Ela, humildemente,
recusa o título de grande dama, mas poucas atrizes possuem uma carreira tão
rica, tanto no teatro quanto na televisão, veículo em que participou desde os
primórdios. Norma Blum ainda hoje é bastante lembrada por suas mocinhas das
novelas de época dos anos 70 como a Aurélia de “Senhora” ou a Malvina de “Escrava
Isaura”, papel que até hoje lhe rende reconhecimento popular. Mas já provou que
seu talento e versatilidade estão a serviço de qualquer personagem, como a
cultuadíssima vilã Frau Herta de “Ciranda de Pedra” ou a mãe sofredora Walkíria
de “Anos Rebeldes”. Nessa deliciosa entrevista, Norma faz um passeio por toda a
sua carreira, revela o desejo de viver uma vilã cômica e se mostra uma
noveleira de primeira, antenada com os mais recentes sucessos de nossa
teledramaturgia. Norma foi uma das atrizes biografadas no livro “As grandes
damas e o teatro brasileiro”, de Rogéria Gomes e, na companhia da autora, tem
viajado a muitas cidades para tardes e noites de autógrafo. Além disso, já
marcou sua volta às telas de cinema em 2013, gravando uma participação em um
filme esse ano. Com muito orgulho e muita alegria, melão estende o tapete
vermelho pra essa grande dama em todos os sentidos: Norma Blum.
Você faz parte da história da tv
participando praticamente desde o início ainda criança e também fez parte do
elenco da primeira novela diária da Rede Globo, “Ilusões Perdidas”
(1965). Além das enormes diferenças tecnológicas, que mudanças considera
significativas da televisão do início para a televisão de agora?
Norma Blum
- No início era tudo improvisado. Estavam todos aprendendo a fazer tevê ao
vivo. Não existia o videoteipe e a adrenalina estava sempre a mil. Parecia
teatro ao vivo transmitido pela tevê. Aconteciam erros, pequenos acidentes
imprevisíveis e, claro, a tevê era em preto e branco. Apesar das limitações
tecnológicas como estúdios, equipamentos, produção, grandes programas foram
gerados. No Rio de Janeiro foram doze anos de pioneirismo até a chegada da
tecnologia de gravação em fita. Hoje contamos com o HD, a alta definição da
imagem a cores e inúmeras mídias repetidoras, trucagens e malabarismos na
edição, além da possibilidade do registro para a memória já que tudo é gravado
e arquivado para as futuras gerações.
Norma em cena de "Senhora" (1975) ao lado de Claudio Marzo |
Mesmo atuando em muitas tramas
contemporâneas, suas personagens em novelas de época são muito marcantes. Tem
especial predileção por esse tipo de papel e que lembranças você tem das
antigas novelas das seis dos anos 70 como “Senhora” e “Vejo a lua no céu”?
Norma
Blum - Adoro fazer época, os
figurinos, os cenários e o tratamento cinematográfico da fotografia recriam
épocas diferentes, vide “Lado a Lado”, que nos remete ao início do século
passado e usa o recurso de transformar fotos antigas em cenário. E o que dizer
da deliciosa “Cordel Encantado” que misturou época com atualidade? Para os
atores, há o desafio no gestual e no emprego da linguagem como em Escrava
Isaura e principalmente em Senhora de José de Alencar, ambas adaptadas
genialmente por Gilberto Braga. Em “Senhora” todo o tratamento era na segunda
pessoa do singular e do plural. Um primor e um banho de cultura. Geralmente são
personagens densos e situações arquetípicas que favorecem a interpretação.
Uma das cenas mais marcantes e
comentadas em nossa teledramaturgia até hoje foi a da morte de sua personagem
Malvina em “Escrava Isaura” (1976). Como foi a repercussão na época? Até hoje
você é lembrada pela novela e por essa personagem?
Norma
Blum - Até hoje sou parada em
lugares públicos porque as pessoas se lembram de Malvina, Leôncio (Rubens de
Falco) e de Isaura (Lucélia Santos). Na época, havia uma bolsa de apostas entre
muitos espectadores que garantiam que Malvina e Tobias (Roberto Pirillo) teriam
escapado do incêndio e retornariam ao final da novela.
Rubens de Falco e Norma Blum em "A Escrava Isaura" (1976) |
A terrível governanta Frau Herta de
“Ciranda de Pedra” (1981), brilhantemente interpretada por você, entrou para a
galeria das vilãs memoráveis de nossa tv. Como foi viver essa personagem? Sente
vontade de interpretar outras vilãs?
Norma
Blum - Ao ser convidada por
Herval Rossano para essa novela, num primeiro momento rejeitei o personagem
emocionalmente. Minha família fugiu dos nazistas na Segunda Guerra. Senti que,
para a atriz, interpretar uma nazista fanática seria um grande desafio. Na
verdade o ator deve se apaixonar perdidamente por seu personagem. Então busquei
alguns resquícios de humanidade nessa vilã e ela acabou sendo votada como um
dos personagens favoritos da novela. Quando conseguimos imprimir muitos tons à
vilã ou à mocinha o personagem adquire uma dimensão muito maior porque supera o
maniqueísmo entre o Bem e o Mal. Adoro fazer vilãs. Gostaria novamente desse
desafio. Mas gostaria de representar uma vilã que inicialmente pareceria um
anjo de bondade para o espectador enquanto trama a destruição de outros. Isso é
um personagem rico a ser explorado. Quando, durante os dez primeiros anos da TV
Tupi, fazíamos pelo menos três tele-dramas por semana tive vários personagens
onde pude exercer essa fascinante dualidade. Ajudada pelo fato de ser muito
bonita na época e da carinha inocente. Em toda mocinha também consegui colocar
umas pitadas de diabinho. Achava as simplesmente “ingênuas” muito chatas. Então
vamos acrescentar mais uns tons à sua humanidade, certo? Foi um exercício
constante no aprendizado da atriz.
Você esteve no elenco da clássica
minissérie “Anos Rebeldes” no papel de Walkiria, mãe do militante João (Cassio
Gabus Mendes) e protagonizou cenas emocionantes quando ele foi perseguido pelos
militares. Você sofreu algum tipo de repressão durante os anos de chumbo? Usou
alguma experiência vivida nessa época para compor a personagem?
Norma
Blum - Com certeza, apesar de
Walkíria pertencer a uma família conservadora. Pessoalmente participei muito do
movimento contra a censura assim como inúmeros colegas e todos nós sofremos
repressão. Nos laboratórios para as gravações os atores veteranos puderam
compartilhar com os jovens atores do seriado a experiência que foi a luta
contra a ditadura. Foi muito enriquecedor e uma grande sacada do diretor Dennis
Carvalho.
Norma Blum e Denise del Vecchio em "Anos Rebeldes" (1992) |
Pergunta do leitor
Rodrigo Ferraz:
Você esteve no elenco das novelas “Floribella”, “Malhação” e atualmente está em
“Carrossel”. Como foi trabalhar com artistas jovens e crianças? E o que você
acha de obras feitas especialmente pra esse publico infanto-juvenil?
Norma
Blum - Sempre trabalhei com e
para crianças e adolescentes. Durante os primeiros dez anos de carreira pisei
nos palcos em inúmeros espetáculos infantis. Participei de programas infantis
na tevê e durante seis anos fui princesa e/ou mocinha do Teatrinho Trol,
dirigido por Fábio Sabag. Era transmitido nos domingos das 14 às 15 horas e a
praia do Rio de Janeiro esvaziava porque todos corriam para assistir. Depois
das 15h a praia voltava a encher. Foi considerado o primeiro fenômeno de massa associado
à televisão no Brasil, isso na década de cinquenta, devido ao enorme sucesso do
programa. Depois, em 1975, com direção de Geraldo Casé, inauguramos o horário
infantil das 17h na TV Globo com a minissérie “Pluft, o Fantasminha” em vinte
capítulos. Fiz a menina Maribel. O horário foi depois ocupado pelo “Sítio do
Pica Pau Amarelo”.
Recentemente você fez uma participação
no episódio “A culpada de BH” da série “As Brasileiras” interpretando uma
personagem cômica, mostrando uma faceta ainda pouco conhecida do grande
público. Você se sente à vontade fazendo comédia? Gostaria de fazer com mais
frequência?
Norma
Blum - Adoro comédia embora
me considerem mais uma atriz dramática em virtude dos papéis que fiz nas
novelas. Assim como uma vilã adoraria fazer papéis cômicos. Ah, porque não uma
vilã cômica? Esse foi o personagem que gravei recentemente em “Carrossel” numa
participação de seis capítulos. Divertido.
Norma Blum, ao centro, em recente participação em "As Brasileiras" (2012) |
Você acredita que a oferta de bons
papéis diminui para os veteranos e por quê?
Norma
Blum - Não. Basta ver Eva
Todor, Laura Cardoso, Juca de Oliveira e Luiz Gustavo na ativa além de muitos
outros. Os bons papéis por enquanto só andaram diminuindo para mim. Ah,
lástima! E eu que adoro tanto trabalhar!
Você é uma das atrizes biografadas no
livro “As Grandes Damas e um perfil do teatro brasileiro” de Rogéria Gomes e
vai viajar com a autora dando palestras por várias cidades. Como foi convidada
para o projeto e que tal ser considerada uma grande dama?
Norma
Blum - Nunca me considerei
uma dama de nada a não ser da paciência e da boa educação. Foi uma surpresa
quando recebi o convite para dar meu depoimento para Rogéria. Depois da
surpresa uma honra de estar reunida a colegas maravilhosas.
Você é noveleira? Quais as novelas e
personagens favoritos da Norma telespectadora?
Norma
Blum - Recentemente “Cordel
Encantado”, “Amor Eterno Amor” e o remake de “Tititi”. Cláudia Raia em “Tititi”
e Cláudia Abreu como Chayenne. Muito boa. Destaque para o Crô de “Fina Estampa”.
Hilário e impagável.
Tem algum projeto em cinema, teatro ou
televisão para 2013?
Norma
Blum - Meu projeto é
trabalhar muito em 2013. Este mês gravei minha participação no média-metragem “Entre
Dois Amores”, direção de Bruno Saglia. Adorei voltar ao cinema apesar de não
ser um longa. Adoro a linguagem cinematográfica e gostaria muito de voltar a
fazer mais cinema. E também aguardo ansiosa um convite para minissérie ou
novela.
____
Norma, querida,
muitíssimo obrigado por conceder essa entrevista. Saiba que é uma honra para
mim e uma grande alegria para os leitores do melão poder conhecer um pouco mais
a seu respeito e de sua brilhante carreira. Desejo ainda mais sucesso e que um
dia possamos trabalhar juntos. Beijo carinhoso!
Agradecimento: Marcelo Rissato
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4 comentários:
AMO Norma Blum!
Tive a oportunidade de almoçar com ela! [fotos em meu Facebook]
E, claro, tietei muito! :D
Assisti as belíssimas novelas Senhora e Ciranda de Pedra, em reprises, no início da década de 1980.
E Norma me surpreendeu no episódio de As Brasileiras fazendo um papel cômico. Ela sim, a braileira do título!
Ótima entrevista!
adorei a entrevista! vi o dvd de ESCRAVA ISAURA recentemente e a personagem Malvina era adorável!
Norma Blum é uma das pilastras que ajudaram a erguer a TV GLOBO. Trabalhos memoráveis que entraram para a história da teledramaturgia brasileira. Uma diva da nossa TV. Dividiu a cena com a Lucélia em três clássicos inesquecíveis: Escrava Isaura, Ciranda de Pedra e Sinhá Moça. Adoro !!!!
Abraços
Aladim Miguel
Arquivo Lucélia Santos / RJ
www.arquivoluceliasantos.com
Uma das melhores entrevistas que já li no Melão! Parabéns Norma Blum e Vitor!
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