Sempre fui admirador do texto de Miguel Falabella, tanto em suas parcerias com Maria Carmem Barbosa, quanto em seus vôos solo. Falabella é, pra mim, o autor que mais se aproxima das cores de Almodóvar. Seus textos sempre exalam aquela exuberância kitsch presente nos filmes do cineasta espanhol e sempre possuem um olhar altamente irônico e sarcástico sobre os mais prosaicos dramas do cotidiano e também nas grandes tragédias, dando a elas um ar levemente divertido e patético. E seu humor nunca é fácil ou gratuito, ao contrário, provém de um olhar arguto e divertido sobre uma situação eminentemente dramática, que se torna divertida exatamente por esse viés patético que o olhar de Falabella sempre consegue captar.
Foi assim com “Salsa e Merengue”, novela que me fisgou desde o início e trouxe ao folhetim essa visão peculiar do autor e seus maravilhosos e coloridos personagens à beira de um ataque de nervos, inaugurando um novo estilo de se fazer novela. Tudo isso é pra chegar ao último capítulo de “Aquele Beijo”, um dos melhores finais de novela dos últimos tempos.
“Aquele Beijo” nunca foi um estouro de audiência, mas também esteve longe de fazer feio. Peço emprestada a expressão que Nilson Xavier usou pra falar da novela “Bambolê” para me referir a “Aquele beijo”: “uma novela honesta”. Talvez faltasse um escândalo central maior que fosse capaz de mobilizar o público. Ou, quem sabe, ganchos mais eletrizantes que tornassem o próximo capítulo imperdível, mas nada disso tira o mérito da novela, que cumpriu sua missão de entreter o público, se manteve coerente à sua proposta inicial e respeitou os princípios de um bom folhetim, sem menosprezar o espectador, sempre presenteado com um texto inteligente e criativo. A novela não fazia nossa adrenalina subir, mas era deliciosa de se acompanhar. Os personagens sempre tinham uma tirada espirituosa na ponta da língua e se envolviam em situações pra lá de hilariantes.
O elenco, em grande parte já familiarizado com o texto do autor, esteve, em sua maioria, muito à vontade, e parecia se divertir tanto quanto o espectador com as situações patéticas e rocambolescas de seus personagens. Giovana Antonelli brilhou na pele da cômica protagonista Claudia, lembrando aquelas divertidas comédias de Hollywood dos anos 60, ao lado de Ricardo Pereira, com quem teve bastante química e sintonia. Sheron Menezes, por muitas vezes, me deu a impressão de que era a verdadeira heroína da novela, pois a trama de sua personagem Sarita não tinha a mesma leveza da trama de Claudia e carregava grande parte do conteúdo dramático da novela e era, de fato, quem rivalizava com a antagonista vivida por Marília Pera, inclusive disputando o amor de um mesmo homem. Além disso, ela possuía o idealismo, digno das grandes heroínas românticas, em sua nobre missão de salvar o local onde nascera e fora criada. Definitivamente, Sarita tinha o peso de uma protagonista e Sheron soube conduzir muito bem a personagem. Outro grande mérito da novela foi valorizar atores negros, todos com ótimos e importantes personagens. Pode parecer bobagem, mas infelizmente ainda se conta nos dedos a quantidade de atores negros em nossos elencos.
Sheron Menezes e Marilia Pera: destaques positivos da novela |
E o último capítulo teve todos os ingredientes de uma boa novela, me fazendo até lembrar as comédias românticas que Cassiano Gabus Mendes escrevia para o horário das sete, como “Te contei?” ou “Marron-Glacê” que, se não arrasaram quarteirão como “Ti Ti Ti” ou “Que rei sou eu?”, deixaram uma impressão muito simpática. O desfecho dos personagens sendo revelado pelo próprio autor, através de sua narração, foi divertido e coerente. Aliás, a narração foi um dos grandes acertos da trama: inteligente, inspirada, nunca didática. Além de ajudar a contar a história de forma poética e envolvente, também imprimiu à novela uma personalidade própria, tornando-a inconfundível. Destaco dois pontos altos do último capítulo: a chegada de Claudia em seu casamento em uma viatura policial e a cena de despedida de Maruschka (Marília Pera) e Ana Girafa (Luiz Salém), que foi muito, mas muito emocionante. A emoção transbordante da cena fez o público lavar a alma e acreditar na sincera redenção da vilã vivida por Marília.
E a despedida foi simpaticíssima, alto astral, extremamente criativa e divertida. É disso que o público que acompanha novela gosta: se sentir recompensado e com a sensação de que foi prestigiado com o capricho de um trabalho feito especialmente pra ele. Ao Miguel, que ainda não conheço pessoalmente, mas que já faz parte de minha vida há muito tempo, meus sinceros parabéns e aquele beijo! Parabéns a toda a equipe. Missão cumprida e já esperamos pela próxima aventura.
13 comentários:
Aquele Beijo não foi aquele tipo de novela que "pegava" a gente, mas todos os capítulos que assistia eram deliciosos. Os personagens do Falabella são únicos, não tem como confundir com os de outros autores. Eles transitam do drama à comédia com a mesma verdade que nós, seres "de verdade", fazemos. A impressão que eu tinha é de que a novela era uma grande festa, talvez com um número menor de convidados, mas ainda assim, divertidíssima. A narração de Falabella servia como uma espécia de cumplicidade com o público e era deliciosa, um charme a mais. Amei o último capítulo. Tudo na medida certa. Cláudia chegando de carro de polícia na igreja foi hilário, assim como as situações que levaram a isso. Realmente a melhor cena foi a de Marília Pêra e Luis Salém. Marília soube emocionar.
Ótimo texto, Vitinho
Aquele Beijo não foi aquele tipo de novela que "pegava" a gente, mas todos os capítulos que assistia eram deliciosos. Os personagens do Falabella são únicos, não tem como confundir com os de outros autores. Eles transitam do drama à comédia com a mesma verdade que nós, seres "de verdade", fazemos. A impressão que eu tinha é de que a novela era uma grande festa, talvez com um número menor de convidados, mas ainda assim, divertidíssima. A narração de Falabella servia como uma espécia de cumplicidade com o público e era deliciosa, um charme a mais. Amei o último capítulo. Tudo na medida certa. Cláudia chegando de carro de polícia na igreja foi hilário, assim como as situações que levaram a isso. Realmente a melhor cena foi a de Marília Pêra e Luis Salém. Marília soube emocionar.
Ótimo texto, Vitinho
O texto foi ótimo! Mas pra mim, a novela não funcionou porque os protagonistas não desempenharam bem o seu papel, tirando a dupla romântica Giovana Antonelli/Ricardo Pereira, os outros protagonistas deixaram a desejar: Herson Capri, Sheron Menezes, Grazi Massafera e Pecoraro foram maus atores para papéis tão importantes.
O final foi totalmente além da minha expectativa. Achei deliciosa a sequência do sequestro, do acidente e da escapada dentro da patrulhinha atravessando o Centro do Rio numa bela tomada de helicóptero. Depois disso, quando temos um casamento tão bonito em novelas em plena Igreja da Candelária, com coral entoando música da Noviça Rebelde e chuva de pétalas? Isso só seria suficiente para comemorar as novelas que saem da mesmice SIM do Miguel Falabella.
Eu não curti a novela.
A audiência Vitor foi bemmmm abaixo da meta, 5 pontos a menos, reflexo de uma trama que não empolgava!
Porém, sim, o texto era ótimo.
Tiradas inteligentes.
Sou fã do Falabella, e essa é a única produção que não gostei em toda sua obra.
Desculpa amigo Vitor, mas desta vez vou ter que descordar... Aquele Beijo já está na lista das novelas que cairam no total esquecimento por total falta de atrativo que a faça ser lembrada. Quem entende de novelas sabe que essa já tá na lista das piores de todos os tempos ! Muuuito ruim em todos os sentidos: elenco caricato com interpretações trash demais, trama super desinteressante e trilha sonora sem nenhum sucesso. Enfim uma GRANDE BOMBA. Achei uma porcaria, ainda bem que teve poucos capitulos, pra não encher o saco! Abração !
Adorei o desfecho. O que foi Claudia chegando a igreja na viatura? Giovanna é maravilhosa, imprime luz a qualquer papel. Uma das melhores heroínas românticas já escritas. Bom caráter, mas com uma boa dose de humor para que não se tornasse mais uma mocinha manjada pelos espectadores. A sua busca incessante por alguém que a amasse, a assumisse e a perdoasse foi bastante crível e nos fez torcer por seu romance com Vicente. Gostei também do destaque dado ao Luiz Salém, ator incrível, que infelizmente teve poucas chances nas novelas. Mas o grande aplauso vai mesmo para Marília Pêra e sua Marushka, um poço de contradições. A redenção da personagem nas últimas semanas foi um espetáculo a parte. Aquele Beijo parte deixando saudade, ao menos em mim.
Sim Vitor, uma novela assim... honesta! Como tantas outras.
Palavras bonitas as suas, de quem parece ter se emocionado com o último capítulo.
Foi um último capítulo bonito, claro!
Mas ainda acho que a novela teve sérios problemas que nenhum autor gostaria de correr o risco de ter.
Falabella é sempre bom, é sempre "honesto".
Só achei que ele ligou no automático desta vez.
Na minha opinião, todas as anteriores, incluindo Negócio da China, foram melhores.
"Larguei mão" da novela várias vezes, impaciente com a falta de uma trama que a sustentasse. Só voltei a me interessar nas duas últimas semanas - muito boas por sinal.
Belo texto, Vitor!
Muito bom o seu texto, Vitor. Como venho dizendo desde que a novela acabou, "Aquele Beijo" assumiu dignamente (e cumpriu!) o compromisso de fazer rir. O Miguel tem uma característica muito bacana, que é a de se manter fiel àquele estilo tão dele. É inteligente, crítico e tem um humor pra lá de debochado. Acho que uma novela cumpre o seu papel quando mantém sua essência desde o primeiro capítulo. Deixemos que as tramas mais densas ocupem as outras faixas. Às 19h, a gente quer é rir, ainda que das nossas próprias mazelas. E daí que algumas pessoas não pegaram o espírito da coisa e não se divertiram com o texto tão cuidadosamente pensado para cada personagem? Azar o delas! Eu curti à beça. Pra encerrar, se número do ibope fosse sinônimo de qualidade, "Fina Estampa" seria um novelão.
Antes de qualquer coisa, mais um ótimo texto seu, Vitor! :)
Aquele Beijo não foi boa, mas também não foi ruim. É aquele tipo de novela que aparece só pra manter o horário... O Falabella tem um texto ótimo, mas não soube conduzir direito a trama. Teve momentos que parecia que ele tinha deixado de mão o desenrolar da história.
Foi uma "novela-abajur", você não fica "preso" a ela todo dia, mas sempre vai estar lá para você se enterter. Dos 155 capítulos que teve, eu tiraria apenas os 16 primeiros, o do sequestro da Lucena, o leilão da Comprare e os três finais... O resto foi muito morno.
Só vou sentir saudades mesmo é a Maruschka e da abertura com a Xuxa gemendo no auto-tune hehe.
Aquele Beijo tinha um texto muito bem escrito, mas faltou uma história contudente que o justificasse. A grande lembrança que terei de Aquele Beijo será da Marushka: Marília Pêra arrasou e protagonizou os melhores momentos da novela. Giovana Antonelli compreendeu o universo do Falabella e defendeu muito bem sua Cláudia, apesar do romance com o personagem de Ricardo Pereira não ter decolado e ainda ter que contracenar com o inexpressivo Victor Percoraro. Luis Salém também marcou com o ótimo travesti Ana Girafa, seu melhor papel em novelas, sem afetações forçadas e investindo bem no drama do filho abandonado na infância. Apesar de infinitamente superior à antecessora Morde e Assopra, Aquele Beijo entra para o rol de novelas genéricas pouco marcantes e rapidamente descartáveis.
Que delícia de comentário! Pareceu Rubens Ewald Filho esmerando um clássico de Kubrick - ou Almovar. Tô amando o blog... relendo as críticas antigas... É como se você falasse tudo o que tenho pensando aqui! Parabéns!!!!!!!!!!
Certamente, Miguel esteve afinadíssimo no texto.
Alguns núcleos sobraram um pouco como o da família das "gordinhas" e ver as cenas do Victor Pecoraro me faziam sentir que eu estava desperdiçando tempo e eletricidade, mas nem isto tirou da novela um charme e alegria que fizeram de AB uma novela muito agradável.
A cena do casamento da Claudia (Antonelli) foi maravilhosa demais.
Obrigado por compartilhar seus comentários Victos.
Remulo A.Gil
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