violência nas grandes cidades e o “vale tudo” propriamente dito continuam mais do que presente em nossa vida. E o que falar do texto? E o que falar do ritmo, da agilidade? Nesse sentido, “Vale Tudo” é mais moderna do que muita novela atual. Ganchos folhetinescos da melhor qualidade, grandes atuações e elementos do mais tradicional melodrama casam perfeitamente com a naturalidade impressionante de cada diálogo. O trabalho de direção, até hoje, é referência: ágil, objetivo e ao mesmo tempo detalhista, sabendo explorar o melhor de cada ator. Uma novela ousada que une o melhor da tradição, mas que apresenta aquele diferencial, aquele componente que a torna única e inesquecível.

Enfim, é inegável que há uma busca pelas boas coisas já produzidas no passado. Porém, acredito que a nostalgia pela nostalgia não faz muito sentido. Quem sabe a atual teledramaturgia pode buscar justamente no passado bons exemplos e boas inspirações para a tão necessária e constante reinvenção do gênero? Não basta apenas cultuar o que já passou, mas também buscar boas lições e reforçar as bases que possam proporcionar algo novo e surpreendente. Que venham outros remakes tão bons como “Ti Ti Ti” e que o Viva, SBT e Globo Marcas e outros canais e mídias possam nos brindar com o melhor e mais memorável que temos em nossa tão rica teledramaturgia.

A seguir, para quem ainda não conferiu a reprise de “Vale Tudo”, segue um empurrãozinho.


10 motivos que tornam a reprise de “Vale Tudo” imperdível

1)      ATUALIDADE DO TEMA:
Corrupção, relações familiares complicadas, alcoolismo, homossexualidade, crise ética e, sobretudo, solidariedade do povo brasileiro são ingredientes irresistíveis.

2)      A INUSITADA PARCERIA DE GILBERTO BRAGA E AGUINALDO SILVA:


 A saudosa Leonor Bassères, que completa o trio de autores, foi parceira constante de Gilberto Braga. Além dela, temos aqui uma improvável e feliz união de dois grandes mestres, cujas características são tão diferentes, mas que se complementaram perfeitamente. Perguntado pelo melão, qual foi a contribuição de Aguinaldo Silva para o folhetim, Gilberto Braga, humildemente, declarou: “Contribuição total. Ele fazia as escaletas, que são a alma da novela, em termos técnicos. E alguns personagens acabaram sendo mais dele do que meus, como a Raquel (Regina Duarte) e seu grupo. Aguinaldo é um autor mais popular do que eu, por isso, acho, Vale Tudo fez tanto sucesso”. Sem desmerecer um e sem contrariar o outro, penso que o sucesso reside exatamente na junção desses dois universos tão bem explorados pelos dois em cada uma de suas tramas: o requintado e o popular.

3)      REGISTRO DE UMA ÉPOCA:
Inovações tecnológicas estavam surgindo como o “disc-laser”, ter videocassete era um luxo, celular e internet não eram nem sonho e operador de telex era uma das profissões do momento. Além disso, você podia vender sanduíche natural na praia sem ser pego pelo choque de ordem e explorar menores sem se preocupar com o ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente. Chuquinha no cabelo, ombreiras e fumar em locais fechados era hábito de gente super transada. Aliás, a palavra “transada” vivia na boca de todos e era usada para finalidades diversas. Figurino e direção de época são um show à parte.

4)      GRANDES PERSONAGENS
Lógico que as vilãs Maria de Fátima e Odete Roitmann são sempre as mais lembradas. E com toda a razão. Mais do que meras vilas estereotipadas, cuja maldade é a única característica, eram, sobretudo, humanas, com fraquezas e sentimentos inerentes a cada um de nós. Que atire a primeira pedra quem nunca vibrou quando alguma armação de Fátima deu certo! Odete, por sua vez, sofria com o problema de alcoolismo da filha e, dentro de sua moral, fazia o que achava certo para o bem de sua família. Além delas, Ivan não era um herói chato e perfeito. Era ambicioso e chegou a colocar seu desejo de ascensão social na frente de seu amor por Raquel, que por sua vez, chegou a desejar vingança contra a filha. Toda essa vasta gama de características dos personagens, que fugiam muitas vezes da polaridade bom/mau, ajudou a criar junto ao público fortes elementos de identificação, até mesmo com as vilãs.

5)      GRANDES CENAS
São tantas e tão marcantes que é impossível enumerar todas, mas quem não se lembra do mambo caliente de Heleninha (Renata Sorrah), da banana de Marco Aurélio (Reginaldo Faria) para o Brasil ou do assassinato de Odete (Beatriz Segall) por Leila (Cassia Kiss)? Confesso que minha favorita é a cena em que Raquel (Regina Duarte), após ser humilhada por Odete, rasga o vestido de noiva de Fátima (Glória Pires) num ataque de fúria num dos muitos acertos de contas entre mãe e filha. A cena em que Fátima vê a mãe vendendo sanduíche na praia também é excelente e uma aula de subtexto pra qualquer roteirista. Outro momento catártico é quando Solange (Lidia Brondi) dá o tão esperado tabefe em Fátima, a jogando no chão. Ainda tem Fátima rolando as escadarias do Teatro Municipal, Afonso (Cassio Gabus Mendes) dando uma surra em César (Carlos Alberto Ricelli), que não transa violência, só pra citar algumas de uma interminável lista de cenas memoráveis.

6)   GRANDES ATUAÇÕES

Os gritos, caras, bocas e gestos da protagonista Raquel são sempre objetos de controvérsia por parte do público, mas convenhamos: se há alguém que pode ser chamada de “a alma da novela” esse alguém é Regina Duarte. Intensa, vigorosa, emotiva, amorosa, Regina nos oferece uma interpretação visceral, quase operística em alguns momentos, mas é impossível imaginar a Raquel sendo vivida por outra atriz. Ninguém possui tanto carisma e tanta identificação junto ao público quanto ela. A atuação de Beatriz Segall ficou tão marcante que a atriz até hoje não conseguiu se livrar do estigma de Odete Roitman. As frases deliciosamente polêmicas, tão bem criadas pelos autores, caíam como uma luva para a interpretação da atriz e garantiu que a vilã figurasse em qualquer lista das maiores de todos os tempos. Glória Pires também entrou para o rol das grandes atrizes, sabendo aproveitar com maestria a riqueza de possibilidades de sua Maria de Fátima. Nathalia Thimberg tinha tudo para ficar apagada como a frágil Celina, mas soube compor uma personagem doce, comovente e extremamente simpática, de grande empatia com o público. E o que dizer de Renata Sorrah (foto) e sua Heleninha? O nível de realismo das cenas dos grandes e homéricos porres da personagem é assustador e imbatível até hoje. O sofrimento era latente e a emoção, sempre à flor da pele. Era muito aflitivo ver tais cenas e sem uma atriz tão boa como Renata Sorrah, que se joga sem rede de proteção, o resultado não seria tão perfeito e irretocável. A galeria de grandes atuações não para por aqui. Todo o elenco esteve inspiradíssimo.

7)      TRILHA SONORA

Sobretudo a nacional. As canções combinavam perfeitamente com as tramas e personagens, com destaque para “Faz parte do meu show”, com Cazuza, tema de Solange e Afonso; Besame, com Jane Duboc, tema de Fátima, “Todo o sentimento”, de Chico Buarque com belíssima interpretação de Verônica Sabino era perfeita para Heleninha; “Tá combinado”, com Maria Bethânia, que envolvia o romance de Ivan e Raquel. O tema internacional dos dois, “Baby, can I hold You”, com Trace Chapman, também era ótimo. Mas três canções em especial se tornaram a cara da novela: “Brasil”, o tema de abertura interpretado com vigor por Gal Costa; “É”, crítica social contundente de Gonzaguinha” e “Isto aqui o que é”, com Caetano Veloso, que nos remete imediatamente ao universo da trama.



8)      DUPLA DINÂMICA
Lília Cabral e Rosane Gofman ficaram mais conhecidas como as deliciosas beatas Amorzinho e Cinira de “Tieta”. Mas o primeiro encontro das duas aqui como as secretárias e vizinhas Aldeíde e Consuelo nos dá a impressão de que as duas juntas poderiam render outros ótimos momentos em muitas outras tramas.

9)      AS FRASES DE EUGÊNIO
Possuir um mordomo é um luxo para poucos. Agora possuir um mordomo cinéfilo que sempre tem uma frase ou citação a algum grande clássico de Hollywood você só encontra em uma novela de Gilberto Braga. De Eve Harrington de “A malvada” a Scarlett O’Hara de “E o vento levou”, ninguém estava livre das referências de Eugênio, vivido deliciosamente por Sergio Mamberti.

10)   LÍDIA BRONDI

 Afastada da TV há quase 20 anos, ver o trabalho da atriz na novela é uma ótima oportunidade para quem apenas ouviu falar dela. Com tantas feras no elenco e com tantos personagens ricos e complexos, Lídia conseguiu transformar sua mocinha Solange Duprat em referência de moda na época e, graças ao seu talento e carisma, não ficou apagada na novela. Pelo contrário: Solange era cheia de personalidade. E o par romântico que formou aqui com Cássio Gabus Mendes esteve longe de ser sem graça. A gente acreditava e torcia de verdade por esse amor. Impossível sair do clichê: que falta faz Lídia Brondi às novelas! Linda e adorável sempre!

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Quem mais está acompanhando a novela? O chat está aberto e a palavra é de vocês!!!
                                                                                                                                                              

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